Viver em liberdade

Persio Isaac

CRÔNICA - Persio Isaac

Data 05/06/2022
Horário 06:07

Na manhã de segunda-feira, nuvens cinzentas bloqueiam a luz do sol. Chego na empresa Thor e a chuva começa a cair. O som da britadeira e o barulho dos martelos anunciam uma nova fase nessa empresa de nome de um Deus da mitologia nórdica. As paredes vão caindo e o assoalho dará lugar ao cimento. Tudo vai se transformar, tudo vai se modificar, menos o espírito destemido de quem quer viver uma nova fase dessa empresa. Ela se tornará uma distribuidora de produtos alimentícios, é o objetivo de Alexandre, dono da empresa. 
Como o dia estava destinado a essa reforma, me sento numa cadeira e começo a escutar a música que marcou a minha geração, “The Year Of The Cat”. O escocês Al Stewart compôs essa bela música em 1975 e minha geração sonhou em mudar o mundo. Essa música atemporal me fez desligar da realidade e voei nas asas da minha louca imaginação. Imaginei sentado no banco de trás do Fusca 1978 do influencer Jesse Kozechen e seu amigo inseparável, o cachorro Shurastey. Coisa maluca essa minha imaginação.  
Queria sentir a liberdade deles de viver. Por alguns  instantes  parecia que estava vivendo uma eternidade de prazeres nunca sentidos. Andaram por esse mundo num Fusca sentindo sua própria pureza, sem amarras, sem prisões internas, sem dogmas, sem verdades absolutas, apenas correndo sobre as quatro rodas desse carrinho mágico, sentindo a adrenalina correndo nas suas veias, fazendo o coração bater mais forte que um surdo de marcação. 
O bagulho mais interessante que conheci não foram os países por onde andamos, foram as amizades que fizemos. As amizades são países maravilhosos com suas belezas repletas de carinho e solidariedade, disse Jesse. Shurastey concordava e latia como se fosse um gesto de felicidade e de agradecimento. Ouvi cada história que me deixaram com água na boca, afinal foram 17 países que esses dois malucos conheceram. Queriam chegar até o Canadá. 
Nesse instante, minha imaginação me trouxe de volta ao som da britadeira e dos martelos. Não sabemos usar a nossa liberdade. Jesse e Shurastey nos ensinaram que a vida não depende só de dinheiro, mas sim em ter coragem para viver o que cada um sonha, o que cada um deseja. A felicidade não mora nos palácios ou nas favelas, ela mora onde existe o amor. Jesse e Shurastey eram simples diante de Deus e foram felizes ao jeito deles. O mundo se viu neles, vibraram com suas aventuras e com seus espíritos livres. Hoje o mundo chora a precoce despedida desses dois amigos inseparáveis. Deveriam ganhar o Prêmio Nobel da liberdade de viver.  
Eles nos ensinaram o que é um verdadeiro ato de liberdade. Talvez a morte com inveja quis encontrá-los antes do tempo e levá-los para ela sentir um pouco dessa felicidade. A morte tem medo de quem sabe viver. A Mulher Maravilha tem um espírito de aventureira e quem sabe um dia eu saio num Fusca com ela e com nossa cachorra Amora para abraçar o mundo cantando Gonzaguinha:
“Viver e não ter vergonha de ser feliz
Cantar, e cantar, e cantar
A beleza de ser um eterno aprendiz
Ah, meu Deus!
Eu sei, eu sei
Que a vida devia ser bem melhor
E será!
Mas isso não impede
Que eu repita
É bonita, é bonita, é bonita...”.
A benção Jesse e Shurastey.

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