Um drible aqui, outro acolá

OPINIÃO - Gaudêncio Torquato

Data 02/12/2020
Horário 05:07

O Brasil chega ao final do processo eleitoral, com o tira-teima em 57 cidades, sendo 18 capitais e 39 municípios com mais de 200 mil eleitores, desfraldando a bandeira de uma “corrupçãozinha”. Como? Isso mesmo. No momento mais crítico da atualidade, 64 mil beneficiários do auxílio emergencial sacaram do bolso R$ 54,5 milhões para doarem a candidatos no 1º turno. E quem apurou esse desvio foi o próprio Tribunal Superior Eleitoral.
Só mesmo por aqui ocorre uma aberração dessas. Como o nome indica, o “auxílio emergencial” se destina aos mais carentes, desprovidos de renda, um adjutório para que milhões de pessoas consigam o mínimo para sua sobrevivência e, mais ainda, numa quadra de pandemia que assola o território. A não ser que os “doadores carentes” tenham driblado os mapas do governo e, como aves de rapina, voaram direto para cima da caça, no caso, o tal “auxílio emergencial”, que já custou ao governo este ano cerca de R$ 100 bilhões. Em suma, as mamas do Estado continuam a fornecer “leite” aos bezerrões da política.
Não por acaso, parcela ponderável do eleitorado vira as costas para a política, em um gesto que sinaliza desprezo, descrédito, indignação. Enquanto os horizontes da política não se tornarem claros, iremos empurrando as eleições com o rolo compressor do senso comum, que clama por reformas, mudanças, avanços.
Tais demandas provêm, sobretudo, das camadas mais esclarecidas, integrantes do painel da racionalidade, habitantes das grandes e médias cidades, cujo núcleo central é composto por profissionais liberais. Esses segmentos são os mais sensíveis ao fenômeno da “fadiga de material”, conceituado como saturação de perfis antigos, feudos familiares, domínios eleitorais, passagem do bastão entre figuras tradicionais. Há entre eles, vale reconhecer, pessoas de ótima índole e exemplar performance política. Mas a permanência por décadas na trajetória propicia a sensação de “material gasto”, pneu careca que não aguenta mais o tranco.
A sociedade, decepcionada com as promessas não cumpridas pela democracia – acesso à educação, segurança, saúde, transparência dos governos, combate ao poder invisível - procura refúgio em novos polos de poder.
2021, anterior ao pleito mais importante de nossa contemporaneidade, será bastante propício para avanços na reforma política, sob a suposição que, antes dela, sejam aprovados aspectos essenciais das reformas tributária e administrativa. A pressão social será intensa nos próximos tempos, exatamente pelos fatores antes mencionados, como a decepção com a política, a fadiga de material, a organicidade social e os novos polos de poder. Estamos cansados de ver Sisifu subindo a montanha com uma pedra sobre o ombro e vê-la resvalar ao sopé. O cara jamais conseguirá colocá-la no topo. 
No nosso caso, temos esperança que, um pouco adiante, consigamos fazer o necessário para elevar a grandeza do país. Até porque Deus é um pouquinho  brasileiro.

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