Sarah Roston, cantora, compositora e atriz

“O sucesso vem antes do trabalho, só no dicionário”

VARIEDADES - OSLAINE SILVA

Data 30/08/2020
Horário 05:24
 @dudaportella: Músicas de Sarah Roston começaram a entrar nas trilhas sonoras de séries do mundo inteiro
 @dudaportella: Músicas de Sarah Roston começaram a entrar nas trilhas sonoras de séries do mundo inteiro

Nascida em Presidente EpitácioSarah Roston, irmã do vencedor do “Ídolos 2009”, Saulo Roston, ganhou um presente em plena quarentena: as músicas de seu EP, lançado em março com a gravadora Inglesa Audio Network, começaram a entrar nas trilhas sonoras de séries do mundo inteiro. “Sou assim” está nessa última temporada, pelo canal FOX Espanha na série criminal “Vis a Vis: El Oasis”. “Eu incomodo” entrou no programa do produtor musical Benny Blanco, no YouTube. E também na série brasileira “Todxs Nós” do canal HBO.

Internautas expuseram a alegria em ouvir sua música em “Vis a Vis: El Oasis”: "Que hino, corri pro Shazan na mesma hora; "Fiquei doido quando ouvi essa música na série", "Fiquei encantada com a música brasileira na série"... Enfim, estes foram apenas três. Qual a sensação dessa repercussão para você  que é uma cria do oeste paulista?
Pouco antes de abril comecei a receber os feedbaks de onde as músicas estavam sendo trilhas. E antes da série chegar ao Brasil fiquei sabendo que estava na trilha. Foi incrível, porque eu já tinha ouvido falar da série, mas não conhecia. E quando chegou ao Brasil, foi uma explosão! Foi magia total porque virei a mais procurada no Shazan, no país. E em 4º lugar no mundo. Recebi mensagens incríveis de pessoas em meu Instagram, no YouTube, inbox. Eu só chorava. Ainda é muito mágico, mas ao mesmo tempo contempla um momento muito especial de a gente abrir o olhar para construir esse sonho grande, desmistificar um pouco um olhar que acaba sendo limitador relacionado à arte brasileira. Quando você entende a potência que a gente tem e que não é verdade a ideia de que a arte brasileira, internacionalmente é menos potente do que em outros países. Uma coisa é ver números, quando os vemos em pessoas, e eu tenho em média 6 K plays por dia na minha música... tem sido lindo!

Como é ver as músicas de seu EP entrando nas trilhas sonoras de séries do mundo inteiro?
A primeira notícia que tive do álbum entrando em trilhas foi de um produtor musical gigantesco chamado Benny Blanco que já produziu Jay-Z, Beyoncé, Ariana Grande, tem uma série no Youtube não só de música, mas de curiosidades em geral, da vida. Ele é todo artista, transgressor e a minha música abrindo a série dele, então isso foi demais porque ele ouviu e aprovou minha música. Logo depois veio o “Vis a Vis”, no episódio do documentário francês no Brasil "Skate Le Monde", em "Todxs Nós" série de TV brasileira da HBO, que é passada no mundo inteiro. Além de outras coisas, como a revista Vogue inglesa também usou minha música na série de vídeos deles nas redes sociais com uma coreógrafa incrível, “This Is America”.

Como foi esse lançamento em meio a essa pandemia?
Fizemos o EP com muito cuidado, construção, ao pensar em assinar com uma gravadora inglesa qual estávamos em negociação há dois anos. Tínhamos marcado para lançar uma semana antes, eu ia pra Londres e tal, mas acabou tendo a reformulação de todos os planos, por cair bem no comecinho da pandemia. Mas, mesmo com essa loucura, ganhei muitos presentes! A premier do lançamento foi apresentada pela BBC Radio 6 Music, de Londres, na The Clash, de Londrina. E foi um processo lindo mesmo a gente não estando presencialmente trabalhando o álbum nos lugares, a música estar tocando no mundo inteiro.

Sua voz é literalmente música para os ouvidos [risos]. Como é isso?
Que delícia!!! Esse é o intuito, a gente falar da vida de várias formas e mexer o esqueleto [risos]. Chegando a São Paulo trilhando esse caminho de terminar um trabalho levando a outro, eu tive a felicidade de encontrar em minha vida o maestro Ed Côrtes, que dentre vários filmes renomados do Brasil um dos autores da trilha de “Cidade de Deus”. Ele virou um grande amigo de vida mesmo, sabe? Começamos a trilhar um lugar de gravar. E a criar os quatro universos, o desejo de transitar pela minha música, esse lugar girl power, essa potência da mulherada que tá na sua sim, mas também a face totalmente frágil, entregue, amando que está em “Porquê?”, a “Mel” que foi composta em inglês (“Honey”) que é simplesmente a vontade de grovar por grovar, dançar por dançar e ser feliz. E também “Eu Incomodo” (“I Bother”), eu queria fazer um funk sobre funk, sabe como tem um samba sobre samba? Queria falar das potências que estão guardadas no interior do país, tanto periféricos de São Paulo como do Brasil inteiro. E que a gente tem que saber olhar a generosidade do que aquilo carrega. Óbvio que com toda a complexidade que tem, a potência que é.

Onde mora atualmente? Quando saiu de Presidente Epitácio?
Morei fora do país também. Mas há oito anos estou em São Paulo. Sempre que dá vou para minha querida Epitácio! Até porque tenho boa parte da família lá, e boa parte da região como tios, primos e amigos em Presidente Prudente, Presidente Bernardes, Emilianópolis. Mas aqui em São Paulo, como muito dos eixos de trabalho, eu preciso estar presente, então é difícil conseguir se deslocar sempre. Mas o oeste paulista é uma região que tenho muito carinho, pois foi onde passei aquela fase do florescer a vida. Da pré-adolescente para a moça (16, 17 anos).

Algumas pessoas têm o hábito de achar que a vida de um artista é fácil. O que você diz disso?
Acho que esse é o maior desafio no Brasil e para o brasileiro. Tem um processo que a gente nem sabe onde começou essa raiz de que ainda que tão pulsante, fervilhante, em ebulição, a valoração da arte é muito baixa na cultura em geral. Não há uma esquina em que a gente não veja a cultura do Brasil tanto musicalmente quanto nas festas populares, mas há um inconsciente comum de pouca valoração artística do trabalho. E a maioria dos artistas do Brasil trabalha uma vida inteira, estudam para aprimorar uma arte. Tenho amigos do balé que dançam oito horas por dia e depois precisam entrar num balde de gelo para aguentar tudo de novo no dia seguinte.  Claro que isso ocorre em outras frentes, mas quando você toma as rédeas e vai ser artista no Brasil se depara com um mercado muito nebuloso. É difícil enxergar os possíveis caminhos que você tem de estruturação, estabilidade, entender o mercado. É pegar o touro na unha mesmo, sabe? Esse processo é bem importante, acho que aos poucos o brasileiro está começando a ter essa reeducação do olhar. Temos que ter coragem de mostrar o valor que o Brasil tem. Tenho um amigo baixista que mora na Suécia que me disse certa vez que se ele faz um documento para o Estado comprovando o quão importante é vir para o Brasil para cultura da Suécia, eles pagam tudo. Porque é importante para o país.

Que conselho você daria a jovens que sonham com a vida artística, o futebol profissional, ou qualquer outra profissão que tenha que sair para fora de sua zona de conforto?
Fico muito feliz em responder essa pergunta porque eu fui uma jovem artista do interior. O que eu posso dizer é que sonhe, mire muito alto. Tenham noção da responsabilidade da escolha de vocês.  Estudem muito o mercado aqui e lá fora. Proponham caminhos onde possam ter os mercados tanto da dança, como música, teatro e trabalhem muito pra isso. É importante sim sair um pouco do eixo do interior porque em São Paulo, por exemplo, tudo gira muito mais forte e rápido. Mas pode fazer uma ponte também. Vir para a capital ficar um pouco e voltar para plantar e florescer um eixo de cultura no oeste paulista, ou em todo o Brasil. É construção. O sucesso vem antes do trabalho só no dicionário. A gente tem que construir e isso é um olhar de maturidade para a profissão. É importante todo mundo sonhar, mas nessa consciência. Mas nunca deixem de sonhar. Parece clichê dizer isso, mas pra eu estar hoje na “Vis a Vis”, ter a minha música tocada na BBC, eu sonhei e planejei.

Se vive um tempo muito difícil com essa pandemia. Como tem sido pra você, família, amigos...
Em São Paulo é uma diferença brutal. Eu trabalhava muito fora de casa, tipo ia gravar numa produtora, em outra, ensaiar em outro lugar e só voltava pra casa de noite. E aí, de repente, não tem mais isso, não vê mais as pessoas... Estabelecemos uma pessoa que mais saia, no caso minha mãe que é ginecologista/obstetra, para fazer as compras. E eu e meu irmão Saulo limpávamos toda a compra, cozinhávamos e fazíamos os demais afazeres. Eu saí umas quatro vezes apenas. Teve um dia que falei pro meu irmão que eu precisava ir até a padaria pra ver alguém, bater um papo corriqueiro. Eu moro perto da Paulista e ver como diminuiu o fluxo nos primeiros meses foi assim assustador. O que me ajudou foi toda a repercussão do disco, conseguir fazer os trabalhos em casa, criar uma rotina legal de bem estar, comer melhor, descer no térreo do prédio para fazer exercícios do jeito que dava. Acho que assim como pra todo mundo a arte foi um suspiro, acompanhar a live de um, de outro.

Como você vê o momento para aqueles que vivem, literalmente, da música, que tocam nos barzinhos, em festas, na rua...
Acho que, embora a pandemia não tenha trazido nada de bom,.pra mim o confinamento foi bem importante. Quando não tem pra onde ir a gente vai pra dentro. E observando de maneira comunitária o olhar para dentro e valorar o que a gente tem está sendo impulsionado. Quão importante é ir naquele barzinho que adora e ouvir aquele pagode que ama. Quão importante é aquele cantor sertanejo que ninguém perde os shows. Quão importante é aquela comédia, espetáculo tal que você vai assistir. Quão importante é ir às aulas de dança. Acho um exercício muito bom e bonito porque internacionalmente eles são assim com os trabalhos próprios e com brasileiros também. Então cuidar dos nossos íntimos, mas também da nossa comunidade, de onde vamos sempre. A indústria artística parou total e seremos os últimos a voltar. Então esse olhar da comunidade local para os artistas que tem é muito importante porque são pessoas que se dedicam às nossas alegrias. Temos que ter a generosidade de valorar isso. 

Fale um pouquinho do seu irmão.
Ah, é lindo falar do meu irmão! Eu o admiro muito e tenho a felicidade de ser irmã dele. O Saulo tem um papel primordial na minha trajetória, porque ele veio primeiro ao mundo. Ele fez os caminhos primeiro. Ter acompanhado a lindeza que foi vê-lo ganhar o “Ídolos 2009” e o quanto isso abriu caminhos para ele, foi maravilhoso! Além de ser um grande músico, de compor, de produzir com uma facilidade tremenda temos uma ligação de irmandade, de timbrado, de escolha musical muito especial. E de um ano pra cá temos encontrado cada vez mais intimidade com esse lugar sonoro quando começamos a ser convidados para reuniões de compositores para escrever para o disco de seis artistas do POP da Sony Music, que gravarão músicas nossas. A gente fez umas 40 músicas! E nesse processo de compor muito junto vamos lançar uns três EP’s. Um deles está sendo feito em quarentena bem nesse lugar de isolamento. Grandes músicos amigos nossos, cada um gravando de suas casas. Vai ser um EP muito bonito que a gente pretende assinar também com a galera de fora e seguir com essa parceria com a Audio e com esses olhares internacionais. Ah e essa música que está no “Vis a Vis” ele está comigo, eu faço os versos e o refrão e ele o rap da música!

Corre na veia da família essa coisa mágica chamada música?
Sim [risos]. Toda nossa família é de artistas. Pra se ter uma ideia, minha avó materna, por exemplo, teve 19 irmãos e quando meu bisavô veio de Minas Gerais para a região de Prudente, ele contratou um professor de música para dar aula para os filhos. Então além da minha avó que cantou a vida todinha com a irmã gêmea, todos os outros irmãos tocaram algum instrumento na vida. Sempre existiu muito essa cultura da arte viva em nossa família, tanto materna quanto paterna. Tenho muitos tios, primos que pintam, tocam, são do mundo da moda, enfim...

SAIBA MAIS
Cantora, compositora e atriz formada pela Escola Superior de Artes Célia Helena fez shows para Chili Beans Fashion Cruise/2015, foi uma das cantoras da primeira temporada do programa "Na Voz Delas" no canal Bis, fez parte da temporada de shows "Spring Sessions" no Terraço Itália 2015 e 2018. Cantou em campanhas publicitárias para Elo, Netflix, Citroen, Canal Sony. Em 2018 realizou show autoral no Festival Path. Deu voz ao "Notas Contemporaneas" (programa de tributos e entrevistas do MIS (Museu da Imagem e do Som), para Peninha, Toquinho, LuisCaldas, Alaíde Costa, Fernanda Abreu, Zeca Baleiro. Em abril do ano passado compôs e lançou disco com a Orquestra Aquara. E junto a exposição "Björk Digital" no Museu da Imagem e do Som, realizou show especial Björk.

 

 

 

 

 

Publicidade

Veja também