Neste trabalho quero apresentar ao amável leitor dois pequenos textos desse cidadão que foi um dos maiores escritores do nosso tempo e, por isso, tinha uma cadeira na ABL (Academia Brasileira de Letras). Essa pessoa, grande amigo, chama-se Calos Heitor Cony. Tais trabalhos constam na Folha de São Paulo, embora em épocas diferentes. Claro, também, que apenas posso citar alguns trechos em face do espaço que tenho. Durante os oito anos do governo Fenando Henrique Cardoso, acredito que o tenha criticado duas ou três vezes por semana. O tempo passou, FHC passou, eu também passei. Candidato a uma vaga na ABL, tive o prazer de votar nele e dele tive o prazer de ouvir o melhor discurso sobre Joaquim Nabuco, que elogiei fartamente. Mas não votaria nele nem para síndico do meu prédio, entretanto, reconheço nele um dos melhores presidentes que o Brasil já teve.
Na última semana, embora de uma família de militares, FHC elogiou o silencio das tropas que cumpriram um dispositivo tradicional de se considerarem o grande mundo da vida nacional. Não poupou o judiciário, que ocupou o papel de juiz e verdugo dos corruptos que infestam a atual fase da República. Ele diz que não há um nome de general dando palpites sobre a Operação Lava Jato, função assumida pelo Judiciário, que nem sempre chega a soluções corretas, concedendo habeas corpus, prisões domiciliares e penas absurdas que equivalem a centenas de mortes. Predomina entre as Forças Armadas uma cautela para impedir os crimes e desmandos do último regime militar. Este é um ponto favorável para FHC e lição que não deve ser esquecida pelos crimes da ditadura de 1964.
Vamos ao segundo texto de Carlos Heitor Cony, com o título Ricos e Pobres. Ele inicia seu trabalho dizendo: “Cito de memória: Para os ricos só existe um caminho para a conservação de sua fortuna é apoderar-se do Estado”. Esta frase é de Lorenzo de Médici, exemplo de citação obrigatória do grande príncipe renascentista e não era um político. Sua cabeça e, sobretudo o seu coração, estavam orientados para as artes, e daí seu nome ser sinônimo de mecenas. Mas as complicações da cidade Estado, somado às rivalidades das grandes famílias, obrigaram Lorenzo a aceitar o poder aos 20 anos.
Para os ricos é impossível evitar o poder, uma vez que é o poder que garante a própria riqueza, e é assim até hoje. Na recente campanha sucessória percebeu-se a vigilância do poder econômico sobre o poder político. Antigamente, as coisas eram mais veladas e ricos e poderosos procuravam disfarçar a influência que exerciam sobre o processo eleitoral. Hoje as coisas são visíveis e ocorrem a céu aberto. Pode-se perceber que o Estado é um instrumento que sempre estará a serviço dos já poderosos e para derrubar essa situação.
De tempos em tempos são feitas as revoluções e vitoriosos criam nova classe de poderosos. Por essas e por outras, o anarquismo pretende acabar com o Estado, mas até hoje não se criou o equivalente que funcione, e o jeito é tudo ficar como está. Aos ricos as batatas e aos pobres restará o consolo de servir ao Estado dos ricos e receber o Bolsa Família como prêmio por bom comportamento. Agora vamos ver o que diz o senhor Cony em relação ao presidente FHC, que não fez tudo que constava no seu programa e tenho como exemplo o saneamento básico. Sabemos que no Brasil ainda há milhões de pessoas que vivem hoje como se fosse meados do século passado, como os ribeirinhos que habitam na floresta amazônica.