Qualquer ato libidinoso pode ser indiciado como caso de estupro. E, desde setembro 2016, a SSP (Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo) tem segmentado as situações acometidas contra vulneráveis. De lá para cá, até setembro deste ano, 482 ocorrências foram registradas na 10ª RA (Região Administrativa) do Estado, o que significa que, em média, por mês, o crime foi delatado cerca de 20 vezes. Ainda de acordo com a pasta, os cenários em que envolvem esse público mais frágil são diversos.
Conforme a delegada seccional da Polícia Civil de Presidente Prudente, Ieda Maria Cavalli de Aguiar Filgueiras, o número alto de incidências simboliza a evolução em tratar os casos que, como dito, hoje são especificados por qualquer ato libidinoso, e não apenas a conjunção carnal, o ato consumado. “Hoje, estupro de vulnerável significa qualquer passada de mão. Se você encostar em uma criança, ou realizar um ato libidinoso, isso será tratado desta forma”, complementa.
O que reflete, ainda de acordo com Ieda, num lado positivo, que é o da informação. Segundo ela, houve e há cada vez mais uma divulgação maciça dos direitos das pessoas, que faz com que elas tenham mais coragem de divulgar e pedir ajuda em uma situação que esteja enfrentando. “Mas esse tipo de ocorrência, na maioria dos casos, chega depois que o fato ocorreu, trazido por um terceiro”, informa.
O que cabe uma atenção maior é interpretar a ocorrência denunciada. Porque, de acordo com a delegada, o fato de caracterizar qualquer ato libidinoso como estupro de vulnerável também significa que a investigação deva ser ainda mais minuciosa. “A ocorrência, no primeiro momento em que ocorrer, será registrada de tal forma. Mas cabe, daí em diante, à polícia, entender o que de fato ocorreu. Existem casos que, logo de início, já se verifica que não houve estupro. O cuidado é maior”, pontua Ieda.
O que representa um processo de investigação minucioso. Nos casos em que não há prisão, o prazo é de 30 dias, que pode ser estendido, uma vez necessário. E nas situações em flagrante, o tempo diminui para 10 dias, pelo fato do autor já estar preso, especifica a delegada.
Prisão em flagrante
No artigo 217-A do Código Penal, estupro de vulnerável é um delito caracterizado pela conjunção carnal ou a prática de ato libidinoso com menor de 14 anos, com alguém enfermo ou deficiente mental, que não tenha o necessário discernimento para a prática do ato sexual, bem como alguém que não possa oferecer resistência. E em um caso mais recente, como acompanhado por esse periódico, uma menina de oito anos foi vítima da situação na madruga de segunda-feira, em Santo Anastácio.
Na ocasião, um homem de 30 anos, padrasto da vítima, foi pego em flagrante no quarto da criança, após ser denunciado pelo irmão da vulnerável, conforme informações da Polícia Civil. O indiciado foi removido à carceragem local, passou por audiência de custódia e, posteriormente, foi encaminhado à Penitenciária de Andradina (SP).
Por sua vez, a vítima foi encaminhada à santa casa da cidade, onde foi interrogada pelo policiamento. Conforme o registro, ela alegou que sofria a violência desde janeiro, “sempre no período noturno”, e nas datas em que a mãe se ausentava para trabalhar. A criança confirmou ato sexual com penetração. No mesmo dia, ela também foi direcionada ao IML (Instituto Médico Legal) de Presidente Venceslau, para realizar exame sexológico.
Ludoterapia
No ato consumado, além dos reflexos físicos, quem sofreu a violência também está passível de um trauma psicológico. Nesses casos a psicóloga Renata de Luca entende que não tem outro jeito a não ser o “tratamento psicoterápico”. Entretanto, a primeira atitude a ser articulada é garantir a segurança do vulnerável.
O tratamento mais indicado é a ludoterapia, que se vale de jogos e divertimentos, até mesmo de competições esportivas, para aliviar angústias dos pacientes. “Já ficou comprovado que o efeito que a imagem e a fala têm para o adulto, os jogos têm para as crianças. Desta forma, é possível observar o que ela entendeu daquilo, como ela tenta lidar com isso e aos poucos vai aceitando ajuda”, explica. Para a psicóloga, o lado bom é que a criança tem um processo de recuperação mais rápido.
Mas, antes disso tudo ocorrer, a especialista destaca que o ambiente familiar deve estar todo simbolizado como um local de confiança, porque, “na maioria dos casos, o crime ocorre dentro do grupo familiar, o que promove um medo pós-ocorrido, abrindo espaço para uma dificuldade de conseguir falar sobre a situação”. “A criança não fala por sentir uma dificuldade de compreensão”, pontua.