O IPÊ (Instituto de Pesquisas Ecológicas) atingiu o marco de 8 milhões de mudas nativas da Mata Atlântica plantadas no Pontal do Paranapanema. A área de plantio abrange, aproximadamente, 4,2 mil hectares, o equivalente a 4 mil campos de futebol. As árvores estão distribuídas em 17 propriedades privadas, nos municípios de Anhumas, Euclides da Cunha Paulista, Marabá Paulista, Mirante do Paranapanema, Presidente Epitácio, Rosana e Teodoro Sampaio.’
O plantio é resultado do projeto Corredores de Vida, implementado pelo IPÊ inicialmente em sete municípios, com base no Mapa dos Sonhos, criado há quase 25 anos, que traça conexões entre APPs (áreas de preservação permanente) e RLs (reservas legais) de propriedades rurais às duas UCs (unidades de conservação) da região: o Parque Estadual Morro de Diabo e a Estação Ecológica Mico-Leão-Preto, entre outros fragmentos.
Do total de 8 milhões de mudas, cerca de 2,4 milhões foram plantadas em um trecho de 12 quilômetros, na fazenda Rosanela, situada ao sul do Morro do Diabo. O plantio foi realizado ao longo de mais de duas décadas e é considerado o maior corredor restaurado do bioma Mata Atlântica. A restauração florestal é executada de maneira integrada com participação social, geração de renda para a comunidade e benefícios para a biodiversidade e clima.
Foto: Carlos Aidar - Árvores estão distribuídas em 17 propriedades privadas de cidades da região
O projeto Corredores de Vida é baseado no tripé CCB (Clima, Comunidade, Biodiversidade). No quesito Clima, as árvores plantadas neutralizam carbono e gases equivalentes, como o metano. Na esfera da Comunidade, traz geração de emprego e renda. Com base em dados coletados em julho de 2024, o projeto emprega diretamente 229 pessoas (56 jovens), divididas em três frentes: equipe técnica do IPÊ, viveiros comunitários e empresas florestais.
Já o aspecto Biodiversidade é estratégico para a conservação da fauna e da flora da Mata Atlântica. As mudas nativas empregadas no projeto são produzidas em 13 viveiros comunitários, com coleta de sementes em diferentes árvores matrizes distribuídas pela região, proporcionando um plantio com maior variabilidade genética.
“O projeto Corredores de Vida tem ganhos significativos tanto para o Clima como para Biodiversidade, no Pontal. Porém, envolver a Comunidade ao incentivar o empreendedorismo, por meio da criação de empresas que realizam os plantios e a manutenção dessas áreas, além de viveiros, é o ponto alto do projeto. Hoje, 15 empresas florestais e 13 viveiros comunitários prestam serviço para a cadeia da restauração florestal implementada pelo IPÊ”, afirma Laury Cullen Jr., coordenador de projetos do IPÊ.
A restauração florestal é compromisso dos países que fazem parte da CDB (Convenção da Diversidade Biológica). Dentro das 23 metas globais do Marco Global de Biodiversidade de Kunning-Montreal, a regeneração e restauração de ecossistemas são primordiais. Uma das metas, por exemplo, estabelece que todos os 196 países signatários devem fazer um esforço de assegurar que, até 2030, pelo menos 30% das áreas de ecossistemas terrestres degradados, águas interiores, costeiras e marinhas estejam sob restauração eficaz, a fim de promover a biodiversidade, as funções e serviços ecossistêmicos, a integridade ecológica e a conectividade. O IPÊ coopera com mais de 70% das metas globais de biodiversidade e está presente na COP16 da Biodiversidade (até 1º de novembro, em Cali, Colômbia), tratando sobre este e outros temas.
A restauração e preservação de áreas florestais são essenciais também para que dê certo o Acordo de Paris sobre Mudanças Climáticas, que estabelece metas para conter o aquecimento global em 1,5 ºC ou, no máximo, 2 ºC em relação aos níveis pré-industriais. Esse é um dos principais temas da COP29 do Clima, que acontece este ano em Baku, no Azerbaijão.
Para conter os efeitos críticos do aumento da temperatura no mundo, a ONU (Organização das Nações Unidas) aponta a necessidade de restauração de 1 bilhão de hectares de florestas no mundo e 12 milhões de hectares de florestas só no Brasil. Recentemente, entretanto, o Observatório do Clima lançou uma proposta mais atualizada para o Brasil cumprir com a redução das suas emissões, a restauração de 21 milhões de hectares de cobertura vegetal em seu território.
Foto: Ana Lilian Pereira - Plantio faz parte do projeto Corredores de Vida, desenvolvido pelo IPÊ
Os corredores florestais do IPÊ foram elaborados com base em pesquisas científicas para conservar o mico-leão-preto (Leontopithecus chrysopygus), espécie endêmica do Estado de São Paulo que corre risco de extinção. O intenso desmatamento na região, em especial a partir dos anos 50 e 60, fez com que os animais ficassem isolados em pequenas “ilhas verdes” (fragmentos florestais) e sem espaço para locomoção, alimentação e reprodução, o que significava um risco à sua sobrevivência.
Com o objetivo de restaurar o hábitat dos micos e fazer com que eles pudessem ampliar sua área de uso e circulação, o IPÊ criou o Mapa dos Sonhos, com a proposta de implantar corredores florestais em áreas de reserva legal de propriedades rurais, em parceria com os fazendeiros e produtores. O mapa passou a indicar os melhores locais para a restauração, de forma a beneficiar a biodiversidade, formando corredores que pudessem se ligar aos grandes fragmentos florestais, o Morro do Diabo e a Estação Ecológica Mico-Leão-Preto.
A implementação do mapa garante então que os micos e outras espécies possam ter mais área de floresta para viver, além de caminhos mais seguros para transitar de um fragmento florestal a outro, e também beneficia os proprietários rurais que precisam se adequar ao Código Florestal, que determina que 20% da área seja destinada à reserva legal.
Além do corredor da Fazenda Rosanela que conecta as duas unidades de conservação da região, o IPÊ integrou novas áreas ao projeto Corredores de Vida. Uma delas, foi a fazenda Estrela, que hoje tem 507 hectares restaurados com o plantio de mais de 1 milhão de mudas. Este corredor está localizado na face norte do Morro do Diabo e tem conexão com a Estação Ecológica Mico-Leão-Preto, unidade Água Sumida, em Teodoro Sampaio, e com a reserva legal da Fazenda San Maria, em Presidente Epitácio, onde há presença de grupos de mico-leão-preto.
Estes plantios com conexões nas faces norte e sul do Morro do Diabo ampliaram a visibilidade do projeto. Na sequência, outros proprietários rurais interessados na adequação às leis ambientais do Estado de São Paulo abriram as porteiras de suas fazendas para a restauração florestal, entre elas, a São Paulo, Maravilha e Categeró. Totalizando, aproximadamente, 1 milhão de mudas plantadas.
Os resultados são monitorados com uso de cameras trap e gravadores instalados nos Corredores de Vida e nas unidades de conservação. Apenas na última campanha, foram mais de 10 mil registros fotográficos e mais de 100 mil minutos de gravação de áudio. Uma nova campanha está em andamento.
Nas áreas restauradas, os pesquisadores já identificaram 22 espécies de mamíferos de médio e grande porte, como onça-parda (Puma concolor), gato-mourisco (Herpailurus yagouaroundi), gato-do-mato-pequeno (Leopardus guttulus), assim como espécies consideradas vulneráveis segundo a IUCN (União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais), como anta-brasileira (Tapirus terrestris), lobo-guará (Chrysocyon brachyurus) e o tamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla), além de 136 espécies de aves, incluindo udu-de-coroa-azul (Momotus momota) e inhambu-chororó (Crypturellus parvirostris).
Somando as áreas restauradas e unidades de conservação, o grupo de pesquisadores identificou 174 espécies de aves e 29 espécies de mamíferos, incluindo cinco ameaçadas de extinção, como o mico-leão-preto, o gato-mourisco, a anta-brasileira, o lobo-guará e o tamanduá-bandeira. Até o momento, entre as espécies ameaçadas, somente o mico-leão-preto foi registrado apenas nas unidades de conservação.
Foto: IPÊ - Anta-brasileira é uma das espécies beneficiadas pelo projeto
Foto: IPÊ - Iniciativa garante que espécies como tamanduá-bandeira tenham mais área de floresta para viver
Em 2021, a experiência em estabelecer corredores florestais garantiu ao IPÊ ampliar o mapa de restauração para outros municípios do oeste paulista. Em parceria com a Ambipar Environment, foi criado o projeto ARR Corredores de Vida, voltado para a geração de créditos de carbono. Do total de 260 mil hectares de passivos ambientais, na região do Pontal, a meta é restaurar 75 mil hectares de áreas prioritárias até 2041, com base no Mapa dos Sonhos ampliado, que passou a incluir mais 23 municípios, totalizando 30. A expectativa é a remoção de 29 milhões de toneladas de CO2e em 50 anos.
Com o projeto ARR Corredores de Vida, no período de dezembro de 2021 ao início de outubro de 2024, o IPÊ plantou 3,8 milhões de mudas. Deste total, 1 milhão foram plantadas em 300 hectares de áreas degradadas, com financiamento do programa Regenera América, do Mercado Livre. Já o restante, 2,8 milhões de mudas em 1.555 hectares, foi plantado com recurso da farmacêutica AstraZeneca, que vai viabilizar o plantio de aproximadamente 12 milhões de árvores ao todo distribuídas em 6 mil hectares até o segundo semestre de 2026. Segundo a Ambipar, responsável pela valoração e certificação de carbono, essas árvores poderão captar cerca de 2,4 milhões de toneladas de CO2eq até 2056.