Não pode dar errado. O Executivo, sempre com imensa força em início de gestão, dispõe de condições para aprovar no Congresso seus primeiros projetos. Só mesmo forte instabilidade teria o condão de inviabilizar a agenda do governo. Sinal daquilo que Roberto Campos chamava de “reversão de expectativas” é esse imbróglio envolvendo o presidente Jair Bolsonaro (PSL), seu filho Carlos e Bebianno. Mas a crise não parece debelada com a demissão do ministro na Secretaria Geral.
Se o episódio não provocar terremoto ainda maior, deputados e senadores endossarão a pauta do Palácio do Planalto, mesmo ressabiados. Após disputar renhido pleito, desfraldando a bandeira de mudanças e sob apoio popular, Bolsonaro agrega força para reformar a Previdência e aprovar o pacote anticrime e de combate à corrupção. A fragilidade da administração só ocorrerá na hipótese de não apresentar resultados.
As duas encomendas, se aprovadas, darão impulso ao governo, tirando-o do marasmo ou da sensação de baixa iniciativa, situação compreensível ante o afastamento do presidente para tratar da saúde desde o atentado sofrido em Juiz de Fora (MG). A mudança na Previdência, fixando a idade mínima de aposentadoria aos 62 anos para a mulher e 65 anos para os homens, tem um prazo para ser aprovada: até junho.
Já a blitzkrieg para combater a corrupção, o crime organizado e os crimes violentos, deverá ganhar ajustes, nada que desnature seu escopo. Os ministros Paulo Guedes e Sérgio Moro não podem perder suas causas, sob pena de abrirem um campo de dissonâncias na frente parlamentar, provocando uma decolagem turbulenta da nave governamental.
Na Câmara, com o apoio de Rodrigo Maia (DEM), serão alcançados os 308 votos para a aprovação da PEC da Previdência e também os votos para chancelar a proposta do ministro da Justiça, que abrange 19 objetivos e prevê alteração de 14 leis, entre elas, o Código Penal, a Lei de Execução Penal, a Lei de Crimes Hediondos e o Código Eleitoral.
A aprovação se torna viável ainda pelo fato de que as duas Casas congressuais estão sob comando de quadros do DEM, partido em ascensão. Na Câmara, a capacidade de articulação de Rodrigo Maia, cuja vitória se deve a mérito próprio, será decisiva. O Chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM), não via com bons olhos a candidatura do correligionário. Eleito com votação extraordinária, 334 votos, Maia poderia até vestir o manto de independência, mas sua formação liberal e o compromisso que tem expressado de levar a bom termo projetos fundamentais para o país sinalizam uma atuação firme em favor do Executivo.
Lembre-se que ele usou com mestria sua capacidade de articulação para aprovar projetos de alto alcance no governo Temer, como o teto de gastos, a Reforma Trabalhista e a Lei da Terceirização. A formação de um bloco, com mais de 300 parlamentares, reunindo PSL, PP, PSD, MDB, PR, PRB, DEM, PSDB, PTB, PSC e PMN, confere alguma segurança ao governo.
Já no Senado, o comando está nas mãos do senador Davi Alcolumbre, do DEM do Amapá, um nome que emergiu de articulação feita com sucesso por Lorenzoni, da Casa Civil. Portanto, ali também o governo contará com sólida base de apoio. Ademais, a interlocução será mais fácil tendo em vista um colegiado de apenas 81 membros. A aprovação da PEC carece do voto de 49 senadores.
O que fará a oposição? PT e PSOL parecem sem rumo. Dizer que as reformas tiram direitos dos trabalhadores é chover no molhado. O dito não mais convence. Perde para o lema: “reformar a Previdência ou quebrar o Brasil”. MDB e PSDB agirão sob o pragmatismo. Votarão a favor das reformas, com um ou outro alerta, na tentativa de fazer sobressair sua “independência”. O PSL, bancada maior da Câmara (55), superando a do PT, hoje com 52, será o carro-chefe a puxar os votos do governo. (Um alerta: partido que chega ao poder central, cheio de novatos, sem lastro doutrinário, corre o perigo de ver seus integrantes disparando tiros uns contra outros).
De todo modo, se o governo não tiver força suficiente para aprovar a mudança na Previdência, abrirá um gigantesco inferno astral logo no início do governo. E fica a dúvida: quem fará a articulação do governo? O general Santa Cruz, da Secretaria do Governo, Lorenzoni, da Casa Civil ou o vice-presidente Mourão? P.S. O papel dos filhos do presidente é uma incógnita. Uma Torre de Babel está à espreita.