Procura-se professor

OPINIÃO - Ênio César de Moraes

Data 16/11/2023
Horário 05:00

Em 2014, por ocasião de um trabalho no mestrado, tive contato com o relatório preliminar da Atratividade da Carreira Docente no Brasil, divulgado em 2009, pela Fundação Carlos Chagas. O trabalho retratava uma realidade nada animadora em relação ao interesse dos estudantes do ensino médio no magistério.
Recentemente, em produção intitulada como “Risco de apagão de professores no Brasil”, o Instituto Semesp divulgou dados preocupantes acerca do “risco iminente da falta de professores em todas as etapas do ensino básico”.
Apesar da consternação e da apreensão que esses dois documentos me causaram/causam, pelo idealismo que trago comigo desde os primeiros passos em minha caminhada profissional, lamentavelmente não houve surpresa. Isso porque, ainda na fase de formação, na década de 1990, em um trabalho da graduação, li um artigo que associava fortemente a frustração à minha futura profissão. E, convém esclarecer, não se tratava de texto de cunho político-partidário.
Mas, em uma espécie de movimento de autodefesa, olho “a grama dos vizinhos” e não me parece tão mais verde! Pela minha lente, as vidas de médico, de advogado, de policial, de psicólogo e de tantos outros profissionais estão cheias de desafios e frustrações. E certamente tem a ver com os impactos do avanço tecnológico desenfreado, pelo acesso facilitado à informação — ou à desinformação, em alguns casos —, pela velocidade da comunicação e pelo estilo de vida que nos envolve. Em outras palavras, temos um mundo cada vez mais complexo.
Houve um tempo, não muito distante, em que cada profissional era considerado autoridade. Hoje, por conta da “hiper informação”, vivemos o que eu chamaria de uma crise de autoridade profissional. Por exemplo, quem nunca foi ao médico com o diagnóstico pronto — assinado pelo Google — e até questionou seu parecer?!
O ponto é que, em relação à esfera educacional, muito antes do advento da internet, o fazer do professor já era questionado. E aí está uma das causas do desinteresse pela área, apontada no relatório supracitado: a falta de investimento na profissionalização da docência. Ao lado dessa, temos a desvalorização da carreira, o desprestígio do professor, a precarização das condições de trabalho e, obviamente, a baixa remuneração. Fatores que, conjugados, justificam a alcunha de “sofressor”, que muitos já ouvimos.
Sem ignorar toda a complexidade que permeia a discussão, temos nesses dados de pesquisa importantes direcionamentos para a possível reversão do quadro caótico que se desenha para os próximos anos. Não é algo, porém, que se modifique por decreto. É necessário que saia dos discursos para a realidade a almejada prioridade à educação como caminho para a construção de um mundo melhor.
Ouvimos frequentemente a menção à deferência do imperador ao professor no Japão. Não é apenas ele, todavia, que, nesse gesto simbólico, demonstra respeito aos mestres. Toda a sociedade o faz.
Seria bom termos em nossas autoridades essa postura exemplar, no discurso e, especialmente, na prática. Ainda a vemos, infelizmente. Mas sempre temos aquele reencontro com ex-alunos que exclamam, saudosamente, “Você foi meu professor”. Como diria o poeta, “um carinho às vezes cai bem”!

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