Por uma universidade pública e popular

OPINIÃO - Helber Henrique Guedes

Data 19/04/2025
Horário 05:00

Minha primeira lembrança da FCT Unesp (Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual Paulista) de Presidente Prudente é de 2015, quando ainda nem sabia que um dia seria estudante ali. Saí de Fernandópolis, minha cidade natal, para trabalhar na troca de computadores em escolas públicas, e foi em uma dessas viagens que avistei, pela primeira vez, a movimentação intensa da FCT, aquele campus com sua placa imponente. Na época, Unesp para mim era sinônimo de algo grande demais, distante demais, inacessível para quem vinha da periferia e da escola pública.
Foi só depois que descobri que aquela universidade era, na verdade, uma das maiores instituições públicas de ensino do Estado de São Paulo, criada em 1976, durante a reforma que unificou os Institutos Isolados de Ensino Superior. A unidade de Presidente Prudente, antes chamada FFCL (Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras), teve que enfrentar cortes de cursos, demissões e o medo do fechamento. Mas resistiu. E mais do que resistir, se reinventou. Em 1989, tornou-se oficialmente a FCT (Faculdade de Ciências e Tecnologia). Hoje, abriga 12 cursos de graduação, cinco programas de pós-graduação, dezenas de projetos de extensão e o maior número de ações extensionistas entre todos os campi da Unesp.
Foi nesse mesmo lugar que, em 2016, iniciei minha trajetória acadêmica, primeiro na Licenciatura em Química e, depois, em Geografia. Foram anos desafiadores. A base escolar que trazia era frágil, a condição financeira apertada, e o apoio familiar era limitado, apesar do esforço incansável da minha mãe. Mesmo assim, ali encontrei sentido e pertencimento. Encontrei também luta: participei de greves, do Diretório Acadêmico, de comissões institucionais, e fui moldado por uma universidade que me formava não só com conteúdos, mas com consciência.
A FCT/Unesp não me ensinou apenas dentro da sala de aula — ela me ensinou a habitar o mundo. Foi através dela que conheci Estados e países que pareciam impossíveis. A Unesp me levou para Bahia, Ceará, assentamentos rurais, e diversas vezes para São Paulo, capital. Também me levou além das fronteiras: fui ao Uruguai e à Argentina participando de atividades acadêmicas e culturais. Meu primeiro voo de avião aconteceu por causa da Unesp. Cada viagem foi uma aula viva, um convite a pensar além do território em que nasci. Cada experiência foi a prova de que a educação pública pode (e deve) ampliar horizontes reais.
Aprendi que a Unesp não é feita só de paredes, mas de pessoas. E que essas pessoas são o motor de uma universidade viva. Fui representante discente na congregação da unidade, nas comissões de permanência estudantil, no Comitê de Ação Cultural Local e Central, e na Câmara Central de Extensão Universitária e Cultura. A partir daí, idealizei o Projeta Cine, que coordeno até hoje e que promove educação ambiental e cultura como ferramentas de transformação social.
A FCT me deu chão, me deu voz e me deu futuro. Mas seria desonesto não lembrar que a universidade pública ainda carrega as marcas de sua origem excludente: foi pensada para poucos. Os desafios seguem — falta professor, há risco de precarização, e discursos privatistas rondam constantemente as instituições públicas. A universidade ainda é, muitas vezes, eurocentrada, elitista, e precisa se reconhecer para poder se reinventar.
Mas nós, estudantes periféricos, negros, pobres, seguimos ocupando e transformando esses espaços. Seguimos existindo e resistindo. E é justamente isso que torna a universidade um lugar de potência.
A FCT/Unesp não foi só um lugar de passagem para mim — foi o ponto de partida. Que mais jovens tenham a chance de subir a Rua Simonsen e, como eu, se encantarem com a possibilidade de um novo mundo. Porque a educação pública transforma. E eu sou prova disso.


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