«Língua lusa minha
não sei se sonhas ó língua! Sei, sim que deixas sonhar.
Língua! Lusa língua minha companheira é amiga,
fraterna, e arauto.
Rejeita espaços herméticos, fechados, limitados por
falsas fronteiras. Veste-se
literariamente de tendências universalistas.
E quando um dia transportada em caravelas foi impelida
a sonhar com “novos mundos”
deixou-se conquistar. Conquistámo-la! É ternuramente
nossa.»
Tony Tcheka, Língua Lusa
Majestoso e imponente, o Poilão concedia a sombra necessária para que nos sentássemos e desenrolássemos, por horas a fio, o novelo de uma conversa prazenteira, pacata e agradável... e entrementes, o sol percorria o seu habitual e caloroso caminho, em direção ao poente.
A voz afável do professor doutor Rui Jandí – magnífico reitor da Universidade Lusófona da Guiné e filho do falecido Régulo dos Cassangas, fazia-se ecoar na minha mente, enquanto as suas sábias palavras percorriam e preenchiam o meu cérebro curioso.
Bem na fronteira com o Senegal, no extremo Norte da Guiné – Bissau me encontrava, numa breve passagem pela Tabanka de Gan Jandí, território dos Cassangas e em amena cavaqueira com um dos filhos do antigo Régulo da região, buscava mais conhecimento sobre esta pequena etnia.
Pequena em dimensões, existindo hoje pouco menos de 200 membros da mesma; mas com um trabalho magnífico, no que toca à reflorestação do seu território e do país e na preservação da natureza, das tradições e dos costumes.
O Poilão é árvore sagrada, para este povo, e junto ao mesmo, são praticados sacrifícios de animais, em honra a Irã – divindade guineense, são celebrados acordos e casamentos e são deliberados juízos e julgamentos. Nesta tarde, cumpre um dever ainda mais sagrado, como já lhe é habitual: é escola, onde se ensina e se aprende... onde se transmite sabedoria e ciência.
Na sombra do Poilão, se senta o Régulo – ancião regedor e juiz: julga, rege e ensina; junto a esta árvore sagrada, cresce e desenvolve-se a comunidade; junto a esta árvore, a religiosidade é concretizada e ensinada.
Povo animista, os Cassangas acreditam que o mundo está repleto de espíritos, que connosco interagem, influenciando as vidas humanas, beneficiando ou prejudicando-as; veneram e idolatram os espíritos dos ancestrais – familiares falecidos ou membros relevantes da coletividade, que mediam a relação com os outros entes sagrados e os espíritos naturais: dos animais, das árvores, dos rios e do vento e outros, com enorme poder e difíceis de controlar.
O próprio Poilão – árvore sagrada é, ele mesmo, morada de vários espíritos naturais e dos ancestrais e junto ao seu tronco, ouve-se a voz desses espíritos, tenta-se aplacar a sua ira e promover a boa disposição dos mesmos; busca-se por conselho e promove-se a harmonia.
Junto ao gigante sagrado, observando o cair manso da tarde, aprende-se com as palavras e com o silêncio.