Todos somos de algum lugar, mas, na prática, é como se não fôssemos de lugar nenhum. Nosso local de nascimento implica em uma série de características e pertencimentos que são determinantes para o que agora somos. Mas, nem todos se identificam com esse pertencimento e são muitos os que vão embora para nunca mais voltar. Entre esses existem aqueles que lá continuam, com a alma, o pensamento e os sentimentos nos locais onde nasceram.
Vejam o caso das cidades pequenas, para alguns um verdadeiro tormento, ao ponto de buscarem a fuga e o completo afastamento de modo desesperado, não sem motivos, por óbvio. As limitações impostas pelo diminuto espaço geográfico da urbanidade impõem à pequena população o arbítrio dos fatos sociais, que se impõem a eles como paredes instransponíveis. A transgressão aos hábitos e costumes arraigados entre os moradores faz do transgressor um pária, que se vê diminuído na sua individualidade, daí a fuga.
Uma vez fora, procuram é acabar por encontrar a si mesmos, aquilo que sempre foram ou que gostariam de ser, mas que as condições talvez impedissem. Não querem voltar, sentem-se oprimidos apenas em pensar nisso. São felizes distantes das suas origens que os oprimem. Lá, talvez, ficam desterrados, ausentes da terra que os fez e sentem-se bem assim, sem um lugar para chamar de seu, embora com seu ser em plena manifestação do existir. A sensação é sempre essa, a do desterro, mas é sempre uma escolha feliz, assim me parece.
Por isso causa espanto e admiração aqueles que ousam voltar. Aqueles que cansaram do desterro e enxergam nas origens o berço onde vão se sentir acolhidos, abraçados e queridos. Por quanto tempo é difícil dizer, nem os próprios o sabem. O ar é sempre de derrota e justificativas, das mais racionais, ao retorno. Admissão de culpa, sensação de vazio, vitória e derrota à revelia do espírito. Alguns ficam e vão ficando, sem prazo determinado, dando-se ao descanso.
Talvez seja preferível ficar assim, desterrado, sem aquele pertencimento que efetivamente não é seu. Sensação de estar sempre fora, distante da terra, é assim que é, quem somos. Andando pelas ruas de todos os lugares, percebe-se que todos são seus naquele momento, muito embora, o não pertencimento apareça aos olhos sensíveis. É como se estivéssemos sempre de passagem, de malas sempre prontas para uma viagem que parece durar enquanto levamos a vida. Nem mesmo o céu é aquele, os barulhos da noite, aqueles pios e cantos tão familiares. Fácil não é, por isso acabamos voltando, vez ou outra.
Acontece que não somos dali, nem daqui e nem de lugar nenhum nesse mundo. A negação não nos fará encontrar nosso lugar, estaremos sempre à procura sem encontro, ao menos, aqui e agora. Mas continuaremos a busca, é próprio do ser a angústia, a insatisfação e a pressa em sentir-se bem. Existem alguns que nem mesmo podem voltar, mesmo se o quisessem. Todos se foram, ficou apenas a casa em ruínas. Nesses casos, não existe alternativa, ficaremos fora, para sempre.