Paulina Chiziane

António Montenegro Fiúza

«Um  estrondo  ouve-se  do  lado  de  lá.  Uma  bomba. Mina antipessoal.  Deve  ser  a  guerra  a  regressar  outra  vez. Penso em esconder-me. Em fugir. O estrondo espanta os  pássaros  que  voam  para  a  segurança  das  alturas.  Não. Não  deve  ser  o  projétil  de  uma  bala.  Talvez  sejam  dois carros em colisão pela estrada fora.  Lanço os  olhos  curiosos  para  a  estrada.  Não  vejo  nada.  Apenas  silêncio.  Sinto um  tremor  ligeiro  dentro  do  peito  e  fico  imóvel  por  uns instantes» Niketche, Paulina Chiziane 
O Prêmio Camões é, indubitavelmente, o mais importante da literatura em língua portuguesa e destaca os autores lusófonos, cuja obra tenha cooperado para o engrandecimento do patrimônio literário desta que é a nossa pátria. Instituído em 1988, o Prêmio Camões já destacou 33 autores, oriundos de quase todos os países da CPLP (Comunidade de Países Língua Portuguesa), exceção feita, até esta a São Tomé e Príncipe.  
Neste ano de 2021, a consagração foi dada a Paulina Chiziane, a oitava mulher a receber o prêmio, de forma global e a primeira em Moçambique. A autora descreve-se como uma transmissora da memória coletiva, uma contadora de histórias. 
«Eu venho de lugar nenhum. Eu sou aquela pessoa que aprendeu a ler e a escrever, foi escola... Teve essa sorte, mas também teve a sorte de caminhar pelo país e descobrir as maravilhas que este país tem. Então, eu não sou, propriamente, aquela pessoa que se pode dizer 'Ela veio de um estrato social X, assim nobre'. Não, eu vim do chão! Portanto, um reconhecimento para alguém que veio de lugar nenhum, sem dúvida, é um motivo de inspiração para uma outra geração.» Paulina Chiziane 1 
As origens humildes da vencedora do Prêmio Camões 2021 longe de constituírem um obstáculo à sua vida literária, foram a inspiração necessária para que ela pudesse, juntando as histórias contadas e ouvidas pelas ruas do país, se tornasse a primeira mulher moçambicana a publicar um romance no país: Balada de Amor ao Vento”, em 1990. 
Desde essa data, publicou ainda mais dez romances e fez ouvir a voz da mulher moçambicana, um pouco por todo o mundo. Recebeu, ainda, condecorações e prêmios, pelo trabalho feito e por obras específicas: o Prêmio Craveirinha, o grau de Grande Oficial da Ordem Infante D. Henrique, entre homenagens e reconhecimentos públicos. 
Desejamos a Paulina Chiziane, jovem sexagenária, um percurso ainda longo e profícuo e que continue a ser um estandarte da língua portuguesa.  

 


 

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