O Brasil rural era, acima de tudo, religioso. A proteção de Deus estava em primeiro lugar. Os nomes dados aos filhos, na pia batismal, agradeciam as graças recebidas. Sempre havia um José e sempre uma Maria. Depois, a devoção aos santos juninos, aos protetores contra este ou aquele mal. São Sebastião era um deles. Protegia lavouras e animais. Nas fazendas, separava-se para ele a melhor rês, desde quando parida, para, na festa do padroeiro, levá-la a leilão. Os mineiros radicados por todo o sertão sorocabano trouxeram a devoção. Estava entranhada na alma de todos. E corria a lenda que São Sebastião, oficial do Imperador romano, confessando-se cristão, foi atravessado por setas e, em seguida, morto a pauladas. Sobre sua sepultura, levantou-se uma das sete basílicas de Roma. Ele é o padroeiro contra a peste. A ele se rezava, para fechar as bocas das feras, extinguir o fogo, livrar-se do fio das facas e curar-se das moléstias. Se não o homenageassem, no seu dia, as plantações não vingavam e os animais domésticos corriam risco de morte. Vinte de janeiro, o dia do padroeiro. O coronel Francisco de Paula Goulart, aqui chegado em 1917, vinha em busca da terra prometida. Deixara, em Assis, a esposa dona Izabel com os filhos pequenos. Partiu, acompanhado de alguns primos, no trenzinho da Estrada de Ferro Sorocabana, para Indiana. Daí seguiu a pé até o legado de suas terras. A pedido da mulher, uma das primeiras construções feitas, foi a igrejinha, a uns duzentos metros da estação. Um barracão de cinco metros de comprimento por três de largura. Mais tarde, à medida que se vendiam os lotes, construiu uma igreja maior, onde, hoje, fica a fonte luminosa, na praça Nove de Julho. Data, desse tempo, o pedido de dona Izabel Dias Goulart ao coronel, para, em homenagem ao mártir, batizar, com o nome de São Sebastião, o seu filho nascido aos 19 de janeiro e colocar a imagem de São Sebastião no alto do altar-mor, como padroeiro da cidade que nascia. Concordou o coronel com o nome dado ao filho, mas, nas coisas da Igreja, quem mandava era o bispo. Devia-se pedir-lhe o “Nihil Obstat”. Dona Izabel fazia suas promessas. A Vila deveria ser Augusta. Compromissava-as com todos o seu cumprimento, pois havia, na alma dessa matrona, a fé que move os píncaros do obstáculo. E, como o Poeta de Mensagem, rezava : “É a busca de quem somos, na distância / De nós; e, em febre de ânsia, A Deus as mãos alçamos”. O coronel Goulart tinha, em suas veias, a força dos destemidos lusitanos, dos barões assinalados, que partiram da ocidental praia lusitana, para, em perigos e tocaias temperados, conquistar novas terras e dilatar a fé. A fé que remove montanhas, em qualquer lugar onde se esteja. Terminada a derrubada da mata, feita a primeira colheita, tirou-se o óbolo do santo. Eis que surgiu a Igreja, erguida de madeira serrada a mão. O símbolo da fé, o templo com a cruz dominando o espaço do novo lugarejo, ostentava a diretriz do homem - a Deus toda a honra. A obra, porém, não estava completa. Era preciso o sacerdote. Iniciou-se a peregrinação, para trazer, para a Vila Goulart, um padre. O primeiro a chegar ficou pouco tempo. Depois, veio o padre Farias. Contava-se dele que gostava duma “parati”. Após a missa, ia tomar o seu gole. Quando mexiam com ele, dizia: “Dessa água que passarinho não bebe, bebe o padre Farias, mas não é amigo de patifarias”. Permaneceu pouco na vila, assim como também o padre Pereira, português de Algarves. A seguir, um italiano, que não esquentou lugar. Depois de muita espera, eis que chegou, em maio de 1925, um espanhol de Cuenca, o padre José Maria Sarrion. Foi ele o construtor da matriz de ontem, da Catedral de hoje, e inaugurada, no Ano Santo, em 1950. No frontispício do templo, lê-se: “Christo Regi - in Honorem - Sancti Sebastiani”, ou, talvez, não se lê, o latim caiu em desuso e a fé, antes dilatada, deixou de aquecer inúmeros corações.