Nesses tempos de medo e depressão, chovem platitudes e truísmos, na esteira de profetas, videntes e assemelhados que se multiplicam por todos os quadrantes: "depois da pandemia, o mundo será mais solidário", "veremos avanços nas áreas das ciências", "os países serão menos globalistas e mais protecionistas", etc.
Em praticamente todas as projeções, prega-se o advir de um mundo diferente, um planeta mais solidário no enfrentamento das crises, hipótese bastante plausível ante a constatação de que a catástrofe de uma nação, a partir da contaminação por um vírus, atinge a todos.
Na prospecção de hoje, tento enveredar pela trilha a que muitos têm se dedicado: como seria esse "novo normal"? Antes, é útil fazer rápida apreciação sobre a paisagem social em que se abrigou este Covid-19.
Ele se infiltra numa sociedade plena de desigualdades, diferenças culturais, modos de vida, democracias vigorosas e outras nem tanto, enormes conglomerados produtivos, economias competitivas, uma infinidade de micro e pequenos negócios, desemprego em massa, debilidade nos aparatos de defesa da saúde, competitividade, acúmulo de riquezas por parte de grupos, extrema miséria e fome.
De pronto, a inferência emerge: o impacto é diferente em núcleos, grupamentos profissionais e classes sociais. Uns sofrem mais que outros. Mas há um fio que liga todos os seres humanos: o vírus não distingue ricos e pobres, maiorais e pequenos.
Dito isto, fica patente o susto que corre nas veias dos habitantes da Terra: como é possível um micro organismo, invisível a olho nu, um dos milhões de vírus que circula pelo planeta, desfazer da noite para o dia coisas, projetos, empreendimentos construídos com tantos esforços, alguns sendo produto de toda uma vida?
A morte mora perto. Virou número. Hoje, a cena mostra caminhões transportando corpos mortos para covas coletivas.
E tudo isso aprofunda nossas feridas. Certa amargura fluirá pelos nossos corações, ao lado do descrédito e da descrença nos padrões da velha política. Como a política entra aqui? Ora, pelo descalabro com que a crise foi tratada por alguns governantes. Pela falta de equipamentos básicos. Pela ineficiência dos serviços públicos, mesmo sob reconhecimento de que os profissionais da saúde foram heróis.
A sensação é a de que o Senhor Imponderável, que nos visitava em alguns períodos, doravante aparecerá com mais frequência. Tal constatação pode nos tornar um povo mais medroso, menos confiante, mais pessimista. A bem da verdade, eis um contraponto: "quem venceu esse demônio invisível, terá condição de vencer outros que nos atacarem".
Amém.