Chove lá fora. Um vento frio uiva e faz lembrar que ainda estamos no inverno. Há riscos de granizo nos bairros rurais e corte de energia em algumas áreas da cidade. Dizem que um novo ciclone extratropical se formou na costa do Rio Grande do Sul e provocou fortes temporais em áreas da Região Sul. Uma frente fria se formou a partir deste ciclone e avançou em direção à São Paulo e Mato Grosso do Sul. As chuvas causam estragos em vários pontos do estado. Essa sucessão de eventos atmosféricos que se repetem ano após ano nos conectam a um tempo cíclico que parece não ter fim. Fico imaginando a nossa insignificância diante de processos numa escala continental. Estamos falando de interações entre as águas oceânicas e as massas continentais como se houvesse uma conversa entre o Pacífico e o Atlântico, mediada pela Senhora América do Sul. Aqui não passamos de um mísero pontinho no mapa do mundo!
De fato, em março deste ano foi confirmado o fim do fenômeno “La Niña” (caracterizado pelo resfriamento anormal das águas do Oceano Pacífico Equatorial) após três anos de duração com diversos eventos extremos (secas prolongadas, inundações, tempestades), o que indicava o início de condições de neutralidade. Mas os meteorologistas registraram entre abril e maio um rápido aquecimento das águas do Pacífico e intensificação da interação oceano-atmosfera, confirmando o início do fenômeno “El Niño”, como declarado pela Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (NOAA, na sigla em inglês). Como o “El Niño” altera os padrões de transporte de umidade, assim como das temperaturas e distribuição das chuvas, lá vem mais secas prolongadas, calorão e a intensidade de temporais devido à concentração das chuvas em poucos dias! Afinal, fazemos parte de uma zona de transição entre o sul do país (onde o fenômeno provoca chuvas intensas), e o Norte-Nordeste (onde as secas serão muito piores).
Pois é... o tempo cíclico é soberano. Tudo depende dele. O plantio, a colheita, a vida. Não há passado, presente, futuro. Mas começo, meio e... começo novamente. Isso não é repetição, mas um tempo que retorna sempre de forma diferente. É um tempo concreto, não linear. E os ventos uivantes agora fazem a janela tremer, como se estivessem insistindo para eu escutar o canto das Danaides, aquelas mulheres condenadas por Zeus a retirar água de uma fonte fazendo uso eternamente de uma jarra furada. Condição que, lá na morada dos deuses, nem mesmo Ganímedes (protetor da água potável) tinha autorização de romper.