Na área de casa, de piso vermelho e espaços retangulares, o avô e o menino estão sentados, cada um em uma cadeira, conversando e aproveitando o final de tarde. O menino está pensativo, aparentemente, dedica-se a refletir em questões existências de certo vulto. O avô apenas o acompanha, feliz, com a calma, a clareza e sabedoria que falta à curiosidade tenra e ansiosa do menino. Balançando as pernas na cadeira, muito maior do que seu tamanho, ele pergunta:
____O vô, você acredita em fantasma? O interlocutor não sem surpresa, responde:
____ Sim, acredito meu neto, acredito em fantasma, espírito, todas essas coisas.
____ Mas você já viu fantasma vô?
____ Ver eu não vi, mas, muitas vezes, senti algumas coisas que podem ser fantasmas, quem sabe.
O menino continuou pensando, mas não parecia satisfeito com as respostas evasivas do avô.
____ E lobisomem, você também acredita vô? Dessa vez a pergunta veio com certa ironia por parte do pequeno.
____Hum, lobisomem, não sei, pode ser que sim. Sua avó disse que viu um quando era jovem, nessas estradas de sítio por aí, ela morava no sítio você sabe né? Tem muito mistério por aí, quem sabe, ela viu, eu mesmo não vi, mas acredito.
____ Ah vô, não dá para acreditar em tudo não vô. Na escola a professora falou que tudo isso aí é bobagem, Lobisomem, vampiro, saci-pererê, folclore é o nome disso, não entendi, acho que folclore é outra coisa que eles acreditam.
O avô permaneceu quieto, apenas observando o neto falar na sua inocência. Era, afinal, um grande admirador da inteligência do menino e gostava sempre de aprender com ele.
O menino sentia-se, de certa forma, contrariado, talvez esperasse, sem o saber, uma atitude mais cética do avô, um adulto que sempre pareceu muito sensato. Resolveu dobrar a aposta e mais uma vez questionar o ascendente.
____ Sabe vô, lembra aquele dia que fomos na igreja, eu, você e a vó, então, eu não acreditei em nada daquilo que o pastor falou, parecia tudo mentira aquilo. E você vô, também acredita em Deus, Jesus, essas coisas aí? Que teve aquele homem lá que viveu 950 anos, você acredita nisso também?
O avô ficava meio desconcertado com as perguntas, mas seguia firme no propósito de fazer o menino pensar, talvez, por si mesmo.
____ Acho que sim, por que não? Deus existe sim, anjos existem, até esse homem aí que viveu tanto pode existir, eu acredito, ter certeza, acho que nem padre e nem pastor tem, mas que acredito sim.
____ Ah vô, desse jeito não dá, como a gente vai acreditar em tudo isso, Deus, lobisomem, fantasma. Eu não sei, respondeu com certa aflição. O avô olhou em volta, convidando o menino a fazer o mesmo.
____ Veja você meu neto, todo esse mundo é tão maravilhoso, tão bonito e a gente quase não sabe nada sobre ele, sabemos, mas pouco, no fim, temos mais perguntas do que respostas, assim como você. Mas, o mundo existe, nós existimos, e se tudo isso existe, por quais motivos todo o resto não poderia existir? Já pensou no quanto é incrível podermos estar aqui vivendo e fazendo essa pergunta?
____ Vô, você realmente sabe das coisas...
