A temática acerca do medo e de suas consequências sociais representa um assunto recorrente na história da filosofia. Nesse sentido, é importante ressaltar o impacto da obra de um dos principais contratualistas da Idade Moderna, a saber: Thomas Hobbes. Segundo o pensador, o período anterior ao surgimento do Estado e da sociedade civil era caracterizado pelo "medo generalizado", já que todos os indivíduos viviam numa espécie de "guerra de todos contra todos". Sendo assim, havia uma insegurança tétrica e paralisante que dominava o imaginário popular, pois o medo da perda dos bens materiais e da própria vida impedia que os homens pudessem desfrutar de suas liberdades elementares.
Para Hobbes, somente a instituição de um Estado centralizado, forte e absolutamente soberano é capaz de assegurar a paz social verdadeira, mas, para tal, os indivíduos teriam que abdicar da liberdade política. Em vista disso, fica clara a relação entre o medo e o poder de dominação.
Em um cenário marcado por profundas crises institucionais e sociais, o medo fomenta uma insegurança constante e passa a dominar os indivíduos, impedindo-os de exercer genuinamente os direitos fundamentais e a cidadania efetiva. Obviamente, há uma grande parcela de culpa do poder público, o qual foi negligente em seus deveres constitucionalmente previstos na promoção da ordem pública. Contudo, as crescentes sensações de angústia, inquietação e impotência fazem com que os cidadãos se abdiquem, de forma gradativa, do cumprimento de obrigações cívicas e, por conseguinte, atenuam a responsabilidade pessoal diante do bem comum. Desse modo, o medo exerce um papel de inibição da concepção republicana de liberdade enquanto um fato político genuíno.
Diante do exposto, a filósofa alemã Hannah Arendt afirmava que o medo constante e generalizado faz com que os cidadão se tornem membros de uma massa facilmente manipulável. Dessa forma, a ascensão das massas revela a formação de indivíduos, os quais escondidos em seus medos e rancores são incapazes na promoção de uma organização coletiva legítima e impotentes na ação em prol de um ideal de justiça.
Destarte, os cidadãos massificados são dominados por uma impessoalidade, não possuem identidade própria e se encontram atomizados, ou seja, isolados dos seus semelhantes. Para Arendt, tais pessoas inseguras e medrosas caem facilmente em discursos totalitários e cedem aos anseios e desejos de grupos dominantes. Portanto, pessoas dominadas pelo medo são meras engrenagens de uma burocracia. Dessa forma, a despreocupação dos indivíduos com o bem comum e com a harmonia das relações que formam o núcleo da sociedade acabam por favorecer o surgimento de regimes autoritários, pois a omissão dos cidadãos na esfera pública faz com que o Estado reivindique para si maior influência nos setores e instituições civis.
Em vista do que foi apresentado, é preciso resgatar o papel dos indivíduos na busca pelo bem comum e pela valorização da cidadania, pois a impotência provocada pelo medo inibe, em última instância, a própria liberdade. Por certo, o medo nunca estará ausente, mas a coragem para perseverar no bem e na justiça não se encontra na ausência do medo. Segundo Mark Twain, “Coragem é a resistência ao medo, domínio do medo, e não a ausência do medo". Enfim, é preciso valorizar a esperança, a ação política virtuosa e, sobretudo, a coragem para ser livre.