O gari e a vassoura

Estava dentro do meu carro, parada, esperando o sinaleiro abrir para eu seguir. Era em uma esquina, em frente a um prédio, que um dia foi hospital. Manhã bonita, ensolarada e de repente avistei um gari, com sua vassoura, cuidando do seu quadrilátero. Ele varria com cuidado as guias da rua, observava que preocupava-se com as sujeiras, folhas, papeizinhos, e muitas coisas mais. Concentrado em seu ofício, seguia deixando tudo limpo. Recolhia em um tambor-lixo com rodas, tudo que deixava a rua suja. Caprichoso, sensível e concentrado, ia seguindo pela ladeira sem se preocupar com o resto do mundo. 
Como era uma esquina muito movimentada, observei que todo um pequeno raio de circunferência onde ele encontrava-se, continuava limpo. E o resto, já encontrava-se sujo de papel, de plásticos, folhas e galhos secos, bituca de cigarros, latas de refrigerantes e cervejas vazias, etc. E ele, o gari com sua vassoura, seguia ilustre. Seguia o seu caminho, limpando e deixando tudo brilhando, mesmo com o resto todo corrompido. Ele seguia para frente, sem preocupar-se com o que já havia limpado. Ele seguia preocupado com o que estava por vir, e dedicava-se com muito zelo com cada pedacinho do seu quadrilátero. 
O gari, com sua vassoura, sustentava com sabedoria o seu ofício, com objetividade e certeza. Seguia limpando, limpando e limpando no percurso que o sistema determinou. Inspirada e admirada com o trabalho do gari, esqueci que na esquina movimentada o sinaleiro iria abrir, foi quando as buzinas despertaram-me para encerrar o sonho ali. E dali segui o meu caminho, pensando sobre ali e o que vivi. 
Penso que assim como o gari, devemos cada um de nós realizarmos o nosso papel. Olhar para nosso universo interno e reconhecer em nós mesmos, o que queremos, o que gostamos e o que desejamos. Muitas vezes, pensamos que, se o outro faz, porque não fazer também. Se o outro joga lixo na rua, por que não jogar também. Em tempos tão velozes, acelerado e muitas vezes, mecânico, não paramos para observar a natureza, as pessoas, o quadrilátero onde estamos inseridos. 
Como o gari, olhar para trás de que adiantaria? Ele tinha ainda um percurso grande pela frente. Ele tinha certeza de que já havia realizado o seu trabalho. E que ainda havia muito por fazer. Ele seguia. Todos temos o nosso papel. Muitas vezes, o mais importante é focar em si, próprio, e des-focar do todo. Focar no todo é cegar-se em meio às lágrimas. Você vê tudo e nada ao mesmo tempo. Há momento de se recolher e momento de expandir-se. Jamais conseguiremos permanecer no controle de algo, por muito tempo. E perfeição não há, se nos enganamos que poderemos chegar a ela, torna-se um tédio. O gari e sua vassoura. 

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