MPE dá 5 dias para Prefeitura restituir R$ 2,3 mi aos fundos da criança e do idoso e vê “deslealdade” com sociedade civil

Executivo sacou recursos sem anuência dos conselhos a fim de honrar compromissos financeiros; Promotoria de Justiça aponta que medida fere de morte a finalidade social dos fundos

PRUDENTE - ANDRÉ ESTEVES

Data 05/06/2024
Horário 16:51
Foto: Maurício Delfim Fotografia
Prefeitura é orientada a devolver valores retirados dos fundos da criança e do idoso
Prefeitura é orientada a devolver valores retirados dos fundos da criança e do idoso

O promotor de Justiça de Presidente Prudente, Marcelo Creste, instaurou um inquérito civil para apurar o resgate de R$ 2.381.233,73 das contas correntes do FMDCA (Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente) e do FMI (Fundo Municipal do Idoso) pela Prefeitura. Além disso, expediu recomendação à administração municipal para que, no prazo de cinco dias, restitua com juros e correção monetária os valores sacados, comprovando a devolução nesse período.

No documento, o promotor ressalta que o não acatamento injustificado da recomendação leva à propositura de ação civil.

Em nota, a Prefeitura, por meio da Seajur (Secretaria de Assuntos Jurídicos e Legislativos), informou que recebeu a recomendação do MPE (Ministério Público Estadual) e que irá analisar o teor do documento para então se manifestar dentro do prazo concedido de cinco dias úteis.

Marcelo Creste destaca que a situação demanda instauração de inquérito civil, posto que a conduta dos gestores é ilegal e inconstitucional, além de pontuar que o uso desses recursos não é da alçada do Executivo.

"Ora, grande parte da receita dos fundos decorre da doação de cidadãos contribuintes e não da afetação de receita do município, que ele mesmo arrecada com a cobrança de impostos, taxas e multas. Igualmente, não se aplica porque os fundos da criança e do idoso não estão sob a gestão do chefe do Executivo, que sobre eles não tem qualquer ingerência", menciona.

O promotor acrescenta que a conduta administrativa fere de morte toda a ideia que norteou a criação dos fundos e a participação social na alocação de receitas, por meio de doações, inibindo e desencorajando a participação social na formulação de políticas públicas de suma importância. "É, de certa forma, uma deslealdade do gestor para com a sociedade civil", pontua.

Expediente na Câmara

A Câmara Municipal deliberou, nesta terça-feira, pela abertura do expediente nº 21/2024, que trata sobre os resgates em questão. Os ofícios que deram origem ao expediente foram protocolados pelos próprios conselhos municipais. Após a abertura do expediente, o presidente da casa, Tiago Oliveira (PP), determinou o encaminhamento do documento na íntegra a todos os membros da Comissão Permanente de Fiscalização e Controle, com prazo de até 10 de junho, a fim de que esta oriente os encaminhamentos que julgar necessários.

De acordo com ambos os conselhos, a administração municipal realizou, no dia 14 de março, resgates de R$ 1.365.921,98 do Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente e R$ 1.015.311,75 do Fundo Municipal do Idoso, totalizando R$ 2.381.233,73. Nos dois casos, não houve anuência por parte dos conselhos.

No ofício protocolado junto à Promotoria de Justiça de Presidente Prudente, os conselhos, junto ao Gepac (Grupo de Empresários e Profissionais Amigos da Criança), apontam que, há vários anos, a comunidade de Prudente vem sendo sensibilizada para destinar parte do seu IRPF (Imposto de Renda da Pessoa Física) para esses fundos municipais, o que tem contribuído para o aumento da arrecadação. Destacam que, no entanto, "sem qualquer justificativa, diálogos ou esclarecimentos", o Executivo retirou valores das contas dos fundos, com "significativa redução" do montante que se encontrava na instituição financeira.

"Esta situação causou um desconforto geral. Em primeiro lugar, porque nenhum prefeito até então ousou mexer no dinheiro dos fundos. Ao contrário, muitos se associaram às campanhas para buscar aumentar a arrecadação. Em segundo lugar, porque, com este saque indevido, muitos projetos que seriam financiados pelos conselhos serão prejudicados, podendo até ocorrer a sua extinção por falta de verbas", expõem.

"Esta ação do Executivo, além de ilegal, é imoral, pois atenta contra todo o trabalho que foi desenvolvido há mais de 20 anos, visando aumentar a arrecadação dos fundos. E não se deve esquecer que os maiores prejudicados são crianças, adolescentes e idosos", completam.

Os representantes afirmam aguardar as providências que se fizerem necessárias no sentido de restituir aos respectivos fundos os valores sacados indevidamente, sem prejuízo de juros e correção monetária, e analisar as consequências de natureza civil e criminal em relação ao "gestor ímprobo".

Prefeitura descartou ilegalidade

Procurado nesta terça, o assessor da Secom (Secretaria Municipal de Comunicação), Miguel Francisco, afirmou que não há ilegalidade na ação da Prefeitura, que se embasou na emenda constitucional nº 93/2016, a qual trata sobre a desvinculação de receitas federais, estaduais e municipais. Segundo ele, os valores resgatados foram creditados aos cofres gerais da Prefeitura com o objetivo de honrar compromissos financeiros da administração pública.

Miguel destacou que, nos últimos anos, os fundos municipais em questão contam com valores remanescentes que não receberam destinação. Ainda segundo ele, mesmo depois dos referidos resgates, o Conselho Municipal da Criança e do Adolescente e o do Idoso dispõem, respectivamente, de R$ 2,5 milhões e R$ 1,8 milhão, que podem ser utilizados para o financiamento de projetos sociais.

Publicidade

Veja também