A 3ª Delegacia de Homicídios da Deic-8 (Divisão Especializada de Investigações Criminais), de Presidente Prudente, concluiu na semana passada o inquérito sobre a morte da travesti Tamires, mais conhecida como Pompéia Ramos Pop. O crime chama a atenção pela forma como foi encontrado o corpo: vítima seminua, com ferimentos na cabeça, pescoço e peito, feitos por objeto pontiagudo. Três homens foram presos e confessaram o crime por desacordo de um programa sexual. O homicídio que vitimou a travesti traz alerta sobre a transfobia, números que preocupam.
Aline Fernanda Escarelli, advogada que acompanha o caso, também foi responsável pela liberação do corpo da vítima, pois a família mora em outro Estado. Conforme a advogada, dados do Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais) mostram que 80 pessoas trans foram mortas só no 1º semestre de 2021 no país. Além disso, afirma que pelo 12º ano consecutivo, o Brasil é o que mais mata transexuais no mundo.
De acordo com Aline, a rejeição familiar, marginalização econômica e impunidade podem explicar a “alta contínua” dos números, e que a inclusão no mercado de trabalho poderia reverter o cenário. “De modo que não posso afirmar se [a morte da Pompéia] foi transfobia, mas os números gritam essa realidade”, lamenta. A advogada é membro do grupo “Frente Pela Vida das Mulheres”, que realizou uma campanha para angariar dinheiro, a fim de conseguir o translado do corpo da vítima.
“Conseguimos localizar a família, e em dois dias, conseguimos os valores, justamente em solidariedade à família. Mesmo diante da tragédia e da dor dos familiares, a Frente Pela Vida das Mulheres e apoiadores foram surpreendidas com a generosidade das pessoas”, salienta.
Tamires, de 26 anos, era natural de Cuiabá (MT) e, antes de adotar o nome, era conhecida como Sonir Fabio Ramos. Há mais de 8 anos, ela não tinha contato com familiares e estava em Presidente Prudente há aproximadamente cinco meses. Desde muito jovem, “Fabio”, como era chamado, teve a infância e adolescência conturbadas, e viu na rua uma forma de fugir dos problemas pessoais.
“Ele queria ser uma mulher, tinha essa busca dentro dele”, afirma a irmã, Elaize Maria Ramos, 33 anos. “Acreditava que a família não queria aceitar, então pensou: ‘tenho que ir para longe’. Achou que poderia ser fácil, mas foi sofrimento demais. Então, ele conseguiu realizar o que ele queria”, explica. A mãe de Elaize teve oito filhos, sendo que todos foram doados para outras famílias. A não ser ela e “Fabio”, que ficaram com a tia.
O corpo de Pompéia foi encontrado no dia 19 de junho, mas até o reconhecimento, a família foi comunicada da morte na tarde de segunda-feira, 21, após contato de um investigador de polícia. “Pensamos que era um trote, porque não tínhamos contato com ele há muito tempo. A polícia conseguiu nosso telefone em um hospital em Santa Catarina, onde ele passou por atendimento uma vez”, relata.
Descrita como uma pessoa “muito amorosa”, "carinhosa", “inteligente”, “amante da cozinha e da literatura”, Pompéia não teve a chance de viver como ela gostaria. “Pelo decorrer da vida e conforme teve essa transformação, as portas foram menores, e a melhor coisa para se sustentar, com certeza foi o mundo de prostituição, por medo da sociedade”, lamenta Elaize.
A saudade é um sentimento que sempre esteve presente na relação entre Pompéia e a família. Nos últimos oito anos em que esteve distante, sem dar notícias, a esperança era de que o retorno fosse breve. “Nos falaram que há três dias ele estava com o pensamento de ver a família. Estava perto de pelo menos olhar para meu irmão, mas a crueldade da humanidade foi mais forte. Esperava receber ele vivo, mas chegou todo judiado, transfigurado, de um modo que ninguém merece”, conta, emocionada.
“Foi muito cruel o que fizeram. A nossa justiça será feita por Deus, não desejo que seja da mesma forma como fizeram com meu irmão, mas que seja uma realidade justa”.
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