Foi retomado na manhã desta segunda-feira, no Fórum de Pirapozinho, o julgamento pelo Tribunal do Júri de três homens acusados de homicídio qualificado, crime que teria ocorrido em janeiro de 2023, no município de Sandovalina. A sessão, iniciada em 8 de novembro do ano passado, foi interrompida após suposta divergência entre o advogado de defesa de um dos réus, que deixou o plenário e acusou o promotor de Justiça de parcialidade, postura xenofóbica e preconceito. A previsão é de que a sentença seja conhecida na quarta-feira.
Conforme divulgado pela Polícia Civil, quando concluiu o inquérito sobre o caso, em julho de 2023, os três homens foram presos preventivamente, acusados dos crimes de homicídio qualificado, ocultação de cadáver e associação criminosa. Segundo o órgão, no dia 12 de janeiro de 2023, o corpo de um homem, 34 anos, natural do Guarujá, foi encontrado em uma propriedade rural no Assentamento Bom Pastor, com mais de 20 perfurações de faca e de arma de fogo.
“Apurou-se que esses mesmos envolvidos atentaram, no dia 8 de janeiro de 2023, contra a vida de outra pessoa no município de Paranacity [PR] e, após esse primeiro crime, fugiram para o Estado de São Paulo, transportando outra pessoa que, posteriormente, foi executada e enterrada na cidade de Sandovalina”, informou a Polícia Civil. “Ao final da investigação foi ofertado relatório final representando pela prisão preventiva dos indivíduos e, após parecer favorável do Ministério Público, a Justiça decretou a prisão preventiva de todos os envolvidos, que passaram a ser réus pelos crimes praticados”, complementou.
Sessão “polêmica”
O advogado Caio Percival, defensor de um dos réus que atualmente está preso na Cadeia Pública de Curitiba (PR), divulgou uma nota, por meio de sua Assessoria de Imprensa, afirmando que o “julgamento, marcado inicialmente para novembro de 2024, que gerou grande polêmica e prejudicou a defesa, foi remarcado”.
Já em nota pública divulgada pelo MPE (Ministério Público Estadual), assinada pelo procurador-geral de Justiça, Paulo Sérgio de Oliveira e Costa, o órgão relata que, em 8 de novembro de 2024, “um advogado, conversando com seu assistente, disse em plenário que daria uma ‘surra’ no promotor de Justiça, Yago Lage Belchior”. “O comentário afrontoso e pseudo-intimidador foi ouvido pela juíza que dirigia os trabalhos, que acabou multando os defensores por litigância de má-fé. Isso após eles se retirarem de plenário e impedirem o prosseguimento do julgamento”, expõe o MPE.
“O caso, que já trouxe à tona sérias questões de imparcialidade e preconceito, será novamente julgado. O advogado esclarece que um comentário seu, feito em tom informal e privado, foi distorcido e utilizado de forma manipulativa para justificar uma reação desproporcional do promotor de Justiça durante o julgamento”, alega a assessoria do defensor. “Esse comentário, que não tinha qualquer intenção pública ou jurídica, foi retirado de contexto, sendo usado para encobrir um comportamento inapropriado do promotor, que desde o início do julgamento havia adotado uma postura xenofóbica”, segue a nota de Caio Percival.
Quanto ao MPE, este intitulou a nota pública como: “em defesa de atuação do promotor do Júri, Yago Lage Belchior”. “Esta Procuradoria-Geral de Justiça vê-se impelida a externar o seu repúdio ao comportamento de patronos de réus levados às barras do Tribunal do Júri para responder pelo crime de homicídio. O comentário caracteriza-se como afrontoso na medida em que joga por terra os princípios da civilidade e lhaneza que devem imperar entre aqueles que integram o sistema de Justiça. E caracteriza-se como pseudo-intimidador na medida em que o seu efeito sobre o intimorato membro do MPE é nulo”, enfatiza o órgão.
“Assim, deve ficar claro que o promotor da comarca de Pirapozinho, como seus colegas das outras comarcas do Estado, não vai retroceder um só milímetro na sua missão de proteger o bem jurídico mais valioso que existe: a vida. E, para tanto, todos eles contam com o irrestrito apoio do subscritor desta nota”, finaliza o procurador-geral de Justiça.
Acusação de parcialidade
O advogado envolvido no caso ainda afirma que o comportamento do promotor durante o julgamento levantou “sérias dúvidas sobre a lisura do processo”. “Em plenário, o promotor declarou que o julgamento já estava ‘decidido’ e que todos os jurados estavam ‘com ele’. Esse tipo de afirmação, aliada a informações que sugerem um relacionamento próximo entre o promotor e alguns jurados, coloca em xeque a imparcialidade do julgamento”, declara Caio Percival.
O defensor ainda sustenta que a falta de atualização da lista geral de jurados, como exige a legislação, contribui para “aumentar as suspeitas sobre a equidade do processo”. “Em razão disso, a defesa acionou a OAB [Ordem dos Advogados do Brasil] da capital paulista, que já foi comunicada para realizar uma auditoria no fórum e evitar julgamentos parciais”, comenta.
Partes envolvidas
Sobre o caso, a OAB-SP expõe que sua Comissão Permanente de Direitos e Prerrogativas foi acionada pelo advogado de defesa para assisti-lo no processo em trâmite em Pirapozinho. “A juíza que preside o feito também solicitou o acompanhamento por parte da comissão. Como o plenário do júri deve durar alguns dias, foram nomeados colegas para acompanharem todo o julgamento, garantindo, assim, que as prerrogativas do profissional sejam respeitadas”, garante a entidade.
“Vale destacar que, além de dar assistência e atendimento aos advogados [as] que são impedidos de executar o seu trabalho, sofram ameaças ou efetiva violação de seus direitos e prerrogativas, é papel da comissão, ainda, apreciar e dar parecer sobre casos, representação de queixas referentes a ameaças, afrontas ou lesões às prerrogativas e direitos dos inscritos na Ordem”, promove a OAB-SP.
“Também é responsabilidade da comissão apreciar e dar parecer sobre pedidos de desagravo aos inscritos na Ordem; fiscalizar os serviços prestados a inscritos na OAB-SP, bem como promover as medidas e diligências necessárias à defesa, preservação e garantia dos direitos e prerrogativas profissionais, bem como ao livre exercício da advocacia”, completa.
Procurado para comentar o caso, o TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) destacou não se manifesta nem emite nota sobre questões inerentes a processos judiciais. “Toda e qualquer iniciativa das partes, se necessária, se dá via peticionamento nos autos ou nos órgãos competentes para a reclamação”, indicou.