Explosão na cozinha 

Sandro Villar

O Espadachim, um cronista a favor do pajé e do pajeú

CRÔNICA - Sandro Villar

Data 05/11/2024
Horário 05:30

Quando o relógio da cozinha marcou 11 horas, dona Filó se deu conta, embora não fosse contadora, de que estava na hora de cozinhar o feijão para o almoço da família. Como sempre, a honorável senhora, como era chamada pelas amigas do clube da terceira idade, estava atrasada e, mais apressada do que entregador de pizza, ela acendeu o fogão. 
Rapidinho botou o feijão para cozinhar na panela de pressão alta e baixa que, pensando bem, também tem esse negócio de "hipertensão", quando o bico do fogão está no fogo alto, e "hipotensão", quando o fogo está baixo.
Nem teve tempo de escolher os melhores grãos tal era o seu açodamento. É que ela precisava comprar outros alimentos para completar o almoço. Vai daí que a mulher deixou a panela em fogo alto, pegou o carro e foi comprar aqueles alimentos prontos que chamamos de mistura em um supermercado não muito perto de sua casa. Ela pretendia voltar logo para baixar o fogo.
Na casa ficaram o marido dela, que já queimava óleo 40, e sua mãe de 90 anos, uma senhora com problemas de surdez e de locomoção. Dona Filó não avisou aos dois que tinha deixado a panela em fogo alto. 
Ficou desesperada ao se lembrar disso na fila do caixa e mais desesperada ficou porque a fila não "andava", depois que o cartão de uma freguesa teve um probleminha técnico.
"Bem que eu pretendia entrar na outra fila. Eu já estaria com a compra no carro", lamentou para outros clientes, enquanto olhava para a fila que "andava". E a fila escolhida continuava "travada". 
Ainda mais aflita a mulher, balbuciando palavrões, dizia aos fregueses e à moça do caixa que tinha deixado o fogão aceso e temia pelo pior: "A panela de pressão pode explodir. Será que meu marido ou minha mãe terão tempo de desligar?", perguntava, acreditando em um mínimo de perspicácia da dupla.
Não deu tempo. Ao chegar em casa, dona Filó se deparou com um cenário de terra arrasada, parecendo a Ucrânia. A panela explodiu e "voou" feijão na cozinha e até na sala. 
E logo quando o preço do feijão estava mais alto do que jogador de basquete. Ou mais alto do que a estação espacial internacional, de onde, aliás, não se observa Terra plana. Um desperdício!
Por que o marido não desligou o fogão? Tentar ele tentou quando a panela chiava mais que zumbido no ouvido.
O coitado do marido levou o maior tombo quando se dirigia à cozinha. Motivo da queda: ele era quase cego, estava com uma catarata de Iguaçu lascada, e a sogra não ouviu nada porque estava sem o aparelho contra surdez.

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