Ensaio sobre a água   

Aldir Guedes Soriano

CRÔNICA - Aldir Guedes Soriano

Data 21/03/2025
Horário 06:30

Água, Fogo, Ar e Terra são os principais elementos da natureza segundo os antigos filósofos gregos e os alquimistas medievais. Amanhã, no Dia Mundial da Água, é oportuna a reflexão acerca de sua importância e de como ela pode auxiliar na compreensão da vida, da finitude, da consciência e da justiça.
A Terra, descrita por Sagan como um pálido ponto azul na borda da galáxia, é chamada de Planeta Água devido à abundância dessa substância, que cobre a maior parte da superfície. Somos seres aquosos desde a fecundação, compostos em grande parte por moléculas de H2O. 
Saint-Exupéry passou por sede extrema após cair com seu avião no deserto da Líbia. Prestes a desfalecer, foi socorrido por beduínos com a preciosa água de que tanto necessitava. Assim escreveu: “Água sem gosto, sem cor, sem aroma, que não pode ser definida, que tomamos sem conhecer. Não é necessária a vida: é a vida.” Essa experiência o inspirou a escrever o livro O Pequeno Príncipe. 
Seja no meio ambiente, seja no organismo, a água não pode ficar parada. Ela precisa seguir os ciclos naturais do planeta. Se esse elemento ficar retido no corpo, é doença: barriga d’água, retenção hídrica, inchaço, hidrocefalia, etc. A vida requer a justa medida de água. Na dose certa ela é saúde; em excesso, afogamento. Algumas moléculas de H2O, que circulam no seu corpo, nesse exato momento de leitura, podem ter passado por rios, cachoeiras, mares e, eventualmente, no organismo de um dinossauro ou, quiçá, de figuras históricas como Dom Pedro II. Por outro lado, a mesma água pode ter percorrido circuitos menos nobres: nas veias de lunáticos, sociopatas e assassinos. Pode ter saído tanto do Jordão quanto do Tietê.
No limiar da finitude da vida, ocorre a dissolução do elemento Água a partir da desidratação intratável e irreversível, como observa a médica intensivista Quintana Arantes. Em seguida, as usinas celulares de produção de energia (mitocôndrias) são desligadas, ocorrendo a extinção do elemento Fogo. Por fim, acontece a última expiração de ar ou derradeiro suspiro. O fôlego de vida se esvai, ou seja, ocorre a liberação do elemento Ar. Em seguida, o corpo volta ao pó, perdendo a sua forma. É a decomposição do elemento Terra. A propósito disso, em hebraico, há três expressões interessantíssimas: 1) Alma Líquida (Nefesh: נפש); 2) Alma Flamejante (Neshamá: נשמה) e 3) Sopro de Vida (Ruach: רוח). Com a finitude da vida, sucedem as dissoluções desses elementos vitais – ou ânimas.  Em suma é o que ocorre debaixo do sol, sem entrar no terreno religioso, que fica por conta do leitor.  
A consciência humana apresenta três esferas, segundo o espanhol Carlos Puchal. A primeira esfera é a consciência do eu, enquanto a segunda é a consciência dos outros. A água nos ajuda a compreender, no meu entender, a terceira esfera: a consciência do mundo ao percebermos que estamos todos misteriosamente interligados. Compartilhamos as mesmas moléculas de H2O com toda a humanidade e demais seres vivos; animais ou plantas, do passado e do futuro.  
O ciclo da Água aponta para o senso de justiça. Existem pessoas desprovidas de compaixão, impulsivas, reativas e irreconciliáveis. Há muita injustiça nos dias de hoje: violência, restrições à liberdade de pensamento e de expressão, encarceramentos injustos e cobrança excessiva de impostos. A Água, no entanto, é refrescante, desintoxicante e, por que não dizer, redentora. É nela que o faltoso mergulha e emerge para uma nova vida, como a espada Excalibur, abandonando traumas, vícios, ressentimentos e ódios. A justiça pode ser simbolizada pela água. Assim, os que têm sede de justiça serão saciados.   
Lembre-se de desejar feliz Dia da Água para alguém!  

Publicidade

Veja também