A cena talvez não seja tão corriqueira por aí, mas deveria ser: criança entediada sem nada para fazer, vivendo o ócio que pode ser altamente produtivo, quando bem administrado. Com o tédio, os pequenos obtêm a independência para buscar formas de transformá-lo criativamente em algo que os satisfaça, seja lá o que for. Equilíbrio é a palavra-chave entre ter uma sobrecarga de atividades no dia-a-dia e permanecer à deriva enquanto a vida escorre feito areia entre os dedos. Nem demais, nem de menos… Crianças ocupadas ou aquelas sem estímulos não garantem esta autonomia tão importante ao seu desenvolvimento.
Uma boa parte dos pequenos está sobrecarregada de afazeres. Na rotina extenuante, de atividades que elas mesmas se propõem a fazer, muitas vezes motivadas por influências sociais, se incluem aulas de idioma, dança, música, esportes… Mesmo que benéficas ao intelecto, somadas, geram um excesso de obrigações, uma vez que exigem retorno positivo do investimento aplicado. Transtornos de ansiedade, pânico, estresse, sensação de improdutividade e quadros depressivos são possibilidades a serem desenvolvidas...
Além disso, nesta rotina acelerada, pouco tempo se sobra para a prática de uma alimentação saudável, com qualidade nutricional e tempo. Comem às pressas, às vezes dentro do veículo no traslado, se apropriando de lanches e outras guloseimas, para que deem conta de tudo o que devem fazer. Resta ainda pouco tempo para bons hábitos longe das telas digitais, dos tablets, smartphones e outros dispositivos móveis. Quintais e praças são menos explorados, não há crianças correndo, pulando, jogando, brincando e se divertindo simplesmente por prazer… Na contramão, há aqueles que já estão incorporados ao sofá, à cadeira do computador, ou mesmo à cama, dia e noite, num cenário tão prejudicial e com malefícios semelhantes quanto o da alta demanda que tira da criança a possibilidade de “ser criança”. Há robôs demais por aí...
Quantos de nós, adultos, não deixamos de desenvolver habilidades por conta das ocupações profissionais, da ausência de tempo livre? Raros, sobretudo aqueles que têm o trabalho como uma obrigação financeira para sobrevivência e não como uma recompensa. Ocupados e pouco úteis! Giram e voltam sempre para o mesmo ponto, pois normalmente focam na renda ou trabalham apenas por ela, o que gera a falsa sensação de estar feliz e satisfeito. Querem mudanças, mas não possuem potencial de criar, gerar conhecimento e inovar. Seguem à risca o capitalismo como sinônimo de sobrevivência. E não encontram tempo para contribuir.
Permitir que a criança utilize o ócio a seu favor e que busque ocupar o momento vago com atividades que exercitem sua criatividade são medidas indispensáveis. Quem sabe começando com os jogos de tabuleiro, pintura, leitura, exploração de áreas externas, brincadeiras de antigamente - corre-corre, esconde-esconde, pega-pega, pular corda, jogar bola, queimada, andar de bicicleta, patins, skate… Atividades lúdicas que também atuam contra o sedentarismo e a obesidade infantil.
Embora a criança possa receber sugestões de atividades, incentivo à prática e seja ensinada a executar, é importante garantir que ela desenvolva a brincadeira à sua maneira. Gerenciar as regras, ouvir o subconsciente, apoderar-se do dinamismo, da competitividade e até mesmo vivenciar e avaliar os riscos. É necessário raciocinar, encontrar soluções, ter insights e gerar ideias! Isso fortalecerá sua capacidade de administrar diversas questões, por meio de um olhar criativo e menos impeditivo. Vencer etapas e atingir desempenho produtivo é favorável à autoestima e ao sentimento de satisfação.
O tempo livre não pode ser carregado de culpa, de alegação de percas, sobretudo financeiras ou mesmo do próprio tempo. Isso está longe de fazer qualquer apologia à negligência e falta de responsabilidade com os afazeres. Não ter nada para fazer pode ser fazer tudo! Deixe desimpedido o intelecto! Aproprie-se do ócio e garanta à criança o mesmo. Se é moda exagerar numa extenuante rotina, prefira estar satisfeito e feliz.
Dicas de leitura
A BEIJA-FLOR E O GIRASSOL
Ninguém está livre das fatalidades que podem acontecer na vida, mas nada como um apoio especial e uma amizade verdadeira para que estes momentos sejam suavizados e a alegria volte a florescer. E mesmo sabendo que existem intempéries e diferenças entre as pessoas, nesta obra é possível ver que sempre se pode escolher pelo lado da solidariedade, compaixão e compreensão. Na história são apresentadas habilidades socioemocionais. Dodô é um beija-flor fêmea e Gil um grande girassol de jardim. Eles se conhecem após momentos de dificuldades e ambos precisam de ajuda. E, assim, se apoiam e fazem bem um ao outro. Desse dia em diante, uma amizade forte e intensa floresce entre os dois.
Autora: Paula Valéria Andrade
Ilustrações: Luis San Vicente
Editora: do Brasil
Páginas: 40
Preço: R$ 39,30
ENTRE TANTOS
A proximidade entre as pessoas é mostrada, de maneira simples e divertida, em ilustrações das personagens por meio de temas como amizade e família. Essas ligações sociais, familiares ou profissionais, muito comuns na vida real e na internet, praticamente os unem e facilitam o entendimento das relações pelo público infantil. O livro permite que as crianças conheçam a existência dos graus de parentesco entre as pessoas, um pouco da infinidade de nomes próprios ou alguns dos diferentes tipos de profissões.
Autor: Marcelo Cipis
Editora: do Brasil
Páginas: 32
Preço: R$ 46,10
Leandro Nigre é pai, jornalista, especialista em Mídias Digitais, editor-chefe do jornal O Imparcial, e idealizador do projeto Papai Educa www.papaieduca.com.br. Contato: [email protected]