A globalização e o futebol
Depois que o mundo se transformou numa coisa só, apenas algo não se misturou e permaneceu intocável: os ricos continuam mais ricos, os pobres continuam mais pobres e os emergentes vivem um sobe-desce contínuo. Um dia pensam que estão se aproximando dos ricos e no outro constatam que estão mais para o lado de onde vieram. Nada mais exemplar para comprovar essa constatação do que o futebol. Já nem se pode falar em velho futebol e também não existe um novo na verdade. O que havia de bom se espalhou e hoje não mais se podem nomear características que definiam a forma de jogar deste ou daquele país. A exportação de jogadores de alta classe do futebol sul-americano notadamente, mas também da África para a Europa aparentemente rica fez com que tudo se transformasse numa geleia geral. Os africanos que surgiram como esperança de renovação acabaram se transformando em franceses, ingleses, portugueses, alemães, holandeses, distribuindo-se principalmente para os países que foram seus colonizadores. E ao invés de transmitir aos mesmos uma forma diferente e bela de se jogar futebol foram se integrando ao predomínio da maneira local. A exportação atingiu também certos limites que eram preservados até certa época. Todos que acompanhamos nos velhos tempos a chamada "batalha de Berna" sabemos que os brasileiros provocaram o conflito diante do então grande futebol húngaro. Vale reforçar este ponto: que aconteceu com o futebol da Hungria que formou uma das melhores seleções do mundo e acabou quando o grupo se desfez? Ainda mostrou ao mundo um craque do nível de Florian Albert, um dos melhores que vi e depois, nunca mais, como o corvo de Poe. Voltemos então ao lado feio da globalização. Quem viu há poucos dias, creio que no último sábado o espetáculo de Neymar depois que foi atingido por uma garrafa de água de plástico sabe do que escrevo. Evidente que o gesto condenável da torcida do Valência deve merecer a punição com o peso que a mesma merece. Mas, evidente também que não necessitava que Neymar e outros mais do Barcelona proporcionassem o espetaculoso ato de quem estava sendo vitimado por uma chacina. Em futebol vão dizer que é coisa de terceiro mundo. Mas, infelizmente, o que não o é nos tempos bicudos que vivemos? O ponto agora são as cotoveladas. Todos sabemos que o ser humano não pode subir sem o impulso dos braços. Mas, estes não precisam estar direcionados para o rosto do adversário. E também não é preciso o show que o atingido provoca. Só para fazer um passeio de maca.
Flávio Araújo, jornalista e radialista prudentino escreve aos domingos neste espaço.