OUTRO VOO QUE NÃO TERMINOU
O aeroporto de Medellin está próximo de uma cadeia de montanhas que dificultam a aproximação das aeronaves de maior porte. O fato que conto é antigo e aconteceu em 1960 defronte a estátua do cantor Carlos Gardel que ali desencarnou em acidente aéreo. Lá estávamos para irradiar jogos do São Paulo e do Palmeiras no tempo das excursões. Ao pé do busto de Gardel um dirigente comentou: "Juro que nunca mais virei a Medellin. O local desse aeroporto me enche de pavor." Não foi por dificuldade de acesso que a tragédia com o avião que conduzia a Chapecoense enluta o Brasil e o futebol do mundo. Segundo o noticiário foi por atitude temerária do comandante do voo que pagou com a vida pela ousadia de voar sem combustível. Acidentes com voos próximos aos Andes são comuns. Conto um momento de pavor que ali vivi. Voávamos à noite para Cuenca, Equador. Um vulcão em erupção à direita era um espetáculo de cores. Encantavam os olhos e horrorizavam as mentes. Eis que o jogador Nardo, autor do gol palmeirense na decisão da primeira Libertadores contra o Peñarol gritou de sua poltrona à direta: "o motor está pegando fogo" e um princípio de tumulto se espalhou entre nós. Num átimo o motor se apagou e a hélice ficou estática. Jato? Nada disso. Era um antigo DC-3 da Equatoriana de Aviação. Poucos minutos depois o motor da esquerda soltou faíscas e por um desses milagres que só Deus explica o da direita, do lado do Nardo, voltou a funcionar. O motor da esquerda foi desligado e o voo completou-se com apenas o da direita. Momentos terríveis. Dizem que em casa de enforcado não se encontram cordas. Não temo algo do tipo e com a passagem que narrei muitos já sabem onde quero chegar. Flavio Filho, meu primogênito e que se foi de nosso convívio na queda do Fokker 100 da TAM há 20 anos, era engenheiro-mecânico, doutor pelo Departamento de Sistemas Digitais da Poli-USP e gerente de informática do Instituto de Pesquisas Nucleares daquela universidade. Adorava aviões e mecânica. Estava indo ao Rio dar palestra no Hotel Glória, sobre um projeto nuclear brasileiro, o do submarino atômico. Quem leu o livro "O voo não terminou" dele recebido e psicografado por sua mãe dois, minha mulher, Yvette Pinheiro de Araújo, a "rainha da Fada" como era apresentada ao microfone da Rádio Prudente, sabe que o Flavio teve muito trabalho na terça-feira com seu grupo socorrista que libertou os que se foram com a queda do voo da Chapecoense. Quem não quiser acreditar o arbítrio é livre. O que não impede que o futebol esteja de luto. Ah, ainda em tempo: "Avião não cai. É derrubado", como dizia o Borginho.
Flávio Araújo, jornalista e radialista prudentino escreve aos domingos neste espaço.