Caipira esperto

Sandro Villar

O Espadachim, um cronista contra a tormenta e o tormento

CRÔNICA - Sandro Villar

Data 08/09/2024
Horário 05:30

Dono de um sítio perto da cidade, o seu Miguelzinho vivia às turras com os moleques que furtavam frutas do seu pomar. Os guris, moradores da cidade, também matavam passarinhos com seus estilingues. Além de matar as avezinhas, como rolinhas, a molecada pegava - ou passava a mão pequena - em abacates, bananas e laranjas. Em suma: eram ladrõezinhos mesmo. 
Os furtos davam prejuízo, já que o seu Miguelzinho vendia a produção para feirantes e quitandas. Um belo dia, depois de uma bela noite, ele resolveu tomar uma atitude, pois estava irritado com o prejuízo. Foi à cidade para conversar com os pais dos moleques.
Passou um "sabão", quer dizer, sermão nos pais e ameaçou represálias contra os ladrõezinhos. "Vou comprar uma espingarda de chumbinho, atiro no traseiro do moleque que furtar minhas frutas", falou grosso, enfim, subiu nas tamancas. Ficou uma onça e por pouco não saiu no tapa com um dos pais, que não gostou da admoestação do sitiante. 
A bronca e a reclamação valeram a pena. Surtiram efeito, a molecada ladra sentiu a barra pesada e, assim, preferiu ficar mais tempo na escola do que furtar frutas e matar passarinhos no sítio de um capiau que não estava para brincadeiras. 
Além de produzir frutas, o seu Miguelzinho tinha gado da raça nelore. Era um rebanho respeitável, entre vacas, touros, bois e bezerros. Valia uma boa grana, mas ele esperava uma melhora no preço da arroba do boi para vender alguns animais. Mesmo com pouco dinheiro o nosso ilustre resolveu fazer melhorias no sítio. A construção de um curral mais ajeitado estava em seus planos.
O que fazer? Um amigo sugeriu um empréstimo no banco. "Vai lá na cidade e conversa com o gerente", orientou um sitiante, vizinho dele. Seu Miguelzinho gostou da sugestão, vestiu uma roupinha mais ajeitada, botou um chapelão na cabeça e foi falar com o gerente, que era um sujeito esnobe e cheio de "não me toques". 
Ao entrar no banco, o sitiante deu de cara com o gerente. Seu Miguelzinho explicou que estava ali para pegar um dinheiro emprestado mesmo com os juros a 10,5% ao ano, obra do Bob Fields Neto. "Não se "apreocupe", tenho gado "anelore" e dou como garantia", contou.
Ao ouvir os erros de português do sitiante, o gerente começou a mangar dele. "Seu Miguelzinho, não é "anelore". É nelore", explicou o gerente. Acontece que o sitiante não se abalou com a grosseria do gerente e, tirando o chapéu para coçar a cabeça, mandou ver: "De que adianta o sinhô falar bonito se não "pissói", falou o seu Miguelzinho. Quer dizer: não "pissói" (possui) gado nelore e não passa de um gerentezinho de banco.     

DROPS 

Inconformado com o fracasso musical, o cantor se enforcou com as cordas vocais.

Quem não ama tem um drama.

Bebo para afogar as mágoas, mas não adianta. Elas sabem nadar.
(Jésus Rocha, humorista)

O ser humano não deu certo.
(Millôr Fernandes)

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