Café de Preto debate o empreendedorismo feminino preto

Histórias e narrativas de superação são temas do IV Festival de Ocupação Preta da FCT

VARIEDADES - DA REDAÇÃO

Data 10/11/2024
Horário 05:08
Foto: Cedida
Ivonete Alves
Ivonete Alves

Resiliência, talento e coragem: essas são algumas das qualidades que unem as convidadas do Café de Preto voltado à temática “Empreendedorismo das mulheres pretas: ganhadeiras”, que será realizado no dia 13 de novembro, no Auditório Discente 5, durante o IV Festival de Ocupação Preta na FCT Unesp. Mais de 200 pessoas são esperadas para participarem da ação, organizada pelo coletivo de estudantes e professores vinculado ao Nupe (Núcleo Negro da Unesp para Pesquisa e Extensão) da FCT.
Segundo Valquiria Freitas, graduanda em Geografia e membro da comissão organizadora, o objetivo do Café de Preto gira em torno do tema do festival "A história de um é a narrativa de todos", em que os participantes irão ouvir a história de empreendedorismo das mulheres negras em Presidente Prudente, seus desafios, suas vitórias, além de mostrar seus produtos. “O espaço também terá a mostra de produtos de outros empreendedores, como o de Bernard Oliveira, tatuador e aluno do curso de Geografia pela FCT. Ao final, finalizaremos com um café comunitário que acontece uma vez ao mês, no qual nos aquilombamos e socializamos”, frisa.
Durante o evento, as convidadas Brenda Silva Gonçalves, Darlene Gonçalves dos Santos, Ivonete Alves e Gabriela Alves Vieira irão compartilhar suas lutas e conquistas e mostrar a importância do empreendedorismo feminino preto na sociedade contemporânea. 


Brenda Silva Gonçalves


Darlene Gonçalves dos Santos

Começo de tudo 
Darlene trabalha como copeira do Hospital Regional de Presidente Prudente e é dona da loja de roupas fitness Darly Fit Store. Para ela, o empreendedorismo sempre foi um desejo de muito tempo, até que, em uma conversa com uma amiga, decidiu dar início nesse sonho. “Eu queria alguma coisa que elevasse as pessoas. Então, a minha amiga falou assim: ‘vamos comigo viajar? Eu te vejo uma grande empreendedora, você está sempre incentivando as pessoas’. Foi aí que decidi arriscar, já que se estamos na chuva, vamos nos molhar. E aí começou”.


Além disso, ela explica que o incentivo para começar o próprio negócio se dá pelo seu processo de emagrecimento, em que tinha dificuldades em encontrar roupas do seu tamanho. “A partir disso, as outras pessoas que me viam com roupas bonitas e diferentes no meu processo de emagrecimento, sempre perguntavam ‘onde você achou?’, e aí eu falava ‘calma aí que eu vou trazer para você também’. Então, isso me motivou ainda mais”, conta Darlene. 

 


Para Ivonete, artesã e coordenadora do grupo Mocambo Nzinga, a história é um pouco diferente. “Eu não me considero uma empreendedora. Eu sou uma mulher preta que trabalha com afrocentricidade, na qual temos que pensar na questão da geração de renda e na riqueza geracional, ou seja, a gente acumula bens materiais e imateriais para as próximas gerações, o que é muito diferente do que a sociedade capitalista chama de empreendedorismo”.
Ela explica que essa opção de trabalhar com a afrocentricidade dá uma liberdade de atuação por conhecer a cultura africana e afro-brasileira há muito tempo, sendo um tema em que pesquisa e estuda, havendo também um aporte científico sustentável. “Eu fiz um programa de trabalho de ir ao Museu Afro-Brasil quatro vezes ao ano quando eu comecei a pesquisar a cultura afro-brasileira e africana. E essas visitas me deram condição de fazer uma discussão com os artistas que estavam inaugurando exposição lá, com o acervo do próprio museu e com o acervo da Biblioteca Carolina Maria de Jesus, em São Paulo”, diz Ivonete.
A história da Brenda com o empreendedorismo começou ainda na adolescência. Hoje ela tem o seu próprio negócio, o espaço Brenda Gonçalves – Saúde e Beleza. Sobre o início de sua trajetória, ela conta que começou a empreender. “Eu comecei com 11 anos fazendo algumas unhas e cabelos. Aos 12, entrei para trabalhar em um salão de beleza no meu primeiro emprego. Desde então, sempre me imaginei sendo dona de um salão bem chique”.
Já Gabriela é proprietária do Espaço Gaby Tranças, e começou na área ao ver a mãe colocar Box Braids em seu cabelo. “Depois disso, eu me apaixonei pelas tranças nagô, então, pedi para a minha mãe tentar fazer em mim, mas ela não conseguiu. Foi aí que eu pesquisei no YouTube e comecei a tentar fazer tranças no meu próprio cabelo e me apaixonei”, conta com orgulho. 


Gabriela Alves Vieira


Desafios enfrentados
“O principal desafio que a gente, como mulher preta, enfrenta numa cidade racista, coronelista e com pensamento feudal e escravocrata, que perdura aqui em Presidente Prudente, é de fato a questão do racismo, mas principalmente o racismo institucional, em que temos que lidar com instituições racistas que escondem o seu racismo por baixo de várias outras situações. Situações essas que impedem que as pessoas negras, mesmo que tenham uma formação, entrem nas instituições. Então, isso é uma coisa muito complicada de lidar. É um desafio enorme essa luta política que a gente tem”, explica Ivonete.

 


Segundo Darlene, o maior desafio enfrentado foi o processo de conquista da credibilidade com os clientes. “Eu vendia de porta em porta com as malas. E as pessoas falavam ‘mas o seu produto é bom mesmo? Não é aquele que rasga e estraga?’. Primeiro colocavam um monte de defeito, sem nem ao menos verem o produto direito. No começo, foi bem difícil conseguir gerar renda, mas hoje, além do trabalho do meu marido, o que mantém mais a minha família são as vendas da loja”, pontua.

 


Brenda revela que ser aceita pela sociedade foi um dos grandes obstáculos no início da carreira profissional. “Os maiores desafios, primeiramente, foram ser aceita pela sociedade. Sempre houve julgamentos de que você não será capaz ou que não é profissional o suficiente, além de desrespeito de algumas pessoas e até piadas de mau gosto”.


Contribuição, resistência e conselhos
Gabriela conta que “o momento mais marcante em sua carreira profissional foi quando uma cliente vibrou e chorou ao finalizar as tranças. Eu percebi o quanto elas são importantes para nós. As mulheres pretas empreendedoras são fortes, pois fazemos o nosso melhor, independentemente das opiniões preconceituosas. Nó nos indicamos umas às outras para sempre nos fortalecermos sem concorrência.” A trancista, ainda traz um conselho: “Tenha persistência, uma hora vão precisar de você, esteja ali para dar o seu melhor. Seja o seu maior incentivador e não desista, o sol brilha para todas”.
Darlene acredita que o seu negócio é uma forma de incentivo para a comunidade preta, em que as mulheres podem e devem fazer o que sabem e sonham. “Um dos momentos mais marcantes para mim, como empreendedora, foi conseguir mudar de casa e ajudar a minha família também. Além disso, ver os meus filhos crescendo com uma qualidade de vida muito melhor e querendo empreender também é um dos bem mais marcantes da minha trajetória”.


E para as mulheres que desejam empreender no futuro, ela conta alguns conselhos que a ajudaram em sua vida profissional e pessoal. “Por mais difícil que seja, não desista, vai aparecer um caminho diferente. Para nós, mulheres pretas, qualquer caminho é difícil. Você tem que se posicionar de uma madeira que você imponha em respeito sem intimidar as pessoas. Então, o meu conselho é que, mesmo com os obstáculos, comentários maldosos e com pessoas sempre desvalorizando a gente, temos que ser sempre melhores que eles”, completa Darlene.


Ao falar sobre como o empreendedorismo mudou a sua vida e a de sua família, Brenda destaca o impacto positivo que essa escolha trouxe: “O empreendedorismo deu a mim e à minha família outra realidade para viver, tanto no âmbito pessoal como no profissional, uma vida acessível e tempo de qualidade, o que muitas vezes é difícil para nós”.
Para aquelas que pensam em seguir esse caminho, ela tem uma mensagem encorajadora: “Não desista. Mesmo que pareça impossível passar por todos os obstáculos e desafios confiando que tudo dará certo, no final, realmente dá. Persistir sempre e se reerguer toda vez que achar que não é capaz”.
Ivonete destaca a fragilidade da rede de mulheres, explicando que o excesso de trabalho e a falta de tempo para autocuidado e reflexão cuidadosa dificultam o planejamento e fortalecimento de ações futuras. “Essa enormidade de atividades e de trabalho que a gente possui fragiliza as nossas ações, mas os encontros e as ações do mês da Consciência Negra também nos fortalecem e contribuem para pensarmos em uma proposta coletiva”, finaliza a artesã.

Serviço
O Café de Preto voltado à temática “Empreendedorismo das Mulheres Pretas” será realizado no dia 13 de novembro, das 16h30 às 18h30, no Auditório da FCT Unesp. O evento é gratuito.
Para conhecer a programação completa do IV Festival de Ocupação Preta acesse https://www.fct.unesp.br/#!/extensao/nupe/iv-festival-ocupacao-preta/programacao-festival/.

 

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