Em meio a dados alarmantes – mais de 7,5 milhões de acidentes de trabalho registrados no Brasil na última década –, o Abril Verde surge como um movimento crucial para mudar essa realidade. Em entrevista exclusiva, Régis Nieddu, juiz do Trabalho substituto do TRT (Tribunal Regional do Trabalho) da 15ª Região (Presidente Prudente), fala sobre os desafios da segurança no trabalho, o avanço de doenças ocupacionais e o papel transformador da Justiça Laboral na promoção de ambientes saudáveis.
Com experiência em casos que envolvem desde lesões físicas até transtornos mentais relacionados ao trabalho, o magistrado reforça: “Prevenção não é custo, é investimento. E a responsabilidade é compartilhada entre empresas, trabalhadores e poder público”. Na conversa, ele também aborda iniciativas como o Programa Trabalho Seguro, o simbolismo da iluminação verde em prédios públicos e como tecnologia e educação podem ser aliadas na redução de riscos.
Dr. Régis, qual a importância do Abril Verde para o mundo do trabalho e para a sociedade como um todo?
O Abril Verde é um marco essencial para fomentar a conscientização coletiva sobre saúde e segurança no trabalho. No dia 28 de abril, comemoramos o Dia Mundial da Segurança e Saúde no Trabalho. Trata-se de um momento simbólico de reflexão, mas também de ação e mobilização. Os números são alarmantes: de acordo com a Previdência Social, entre 2012 e 2022, foram notificados 7.506.055 acidentes de trabalho, com mais de 25 mil mortes no período. Portanto, mais do que uma campanha, o Abril Verde é um chamado à responsabilidade social, empresarial e institucional.
Como o Poder Judiciário Trabalhista tem contribuído para a conscientização sobre saúde e segurança no trabalho?
A Justiça do Trabalho tem um papel que transcende a solução de conflitos. Somos agentes promotores da cultura da prevenção. O Programa Trabalho Seguro, coordenado nacionalmente pelo TST (Tribunal Superior do Trabalho), é um exemplo vivo disso. Ele busca enraizar práticas seguras nas empresas com ações educativas, campanhas de conscientização e estímulo ao diálogo entre instituições.
Sabemos que neste ano prédios públicos como o do TRT e monumentos ganharam iluminação verde. Qual é o simbolismo dessa ação?
A iluminação verde é um gesto simbólico, mas carregado de significado. Representa a esperança de ambientes laborais mais seguros, saudáveis e humanos. Iluminar nossos prédios públicos é, acima de tudo, uma forma de comunicar à população que essa pauta é prioritária.
“Muitos acidentes e doenças
ocupacionais sequer chegam
ao conhecimento das autoridades”
Na sua visão, quais são os maiores desafios enfrentados atualmente quando falamos de segurança no ambiente de trabalho?
O primeiro grande desafio é a subnotificação. Muitos acidentes e doenças ocupacionais sequer chegam ao conhecimento das autoridades. Em segundo lugar, há a persistência de culturas organizacionais que negligenciam a prevenção. Por fim, há um déficit na integração entre as áreas de saúde, segurança, gestão e RH (Recursos Humanos) nas empresas.
Os transtornos mentais e psicossociais vêm crescendo como causas de afastamentos. Como a Justiça do Trabalho enxerga esse cenário?
Estamos diante de um novo perfil de adoecimento que pode estar relacionado ao trabalho. Há casos em que transtornos mentais, como depressão e ansiedade, podem estar ligados a práticas organizacionais abusivas, jornadas exaustivas e assédio moral. A Justiça do Trabalho e o MPT (Ministério Público do Trabalho) têm destinado especial atenção a essas questões, garantindo, quando necessário, a reparação correspondente ao dano.
“Vamos juntos construir
ambientes onde a vida
seja prioridade”
Qual a importância de uma cultura organizacional voltada à prevenção de acidentes?
Muito além de cumprir normas, prevenção precisa estar na cultura da empresa, nos seus valores e práticas diárias. Isso inclui desde o treinamento de lideranças até a escuta ativa dos trabalhadores. Uma cultura de prevenção envolve transparência, respeito e empatia.
O senhor acredita que as novas tecnologias e a inteligência artificial podem ajudar no monitoramento e prevenção de riscos no trabalho?
Sem dúvida. Hoje, já existem softwares capazes de monitorar condições ergonômicas e antecipar riscos. A inteligência artificial pode ser uma aliada poderosa, desde que esteja a serviço da dignidade humana, preservando o direito à privacidade e à desconexão.
Qual mensagem o senhor deixa aos empregadores, trabalhadores e estudantes sobre a importância do Abril Verde?
O Abril Verde é um convite à reflexão e à ação. Aos empregadores: prevenir é investir no seu maior patrimônio, que é o ser humano. Aos trabalhadores: conhecer seus deveres e direitos é o primeiro passo para a dignidade do trabalho. E aos estudantes: saúde e segurança no trabalho são a base de uma sociedade justa e sustentável. Vamos juntos construir ambientes onde a vida seja prioridade.