Recentemente ao entrar em uma loja após a eliminação do Brasil na Copa pela Croácia, ouvi a conversa entre a gerente da loja e uma das vendedoras. A gerente dizia algo do tipo “como brasileira eu estou triste, mas como gerente estou feliz, pois a loja não pode ficar fechando tanto tempo assim em época de final de ano”. A funcionária então respondeu “mas veja, se o Brasil ganha, as pessoas vão ficar felizes e vão gastar mais”. Perceba que tanto na lógica da gerente quanto na da funcionária, o que manda é o volume de vendas. E a satisfação de ver o Brasil ganhar? E a alegria em comemorar um título tão desejado? Nada importa. O que prevalece no argumento é se a loja vai lucrar mais ou menos. Esse caso ilustra um pouco de como a dimensão econômica invade todas as relações da nossa vida. Tudo é pensado e calculado pensando no dinheiro. Pouco importa o prazer, a satisfação, a alegria. O dinheiro é o prazer, a satisfação e a alegria.
Outro caso que nos ajuda e perceber a cooptação do dinheiro sobre nossas vidas. Há poucas semanas fui convidado a participar como palestrante em um congresso internacional da área de educação em São Paulo. O evento contava com grandes nomes da educação nacional, além da presença de palestrantes da Espanha, Portugal, Canadá e Inglaterra. Para alguém que fez sua carreira acadêmica e profissional em Presidente Prudente, interior paulista, não é pouca coisa. Mas tinha um detalhe, o evento não me pagaria nenhum pró labore. Nem mesmo o deslocamento até a cidade. Apenas minhas refeições no local e a inscrição para a participação. Para mim esse fato não foi nenhum impeditivo. Palestrar em um congresso desse porte já era grande feito. Contudo percebi o espanto de alguns quando eu dizia que não recebi nada para estar lá. A pergunta que muito faziam era “e eles pagaram quanto para você ir?”. Não me perguntavam se eu estava feliz, orgulhoso, se eu via isso como uma conquista, nada disso, a primeira pergunta era sempre quanto eu iria receber.
Não se trata aqui de querer demonizar o dinheiro e as relações econômicas. Precisamos deles todos os dias. Mas há um limite entre o confortável e o luxuoso e outro entre o luxuoso e a ostentação. Todos nós queremos e deveríamos poder nos alimentar bem, ter uma casa aconchegante, um meio de transporte eficiente e um emprego digno. Tudo isso custa dinheiro e seria muito bom que todos nós tivéssemos acesso a ele. O problema é quando resumimos nossa vida a isso. Quando toda conversa gira em torno do “quanto custou” e do “quanto ganhei”. O problema é quando nos tornamos escravos do trabalho para termos mercadorias. Problema maior ainda para aqueles que trabalham e não conseguem ter acesso devido ao baixíssimo salário, ou aqueles que nem trabalho tem.
Veja o caso que estamos vivendo agora também em nosso cenário político. Havia um grande “frisson” sobre o ministro que seria escolhido para área econômica. Para cada nome que era ventilado, cogitado, “os mercados” se agitavam, a bolsa caía, o dólar subia, as pessoas tiravam dinheiro do banco, repensavam investimentos. Perceba que quase nada se discute sobre o ministro da Educação. O mesmo vale para o ministro da Saúde. Isso para ficar em duas áreas que são essenciais para o crescimento de qualquer nação, mas para todas as áreas a lógica é a mesma, turismo, cultura, direitos humanos e por aí vai. Os nomes quando anunciados passam quase desapercebidos. A preocupação maior é sempre os nomes da área econômica. Como se tudo se resumisse ao dinheiro.
Infelizmente é nessa lógica financeira que pensamos no nosso dia a dia. Quando dizemos “olha, o sujeito está bem de vida” estamos geralmente nos referindo ao lado financeiro. Será que a saúde física desse sujeito está boa? E a saúde mental? Seu relacionamento com os outros, seu papel na sociedade, sua criticidade, como anda? Poucos querem saber. Muitas vezes nem o próprio sujeito não quer saber. Sei que nada disso que escrevo é novo, mas é preciso refletir e falar sobre. Contudo, o primeiro passo para a mudança é tomar consciência da situação. Que possamos pensar a partir de uma perspectiva mais humanizadora e menos mercadológica. Estou mais interessado em saber quem será o ministro da Educação que o da Economia.