Todas as casas comerciais de secos e molhados, de pequeno ou médio porte, para a população, denominavam-se venda, sinônimo, hoje, de armazém. A Vila Marcondes pode-se orgulhar de ter tido as melhores vendas da região. A rua Quintino Bocaiúva era um rosário de vendas, desde a Praça N. S. Aparecida, até onde, hoje, fica o Ginásio Tanel Abbud. Portugueses, espanhóis, italianos e japoneses ali se instalaram, sem contar os brasileiros de todos os quadrantes da pátria. Vendeiro, por vocação e ofício, era o português. A lida com mantimentos e latarias, o peso de quilos e arrobas, nas balanças manuais, davam ao lusitano o símbolo de comerciante vendeiro. Partira ele do pequeno Portugal, para si estreito e medieval, em busca de horizontes amplos e prósperos. Sabia que nada seria fácil. Mas sua alma nutria o esforço para derrotar perigos e guerras. Qual Camões, recorria às Tágides, para inspirar-se da fé, e estampava, na cruz das caravelas, a sua alma cristianíssima. Não faltaram feitos lusos, para criar esperança. A epopeia “Os Lusíadas” concentrava os ensinamentos. África, Índia e América do Sul abriam seus portos. Preciso era embarcar com vento e mar tranquilo. E quantos portugueses deixaram a terra natal, reforçando a inspiração de Pessoa: “Ó mar salgado, quanto do teu sal / São lágrimas de Portugal!”. Aqui, em Presidente Prudente, os bairros da Jacutinga e Sete Copas podem narrar histórias da gente portuguesa, porquanto abrigaram inúmeras famílias e grande número de jovens portugueses, que foram atraídos pelo sonho do novo El-Dourado. Deles, contam-se histórias e cada um tem a sua novela a narrar. Antônio Ferreira, com dezessete anos, deixou Portugal. Em 1928, esteve no Rio de Janeiro, trabalhando duro, no comércio de importação e exportação, em empresas de seus patrícios. Passando por São Paulo, ouviu a fama de Presidente Prudente. Para ele, trabalho se juntava a aventuras e prosperidade. Prudente foi-lhe o destino. Imediatamente partiu para o fronte de batalha, para Jacutinga e Sete Copas, bairros inflados de riqueza. Venda do Sr. Ferreira, Vila Marcondes 74 Ao desmatar essa região prudentina, ganhava-se dinheiro serrando e tirando toras. Destas se faziam dormentes para a Estrada de Ferro Sorocabana, que pagava muitíssimo bem. Era o novo serviço de Antônio Ferreira. Com a poupança amealhada, abriu sua venda na Quintino Bocaiúva. Era o que gostava de fazer. Pesar e vender a varejo e servir aos fregueses. O negócio cresceu. Uniu-se, a seguir, ao Kurozawa, aos Antônio e Frederico Kuhn, a Paulo Alfaro, a Alexandre Techio Neto e ao João Molina e formaram uma sociedade comercial, a Socomali. Dedicavam-se especialmente a vendas no atacado. Tempos depois, resolveu continuar sozinho, com um armazém do seu gosto. Foi quando adquiriu a venda do Manoel Cabrera, também situada na Quintino, 1086. Somente, em 1953, passou a estabelecer-se em prédio próprio, comprado do Alexandre Zamberlam, na Quintino Bocaiúva, 1104, com a firma individual, “Casa Ferreira”, ajudado pelos filhos, no mesmo local onde se encontra hoje. A Casa Ferreira ficava num ponto estratégico, na Quintino. Em frente, começava a Travessa Anderson Clayton, por onde passavam os trilhos da E.F.S. Dos lados, datas vazias. Aos poucos, o Mário Gracco, gerente da Cia. Saad do Brasil, construiu o Posto Júnior. O movimento dobrou. Nesse cruzamento de ruas, nos tempos de seca, a poeira amarelava o ar; nos de chuva, o barro atolava jipes e carroças. Com muito custo, o Prefeito Furquim continou o calçamento da Quintino, com paralelepípedos, deixando o local espaçoso e limpo. Em sua venda, o Sr. Antônio Ferreira foi vendo o tempo passar. O progresso trazia modernidade nos usos e costumes. O movimento das vendas caía e elas iam fechando, à medida que o pasto espantava, para longe, a lavoura; e a E.F.S. mudava de nome para Fepasa. Os trens já não circulavam dia e noite. As firmas algodoeiras fechavam suas portas. Surgiram, para lá de sua venda, escolas. Primeiro, o Ginásio Tanel Abbud; depois a Instituição Toledo de Ensino; e, finalmente, o complexo educacional do Sesi. Somente a Casa Ferreira resistiu, compartilhando, isolada, com os velhos moradores do bairro, a saudade dos tempos de riqueza das lavouras prudentinas.