A “Sua majestade o bebê” e o seu prazo de validade

A expressão “Sua majestade o bebê” é uma referência de Freud para situar a criança, seu lugar e seu valor na estrutura familiar. Em seu texto, Introdução ao Narcisismo (1914), diz assim, “Quando vemos a atitude terna de muitos pais para com os seus filhos, temos de reconhecê-la como revivescência e reprodução do seu próprio narcisismo há muito abandonado”. 
Nós pais, temos e sentimos um amor pelos filhos que muitas vezes, desconhecemos como defini-lo ou mensurá-lo. O cuidado dispensado a eles é muito grande. Desfocamos de nós mesmos, tornando-os protagonistas ou figuras centrais no palco familiar. Ainda em Freud (1914), “As coisas devem ser melhores para a criança do que foram para seus pais, ela não deve estar sujeita às necessidades que reconhecemos como dominantes na vida”. 
Doença, morte, renúncia à fruição, restrição da própria vontade não devem vigorar para a criança, tanto as leis da natureza como as da sociedade serão revogadas para ela, que novamente será centro e âmago da Criação. “Sua majestade o bebê, como outrora nós mesmos nos imaginávamos”. No tapete da contemporaneidade ainda assistimos uma repetição frequente, em que a frustração não fará parte das experiências do dia a dia das crianças. Tolerar o intolerável, jamais. Nesse mesmo tapete tem o reverso desse fato. 
Versamos sobre o tão importante valor que os limites, a dificuldade e frustrações têm e são para o crescimento e fortalecimento mental da criança. O ideal é que a “Sua majestade o bebê” rompa logo o seu cordão umbilical e que seus pais também rompam antes mesmo, do nascimento deles. Sabe aquele jargão: “Vocês sabem com quem estão falando?”, ainda está muito em moda, acredite se quiser. Ainda em Freud (1914), complementando, “Os pais são levados a atribuir à criança todas as perfeições - que um observador neutro nelas não encontraria - e a ocultar e esquecer todos os defeitos, algo que se relaciona, aliás, com a negação da sexualidade infantil”. 
Penso agora, com a experiência de ser avó, que também repetimos da mesma forma com nossos netos. Eles são considerados por nós e sentem-se como se fossem His Majesty the Baby. Minha observação é que, dentro do âmbito familiar são mesmo, mas, fora, não. Até mesmo as crianças em tenra infância sofrem agressões físicas, como mordidas, arranhões, beliscões e empurrões entre eles mesmos. Os filhos são cidadãos do mundo. E os netos também. O mundo frustra e gratifica constantemente, assim como o oceano, em sua turbulência e calmaria. Essa temporada, considerada “Sua majestade o bebê”, tem prazo de validade, pois quem sofrerá lá fora serão eles mesmos, pelo grande despreparo e incapacidade em lidar com os “nãos”.
 

Publicidade

Veja também