A escuta da dor do câncer

OPINIÃO - Cristiane Mezas Madeira

Data 29/10/2019
Horário 04:16

Um corpo que dói, para a medicina, é um sinal do corpo que algo em si não está em seu pleno funcionamento. Frente ao câncer, o sujeito se encontra com um corpo que sofre dores, advertindo com isso, suas limitações, fragilidades e finitude. Assim, a dor do corpo notifica o sujeito.

Diversas são as dores que a mulher com câncer de mama passa desde o diagnóstico ao fim do seu tratamento, uma vez que várias perdas se colocam ao longo de toda sua travessia pela doença. Diante disso, se faz necessário o entendimento sobre natureza e função das dinâmicas relativas à dor e ao sofrimento na vida do sujeito, desde a perspectiva de seu desenvolvimento, levando em conta suas questões de representatividade dessa vivência para ele mesmo e àqueles com o qual convive.

O corpo, do ponto de vista psicanalítico, não é um corpo de carne composto de agrupamentos de células, como é para medicina

Na medicina, se trabalha pela cura do corpo doente, na busca pela reconstrução de um corpo saudável. Inicia-se uma “luta contra o câncer”. Já a psicanálise é a teoria que mais responde à dor e ao sofrimento do indivíduo. Ela nasceu a partir do momento em que Freud interroga os caminhos que conduzem os embates psíquicos a surgirem no campo somático; com isso, funda uma clínica, cria um aparelho teórico que permite a ele entender as diferenças entre as manifestações corporais e psíquicas.

O corpo, do ponto de vista psicanalítico, não é um corpo de carne composto de agrupamentos de células, como é para medicina. É um corpo construído através da interação com entes parentais, produzido pela linguagem e pela exigência contínua de satisfação pulsional; assim, a relação com o corpo estará submetida, como cada um se relaciona com seu próprio corpo.

A aposta da psicanálise de um tratamento do real pelo simbólico, isto é, pela palavra. Na medida em que fala, o sujeito pode advir na criação de uma saída do que se apresenta como excesso, impossível de apreender. Citando o psicanalista lacaniano Antonio Quinet, “a psicanálise oferece ao sujeito um tratamento pela via do desejo que possibilita o sujeito ir da dor de existir à alegria de viver”. 

 

 

 

 

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