A escrita como exercício semanal, como a que realizo, nessa coluna, tem lá seus desafios. O maior deles, certamente, é ter assunto substancial, capaz de compor os 3 mil caracteres a que tenho direito. Complementarmente, é preciso uma boa dose de criação, mobilização de ideias e boas citações. Veja lá, meu assunto de hoje é a falta dele.
Poderia, muito bem, comentar uma dessas questões do noticiário local, nacional ou global. Me recuso, não por alienação, que não pratico, mas por falta de disposição em opinar sobre isso ou aquilo. Alienação política, podem afirmar, mas ninguém sabe o se passa no íntimo do colunista, nem mesmo quando, aparentemente, as questões são abordadas com certo ar de posicionamento. Isso é dialética, dizer e desdizer-se para não falar o que se quer.
Penso mesmo é nisso, no exercício da escrita, na beleza da composição humana das frases e parágrafos, orquestrados pela razão que se projeta aqui, timidamente, no texto. A escrita não nasceu nobre, embora seja, a mais elevada realização humana. Nasceu para registrar a cobrança de impostos, nas mãos de funcionários públicos, burocratas que cobravam os soldos dos Estados na antiguidade.
Chegamos longe com a escrita, da filosofia à arte literária, passando pela ciência e pela burocracia do direito. Gosto mesmo é da literatura, dos romances da literatura clássica. Dostoievski ditava seus livros à esposa, que escrevia freneticamente seguindo o raciocínio do gênio literário. Kafka escondia seus textos e muitos deles vieram à luz após sua morte. Mann escreveu romance de quase mil páginas, Tolstói fez o mesmo, Joyce também. São vidas inteiras ali, nos textos.
Penso nisso às vezes, são apenas palavras colocadas em certa ordem, nada mais. Ao ler um texto escrito por inteligência artificial, sinto certo desconforto, existe algo de metálico na organização das palavras, uma certa frieza de um texto sem alma, frio e calculista. A escrita só pode ser humana. Daí que o grande tema da literatura clássica e universal é a humanidade na sua inteireza e complexidade.
Esse é o grande tema da escrita, a vida. Afinal, para uma questão insondável como esta, me parece pouco todas as páginas escritas pela razão humana. Se continuar a seguir essa linha, quem sabe não consigo ao menos entender a que serve à arte da escrita. Viver é escrever a nós mesmos, como sujeitos da nossa história para a qual a existência nos cobra a responsabilidade de decidir o que fazer diante dela.
Por isso, quando crescer, quero ser escritor. Sim, me sinto pequeno ainda e talvez, é preciso dizer, nunca alcance objetivo tão elevado e nobre. Não me sinto, esteticamente capaz, ainda. Me faltam a composição harmônica, a beleza da composição e a genialidade do tema. Não sei contar histórias e talvez não tenha nenhuma a contar.
Não sou, mas quero ser. Enquanto isso, sigo brincando com as palavras, colocando uma aqui e outra ali, procurando a linguagem que se pareça ser a minha. O vazio do tema esconde a grandeza da escrita como exercício da alma para encontrar a si mesma.