Não há muito, já dizia Paulo Freire: a educação é um ato de amor, por isso, um ato de coragem. E é com muita coragem que nós, professores, enfrentamos o mundo dentro de uma sala de aula. Um encontro entre gerações que visa alcançar um mesmo objetivo – o conhecimento –, perseguido, às vezes, em caminhos sinuosos. Diante da cultura do cancelamento, até onde poderá o professor proporcionar debates sinceros sobre a realidade em que vivemos perante uma sala de aula? Devemos utilizar uma trava que, ao deixarmos a zona de conforto do nosso conteúdo, seria acionada? Continuar com uma educação tecnicista é a solução?
São várias as perguntas, e o leitor pode achar isso banal, mas é algo que passa todo dia pela cabeça de um professor. Perguntas para as quais não temos as respostas corretas – e já sabe, não é? Um professor não aguenta ficar sem dar uma resposta. E aqui seguimos nessas indagações e discussões periódicas, a fim de alcançar a melhor forma de fornecermos uma educação de qualidade. Sim, é essa a preocupação – não é só sobre salários dignos para professores de escolas públicas, nem sobre as condições precárias de trabalho que muitos enfrentam. Todas essas questões estão associadas à vontade de promover a boa educação, pois sabemos que ela move o mundo.
E queremos muito que ele se mova. No passar dos anos, pude ver, em cadeira cativa, a evolução dos valores e da liberdade. Desde que iniciei a carreira docente, observei mudanças que não poderiam ser percebidas a partir da cadeira de um escritório. Vi meus alunos ganharem liberdade, ganharem voz e, muitos deles, dignidade. Não que a dignidade não seja inerente ao ser – mas eles sentiram-se dignos, e nada é melhor do que identificar em uma pessoa a felicidade genuína. Sinto-me honrada. E retomo aqui a discussão: até onde podemos debater com nossos alunos os assuntos que fogem à nossa alçada técnica?
Entre o “olá” e o “até mais”, vemos, em cada rosto, uma história que não pode ser deixada de lado. Valorizar o conhecimento prévio do aluno já não é mais um ideal pedagógico – é uma realidade. Assim, ignorar questões sobre as “fobias (anti) sociais” não é o caminho. E é nesse ponto que entra a afetividade – até onde posso aprofundar essas discussões? Até o momento em que seja possível identificar a dor e, ali, tentar amenizá-la. Só para contextualizar, sou engenheira. A pergunta que constantemente ouço (ou entrevejo em olhares) é sobre o machismo presente em nossa área. Constata-se: ele existe. Como não discutir isso?
Diante dos vários transtornos fóbicos enfrentados diariamente, a sala de aula permite que determinados assuntos sejam debatidos, os quais, fora dela, não seriam, provavelmente, tratados em segurança. Assim, com afetividade, podemos, sim, trabalhar competências que vão além de uma figuração em “Tempos Modernos”. É dentro da sala de aula que podemos falar, discutir, questionar... transformar. Ainda bem que temos essa oportunidade entre um cálculo e outro. É sobre sentirmo-nos seguros em ser o que somos. Criamos um mundo dentro da sala de aula – e ele me soa muito melhor.