A circularidade

OPINIÃO - Raul Borges Guimarães

Data 06/08/2023
Horário 05:00

Já tive oportunidade de contar para você a respeito da importância dos momentos que me encontro com os pés fincados nas terras do Primeiro de Maio, um dentre vários dos bairros rurais do município de Presidente Prudente. Ali eu tenho um certo convívio com o trabalhador simples do campo, em sua faina de sol a sol permeada por diversas formas de solidariedade, como o mutirão e a rede diversa de troca de favores entre vizinhos. É a devoção a um santo, a promoção de festas, leilões e bailes. Povos da oralidade. Povos da circularidade, como nos ensina o filósofo quilombola Nego Bispo: “A geração avó é o começo, a geração mãe é o meio e a geração neta é o começo de novo”. 
Bem, são essas vivências que me fazem reconectar com a minha ancestralidade que, certamente, guarda raízes lá das Gerais e dos sertões das caatingas. Sou essa mistura das veredas dos Buritizais, mas também da espreita do mundo debaixo da sombra do umbuzeiro ou de uma baraúna. A diversidade da vida da caatinga e do cerrado, com suas plantas alimentícias, plantas medicinais e forrageiras. 
Deve ser por tal motivo que me senti como se estivesse em casa na feira da economia solidária que visitei em Salvador, na Bahia. Que oportunidade de conhecer e apreciar variados produtos diretamente do sertão baiano, fruto das tradições que favorecem o consumo de produtos artesanais e cores étnicas! Tinha a deliciosa “umbuzada” com a polpa do fruto sem caroço no meio daquele creme de leite gelado. E o que dizer da famosa cajuína, com aquela sua peculiar cor amarela-âmbar resultante da caramelização dos açúcares naturais da própria fruta? Tinha também os licores de pitomba (fruta tão saborosa e frequente nos quintais do sertão afora, os passarinhos que digam). Fiquei impressionado com a ampliação dos usos do licuri, essa palmeira das caatingas que produz uma amêndoa, cujo óleo é muito usado na culinária, na preparação de doces, licores e do leite de licuri, uma especialidade da cozinha baiana! 
Enfim, é a economia solidária que gera uma vida melhor, não apenas pelos seus resultados econômicos, mas também pelo fortalecimento das relações familiares e de vizinhança, sem submissão à ordem alheia e fruto da escolha de formas de trabalho que reforçam as identidades comunitárias. Então, é a reinvenção da economia solidária pelas comunidades periféricas e marginalizadas do Brasil que tão bem estudou e apoiou o saudoso Paul Singer. Foi ele que disse: o importante não é saber aonde chegar, importante é a trajetória. 
 

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