O Carnaval é mais do que uma festa, é uma manifestação cultural profundamente enraizada na identidade brasileira e um dos poucos momentos do ano em que a cidade se transforma para acolher sua população de maneira democrática. A partir da perspectiva do direito à cidade, conceito cunhado por Henri Lefebvre (2001), o Carnaval de rua se torna um espaço de reivindicação social, permitindo que diferentes grupos ocupem o espaço público de forma festiva e legítima.
O direito à cidade vai além do simples acesso ao espaço urbano; ele implica no direito de transformá-lo, de ser parte ativa na construção de seus significados e usos. Conforme Varella (2021), o Carnaval de rua, especialmente em cidades como São Paulo, não é apenas uma questão cultural, mas também política urbanística, pois resiste a uma lógica privatista que, historicamente, restringiu a ocupação do espaço público.
A diversidade das expressões artísticas durante o Carnaval reflete a apropriação do espaço urbano por diferentes camadas sociais e culturais. Em Presidente Prudente, a festa aconteceu em diversos formatos. Durante o período carnavalesco, ocorreram desde cortejos populares, como o Arrastão do Frevo, promovido pelo Sesc Thermas, e o bloco ÊtaNóis, organizado pelo Ponto de Cultura Galpão da Lua, até eventos alternativos, como o Carnadrag, que valoriza a cultura drag e reforça a pluralidade da ocupação da cidade. Além disso, oficinas culturais, karaokês, apresentações de DJs no projeto Som de Preto, promovido pela Produtora de Cultura Popular Periférica Caixa Preta, e eventos infantis também fizeram parte da programação.
Um dos elementos mais marcantes da festa deste ano foi a retomada do Carnaval no Parque do Povo, “Pruden Folia”, organizado pela Secretaria de Cultura. O espaço público, que há anos não recebia uma celebração carnavalesca de grande porte, se consolidou como um dos principais polos festivos da cidade, recebendo mais de 20 mil foliões ao longo dos dias de festa. Apresentações de grupos locais que valorizam nossos artistas e animaram o público em um ambiente seguro e estruturado. Esse acerto não apenas garantiu o acesso da população a uma festa democrática, mas também o compromisso do poder público com a valorização do Carnaval como manifestação cultural e direito social (Portal Regional, 2025).
A importância do Carnaval como um evento que reafirma o direito à cidade também se reflete em sua capacidade de gerar economia, promover diversidade cultural e desafiar políticas urbanas excludentes. Os blocos de rua, frequentemente organizados de maneira autônoma, são um exemplo prático de como a população pode se apropriar do espaço público de maneira espontânea e autogerida. Essa ocupação reforça a necessidade de políticas públicas que garantam infraestrutura adequada, segurança e apoio institucional para manter a festividade acessível a todas as pessoas.
Contudo, há desafios que precisam ser superados. A gentrificação de certas áreas e a tentativa de mercantilização do Carnaval podem, paradoxalmente, afastar aqueles que historicamente construíram essa tradição. Além disso, a ausência de políticas públicas consistentes pode levar à precarização da festa e à sua transformação em um evento de acesso restrito.
Dessa forma, o Carnaval deve ser compreendido não apenas como um período de celebração, mas também como uma ferramenta para questionar e reivindicar políticas públicas mais inclusivas. A festa popular, ao ocupar as ruas, reforça a necessidade de uma cidade que pertença a todas as pessoas, independentemente de classe social, raça ou identidade cultural. O direito à cidade, portanto, não deve ser lembrado apenas no Carnaval, mas deve guiar o planejamento urbano e as políticas culturais durante todo o ano.