“Quem fica velho são eles”

OPINIÃO - Raul Borges Guimarães

Data 14/04/2024
Horário 05:17

Quem me acompanha semanalmente por aqui tem sido meu confidente acerca da paixão pelos livros. Tive a oportunidade de compartilhar meus hábitos de leitura, desde as obras de Monteiro Lobato - Reinações de Narizinho, Caçadas de Pedrinho, O Pica-pau Amarelo…. Um pouco mais adiante foi a vez de falar a respeito de Érico Veríssimo. Comentei as minhas impressões sobre “Olhai os lírios do campo”, “O retrato”, “Clarissa”, “Ana Terra”, “Música ao longe”, “Um lugar ao Sol"…. Lembrei do impacto que me provocou “Incidente em Antares”, que me abriu portas para um tipo de literatura mais dificil: o realismo fantástico. Daí foi um pulo para obras que me marcaram profundamente a juventude, especialmente Machado de Assis.
Não fiquei apenas nas obras literárias, mas também nos livros de grandes professores e intérpretes do Brasil, cujas obras teóricas beiram um bom romance. Eu coloquei no topo da minha lista os escritos de Antônio Cândido. Fui apresentado a ele quando li sua tese de doutorado transformada em livro pela Editora de José Olympio em 1964. Os “Parceiros do Rio Bonito “é uma joia rara que concilia o rigor da argumentação científica com a simplicidade e a leveza poética. Como é falsa a ideia de que os grandes intelectuais são aqueles que falam difícil e ninguém entende.... Talvez porque Cândido soubesse, como muitos poucos, alcançar a escrita singela, mas fruto de muito trabalho. 
Talvez seja o enorme respeito que tenho pelo Prof Antônio Cândido que me obrigou a reorganizar a minha agenda para assistir o documentário sobre a vida dele que foi apresentado na última 4a feira na Cinemateca Brasileira, na cidade de São Paulo. Quando morreu, aos 98 anos, Antonio Cândido deixou 74 cadernos inéditos. Baseado nos dois últimos, o documentário se debruça sobre textos escritos entre 2015 e 2017. Daí, em “Antônio Cândido - anotações finais”, nosso querido mestre discorre sobre os sinais de fragilidade física e a sua proximidade com a morte, permeado por notícias de jornal, preferências literárias e evocações dos antepassados. 
O documentário me tocou profundamente. Pude conhecer suas intimidades e os dramas da vida que envolvem o processo de envelhecimento. Ele reflete também sobre a delicada imbricação entre projetos de vida, sonhos e realizações. Ah, mas como eu queria lembrar a ele o que me ensinou outro grande mestre, Prof Maurício Mogilnik: “não somos nós que ficamos velhos, quem envelhece são eles”. Ser professor é manter o jovem que existe em nós! Obrigado por tudo, querido Prof Antônio Cândido. 

 


 

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