O conhecimento é sempre transformador, por isso neste espaço duas personalidades irão expor suas principais lutas em prol de promover a conscientização sobre a discriminação racial, em Presidente Prudente. O Dia da Consciência Negra, que faz referência à morte de Zumbi dos Palmares, um dos maiores líderes do Brasil, marca a luta pela libertação dos negros contra o sistema escravista.
Não é somente neste dia que esta bandeira tem que ser levantada, mas a data é fundamental para evidenciar as desigualdades e violência contra a população ainda existente em nossa sociedade. A presidente da Comissão de Igualdade Racial da 29ª Subseção da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), em Presidente Prudente, Larissa Costa, explica que é advogada, pesquisadora e mulher negra, por isso discutir os reflexos do racismo estrutural não foi uma escolha pessoal, foi uma necessidade imposta pela negação de direitos e a vivência cruel da discriminação. “Em novembro temos uma data específica, mas não é um dia de celebrar. O cenário de generalizada violação e exclusão pautado no elemento racial não nos permite celebrar. É momento de nos aquilombar, formar novos quilombos como lugares de resistência e luta contra o racismo”, destaca. “O Dia da Consciência Negra vem questionar a desigualdade social, a exclusão e a negação de direitos dos corpos negros e nos despertar para a urgência e necessidade do compromisso coletivo em consolidar práticas antidiscriminatórias” complementa.
Hoje, a advogada está à frente da Comissão de Igualdade Racial na OAB de Prudente, esta que propõe discutir, estudar e promover um debate amplo sobre o racismo no cenário jurídico e na sociedade fazendo também um trabalho social. Ela explica que já receberam denúncias de injúria racial e de intolerância religiosa, e que prestam auxílio jurídico para aqueles que procuram. “A comissão é formada por advogados negros e também não negros, mas que reconhecem a gravidade das violações de direitos fundamentais decorrentes dos processos de discriminação racial. Estamos juntos promovendo eventos, congressos, publicação de artigos, discussões, não só no cenário jurídico, mas com empreendedoras”, explica ao dizer que a comissão atua em duas frentes – promover a conscientização sobre a discriminação racial e atuar nas denúncias que recebem buscando junto à Defensoria Pública e ao Ministério Público tutelar um direito lesado.
Além de advogada e presidente da comissão, Larissa é mestra em Direito pela Unimar (Universidade de Marília), especialista em Penal e Processo Penal pela Toledo Prudente Centro Universitário, instituição que atualmente atua como professora de Prática Jurídica Penal. A data de hoje, segundo Larissa, é simbólica e foi escolhida por ter sido o dia da morte de Zumbi dos Palmares, líder negro que lutou bravamente contra a escravidão, e questiona onde e como estão nos negros hoje no Brasil. “A discriminação racial ainda existe e uma das formas de combatê-la é discutindo e expondo as mazelas enraizadas no dia a dia da sociedade brasileira. Inserir de fato o Dia da Consciência Negra nas atividades escolares, nas atividades empresariais, na mídia, é um imperativo para a construção de uma educação antirracista comprometida com a igualdade e com a justiça”, reforça. “Ao contrário do 13 de maio, data da abolição da escravidão, onde se exaltava-se a figura da princesa Isabel, tida como a única responsável pelo fim dos quase quatro séculos de escravização, o 20 de novembro consagra a luta negra. É por Zumbi que seguimos buscando formar novos quilombos e seguimos na luta contra o racismo estrutural”, acrescenta.
De acordo com a coordenadora do coletivo Mãos Negras e do Mocambo APMs (Agentes de Pastoral Negros e Negras) Nzinga Afro-Brasil: Arte – Educação – Cultura, Ivonete Aparecida Alves, também doutoranda pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), uma das principais lutas que devem ser lembradas neste dia está relacionada com as lideranças negras do Quilombo dos Palmares, que teve em Zumbi e Dandara a representação do trabalho coletivo e de um lugar pleno de vida, planejado e com uma república de fato democrática já nos anos 1770.
“A outra, com o fato deste país continuar negando o direito do povo negro às reparações devido ao processo escravocrata e, principalmente, das questões relacionadas ao racismo estrutural”, considera Ivonete. “A perversidade do racismo insidioso, assassino, disfarçado [só para quem não conhece] que esta nação alimenta é cruel e seu combate muito complicado. Então, a valorização da cultura afrobrasileira e africana e o resgate das personalidades negras importantes na luta contínua por liberdade e manutenção dos direitos conquistados são importantes”, acrescenta.
Ivonete, ao longo dos anos, desenvolve um importante trabalho em Prudente. Segundo ela, a primeira luta que foi obrigada a enfrentar foi a sobrevivência, pois com diplomas engavetados fez um pouco de tudo até conseguir assumir a arte e o artesanato afro como fonte de renda. Ao mesmo tempo, inclusive, insistiu nos processos seletivos até entrar no mestrado. “O mocambo e o trabalho com as crianças me ajudaram muito na elaboração de formações na educação formal e na educação popular, aliando as práticas antirracistas aos processos da cultura e da arte”. À reportagem, ela também diz que o Comir (Conselho Municipal da Igualdade Racial) foi um termômetro para pensar em estratégias de luta a favor da valorização das pessoas negras, e o Coletivo Mãos Negras também tem sido um foco de discussão e alianças para o estudo em grupo.
A coordenadora do coletivo reforça a importância desse ativismo. “Não posso e nem quero retirar minha pele, então, tenho que continuar lutando. As questões de ser mulher negra em um país racista e misógino me impuseram várias lutas. Algumas, inclusive, que eu preferia não ter que fazer”.
Foto: Cedida
“Seguimos na luta contra o racismo estrutural”, reforça Larissa Costa
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