Política

ONGs veem prejuízo à sociedade em extinção de conselhos por Bolsonaro

  • 03/05/2019 21:10
  • FLÁVIA FARIA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Prejuízos para a formulação de políticas públicas e na participação da sociedade no processo democrático são alguns dos problemas apontados por ONGs e entidades da sociedade civil organizada no decreto do presidente Jair Bolsonaro (PSL) que extingue, a partir de 28 de junho, colegiados ligados à administração federal. A medida determina o fim de conselhos, comissões, comitês, juntas e outras entidades do tipo que tenham sido criadas por decretos ou por medidas inferiores. Muitos deles são formados por integrantes de órgãos do governo em conjunto com membros da sociedade civil. Os que foram criados por lei, como o Conselho Nacional de Educação e o de Saúde, e os que surgiram na gestão atual estão mantidos. Nas redes sociais, Bolsonaro afirmou que os cortes vão gerar "gigantesca economia" e que as entidades são "aparelhadas politicamente usando nomes bonitos para impor suas vontades". Questionada, a Casa Civil não informou qual a expectativa da economia obtida com a extinção dos colegiados. Em protesto, 39 entidades assinaram manifesto contra a medida. Afirmam, em nota, que a atitude do governo vai "na contramão do desenvolvimento democrático". De acordo com Laila Belix, do Instituto de Governo Aberto e membro do Pacto pela Democracia, organização que estruturou o manifesto, a canetada do presidente peca por agrupar colegiados com diferentes funções e extingui-los sem prévio estudo. "O governo não fez nenhum estudo aprofundado das estruturas para identificar o que é fundamental para a formulação de políticas públicas, o que tem caráter mais estratégico. Não sabe quantos existem e coloca no mesmo balaio estruturas que não são iguais, que têm funções diferentes." O Planalto afirmou que não sabe ao certo quantos colegiados existem, mas estima em cerca de 1.000. A intenção, segundo divulgou o governo em abril, é reduzir o número de entidades para cerca de 50. Até 28 de maio, os ministérios devem enviar à Casa Civil a relação de colegiados e solicitar a recriação dos que considerarem pertinentes. O Planalto terá 60 dias para analisar as justificativas das pastas. O corte, preveem as ONGs, deve atingir diferentes setores. Alguns dos colegiados ameaçados são a Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo, o Comitê Gestor da Internet no Brasil e a Comissão Nacional de Política Indigenista. "Os conselhos têm a função de discutir o que vai ser proposto pelo governo e acompanhar e monitorar o que foi feito em planos e processos participativos. Se não há a estrutura, não há espaço de debate e monitoramento", diz Laila, do Pacto pela Democracia. Na última terça (30), o ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu submeter ao plenário ação do PT que pede a suspensão do decreto. Ainda não há data para o julgamento. O Ministério Público Federal também manifestou preocupação com a medida do presidente. Membro do Conselho Nacional de Segurança Pública, Ivan Marques, do Instituto Sou da Paz, critica o decreto, que considera pouco eficiente do ponto de vista econômico mas bastante prejudicial para a formulação de políticas públicas. "Ninguém recebia nada por participar. É um trabalho baseado no dever cívico, e as pessoas abriam mão de suas vidas particulares e profissionais para emprestar suas especialidades ao governo", diz. A participação de membros da sociedade civil nas comissões é voluntária. O governo arca com itens como alimentação e passagens aéreas. Em nota, a Casa Civil afirmou que "o espírito do decreto é o regramento e a otimização de recursos públicos" e que "tais grupos e reuniões demandam recursos públicos como o tempo de cada funcionário empregado no seu funcionamento, bem como recursos como diárias de viagem, hospedagem, deslocamento e eventuais reembolsos". Ivan afirma que o principal benefício dos colegiados é promover o debate entre a sociedade e os ministérios, melhorando a formulação de políticas públicas. "É lamentável que esse governo não esteja disposto a escutar de maneira formal e organizada as organizações da sociedade civil para tomar decisões", opina. Laila, do Instituto Governo Aberto, afirma que a participação de diferentes setores contribui para que as propostas formuladas pelo poder público atendam às demandas da sociedade. Para ela, a extinção dos colegiados gera grandes prejuízos para a democracia participativa. "Temos gargalos na participação, mas não é extinguindo [os colegiados] que vamos superá-los. O antídoto é mais participação, não menos."