Transitórios, inseguros e fechados

OPINIÃO - Sandro Rogério dos Santos

Data 20/01/2019
Horário 04:05

Transitórios, peregrinamos na existência. Na sucessão de dias, podemos sempre aprender. Ao viajarmos, sentimo-nos chamados a refletir sobre o papel dos humanos no mundo e suas relações. Não falarei em primeira pessoa nem sobre os meus reclames internos. Gostaria de expressar sentimentos de algum modo comum, senão a todos, a muitos. Tanto mais urgente a reflexão quanto mais nos sentimos fechados ao outro, amedrontados por acontecimentos imaginários ou reais. Aqui, poderia destacar o medo de assaltos, violência, terrorismo, desemprego... perdas em geral. A sensação de insegurança nos faz ainda mais fechados. Os que não se fecham são tidos por inconsequentes.

Enquanto reflito sobre o que escrever, leio um artigo de jornal que me municia de mais argumentos para o meu pretendido texto. Dia desses – mais precisamente na festa da Epifania do Senhor – afirmei em homilia que segundo a Conectas Direitos Humanos, 3 milhões de brasileiros vivem no exterior, número superior aos 700 mil estrangeiros que atualmente residem em nosso país – para recordar as proporções, somos 200 milhões de brasileiros. Importava a informação, sobretudo porque o noticiário mostra diariamente o drama de grandes multidões que saem de sua pátria à procura de refúgio ou de melhores condições de vida, seja por causa de guerra, de pobreza ou de perseguições diversas.

Bruna Toni afirma no seu artigo que “o Pacto Global de Migração, acordado em dezembro último por 164 países, incluindo o Brasil, foi rejeitado pelo novo governo na última semana, em nova conferência da ONU. Segundo nossos representantes federais, o acordo ameaçaria a soberania e autonomia do Brasil para decidir sobre os migrantes que aqui chegam”. A articulista também lembra que “o pacto, no entanto, não é jurídico e não coloca em xeque o poder de decisão de um Estado sobre suas políticas. É uma carta de recomendações – grifo essa palavra – para que haja, formalmente, um esforço de coordenação segura dos fluxos migratórios que sempre existiram e que vão continuar existindo com ou sem acordo”.

Nem é preciso lembrar das raízes brasileiras da população, advindas de muitas nações estrangeiras. Talvez seja o caso do leitor verificar pelo sobrenome ou pela quantidade de nacionais procurando cidadania estrangeira (graças aos avós ou pais que vieram de algures). Em tempo, leio numa rede social o desabafo do jornalista Jamil Chade: “A xenofobia [aversão a pessoas e coisas estrangeiras] é uma merda. Por estar escutando um áudio de uma entrevista em português num trem (em um volume baixo), acabo de ouvir de um senhor aqui em Genebra [onde o jornalista mora e trabalha]: ‘cruze a fronteira para ficar ouvindo essa língua estrangeira’”. Não à toa o Papa Francisco insiste com palavras e ações em favor dos migrantes. Não fala de suprimir fronteiras, mas de não fechá-las como se ninguém tivesse nada a ver com o sofrimento alheio – nova versão de Caim que, após matar o irmão, questiona se seria responsável por seu irmão (cf. Gn 4,9).

É horroroso sentir-se rejeitado por pessoas queridas, por vizinhos ou gente do nosso grupo. Imagina quando você sai em viagem para terras estrangeiras e o que querem de você é nada além do seu dinheiro. Um ponto a destacar nesse cenário é o quanto acolhemos turistas e migrantes de outros lugares e o quanto de acolhida e segurança lhes devotamos. Estamos celeremente assimilando as “desvirtudes” alheias e deixando de lado as nossas virtudes. Em leitura menos otimista, estamos sendo “desmascarados” quanto ao nosso jeito brasileiro de ser. E o mundo, desafiado a oferecer mais que dinheiro e ostentação, acolhida aos irmãos. Seja bom o seu dia e abençoada a sua vida. Pax!!!

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