Sucesso da lava-jato depende mais da sociedade, do que da operação em si

EDITORIAL -

Data 22/06/2018
Horário 04:00

“Uma perspectiva equivocada que as pessoas têm é de que a Lava Jato vai mudar o Brasil ou que ela é suficiente para mudar o Brasil, mas isso é um erro.” Com essa frase, o coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato, procurador da República, Deltan Dallagnol, resumiu o grande temor de todos os envolvidos em processos de combate à corrupção no país: de que a sociedade não absorva os padrões de transparência, adotando às suas pautas demandas como fiscalização e punição de ímprobos.

Inspirada na Operação Mãos Limpas, que combateu a máfia italiana nos anos 90, a sombra de receio que paira sob a Lava Jato é de que ela tenha o mesmo fim daquela na qual se espelhou, resultando em frustração e leis que neutralizavam as penas aplicadas pela Justiça. Tanto é verdade que mais de duas décadas depois, podemos notar, nas terras ítalas, que o sistema conseguiu manter-se vivo mesmo após o duro golpe das mãos limpas.

Uma grande diferença entre as duas realidades é a ameaça de ataques às diligências por duas frentes: o parlamento, corrupto, por meio de tentativas de mudança da Constituição e diminuição do poder investigativo de órgãos como o Ministério Público, e do próprio Judiciário, haja vista que alguns ministros anunciam a possibilidade de rever posições que foram tomadas anos atrás, criaram jurisprudências e interferiram em uma série de decisões posteriores de instâncias. Ainda assim, a “mecânica” da corrupção de ambos os casos é quase igual: desvios de verbas, principalmente pelo superfaturamento de obras para benefício de empreiteiras que financiavam partidos políticos. 

Ainda no campo das similaridades, no Brasil e na Itália, a “massa” chegou a ir às ruas para apoiar a investigação, mas logo se cansou. Essa postura minimiza a eficácia das operações na medida em que reduz o apoio popular e, consequentemente, a cobertura midiática. O “abandono” do tema abre espaço para que as forças escusas do sistema corrupto intrincado nas instituições consigam contornar as punições sorrateiramente por meio de artimanhas sórdidas e extremamente criativas, resultando em poucas mudanças efetivas no longo prazo. Assim, como prenunciou Dallagnol em sua análise distópica, pode ser que a operação só resulte mesmo em uma “dança da cadeira” dos corruptos. A definição do futuro, todavia, não poderia ser mais democrática: está literalmente na mão do povo.

 

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