Ex-aluna do Guri traz na mala experiências marcantes de 10 meses, na África, pelo Move

Karoline da Silva Ribas, 23 anos, fala nesta entrevista de momentos riquíssimos vividos em um lugar de cultura totalmente diferente do seu país, incluindo a falta do básico para viver

VARIEDADES - SANDRA PRATA

Data 14/08/2018
Horário 04:00

Ao aterrissar de volta ao Brasil em 1º de junho, após uma aventura de 10 meses na cidade de Lilongwe, capital do Malawi na África, a prudentina e ex-aluna do Projeto Guri, Karoline da Silva Ribas, 23 anos, traz na mala uma bagagem repleta de experiências riquíssimas.

A jovem foi uma dos seis brasileiros presentados pelo projeto Move (Musicians and Organizers Volunteer Exchange) que é promovido no Brasil pelos Amigos do Guri -e tem parceria com outras três escolas de música em países como Noruega e Moçambique.

Em um bate papo com Karoline, ela contou à reportagem que o primeiro desafio que precisou enfrentar foi a barreira linguística, uma vez que, não dominava o inglês e, naquela situação a comunicação era imprescindível.

“Embora eu tenha feito um curso rápido de inglês um mês antes de viajar, nos primeiros meses foi complicado. Perdi muitas informações por não entender o que diziam, mas com a convivência, principalmente por morar com dois noruegueses que me ajudaram muito, o processo de adaptação foi melhorando”, lembra.

Karoline ressalta a receptividade de todas aquelas pessoas que também tinham certa expectativa com sua chegada, tendo em vista que antes dela e do pianista Gabriel do Santos chegarem ao município, outras duas equipes brasileiras contempladas pelo Move já haviam passado por lá anos antes.

“Eles são muito interessados, queriam saber tudo sobre nossa cultura. Quando chegamos já tinham uma expectativa sobre o que iriamos ensinar”, expõe.

Karoline conta que chegou a África acompanhada de mais um brasileiro, o pianista Gabriel do Santos e outros dois noruegueses que juntos dividiram o alojamento durante toda a viagem. Segundo ela, o Move cobriu todos os gastos com viagem, hospedagem e alimentação.

“Além disso, recebíamos uma bolsa para custear aspectos básicos de higiene. Antes de embarcarmos para o Malawi tivemos um curso preparatório de duas semanas na Noruega”, explica.

Conhecer outro país, outras culturas, aprender um novo idioma, este são alguns dos sonhos da maioria dos estudantes brasileiros, conforme aponta a pesquisa realizada pela Belta (Associação Brasileira de Agências de Intercâmbio) que mostra que em 2017 o crescimento do mercado nacional no ramo foi de 23% chegando a marca inédita de 302 mil intercambistas. Karoline foi uma das que conseguiram realizar esse sonho.

Mesclando culturas

Justamente para sanar a curiosidade que a comunidade local tinha a respeito da vivência brasileira, Karoline, com o apoio da escola Music Crossroads desenvolveu durante três meses um worskhop de percussão brasileira ensinando ritmos como samba, baião e maracatu.

“Desenvolvemos esse worskhop não só em outros distritos da região de Lilongwe também, com um público bem variado desde jovens de 15 anos até senhores de 50. As aulas eram ministradas na sede da escola durante duas horas, três dias por semana. Algo interessante é que até alguns anos atrás, não era comum mulheres tocarem tambores por lá, então acredito que a oficina, elas vendo uma moça estrangeira que toca percussão serviu como incentivo para as meninas quem sabe até praticarem”, pontua.

Além do workshop, a percussionista desenvolveu atividades de iniciação musical com crianças de 2 a 4 anos. “Como eles eram muito novinhos, não tinha como ensinar percussão, então usávamos sucata para construir chocalhos e nos divertíamos muito”, relembra saudosista Karoline.

Embora nunca tenha tido a experiência de conhecer outro país, ensinar ela domina, pois desde os 13 anos, quando começou a tocar na fanfarra da escola, gostava de passar o que aprendia aos seus colegas.

“Comecei na fanfarra como dançarina, mas aos poucos fui aprendendo um a um os instrumentos [com carinho especial pela percussão], e no final, eu ajudava o regente da banda a ensinar os demais”, relembra Karoline.

“Comecei na fanfarra como dançarina, mas aos poucos fui aprendendo um a um os instrumentos [com carinho especial pela percussão], e no final, eu ajudava o regente da banda a ensinar os demais”

Karoline da Silva Ribas

ex-aluna do Projeto Guri

Choque cultural

Karoline exalta que estar rodeada de pessoas que são desprovidas do básico para uma vida digna como saneamento, é o suficiente para perceber o quanto nós brasileiros devemos ser gratos pela vida que temos. “Claro que se tivéssemos um governo menos corrupto as coisas seriam muito melhores, mas quando vi que aquelas pessoas não tinham nem vaso sanitário, precisam fazer as necessidades em foças, mulheres buscam água em rios e transportam em potes na cabeça ao mesmo tempo em que carregam seus filhos... é marcante”, frisa.

Segundo ela, esses dez meses foram suficientes para entender que coisas que parecem básicas e comuns são extremamente raras em outros locais. Embora em seu alojamento Karoline dispunha de água, luz e tudo que fosse necessário, às vezes, quando ficavam sem energia ou água por algum problema de fornecimento, não tinham coragem de reclamar. “Adaptávamos-nos, porque se olhássemos a vizinhança iriamos ver que estávamos no céu e que nossos problemas eram os menores daquele lugar”, enfatiza.

Outro fator que serviu como evolução pessoal, foi a percepção de que tudo é possível na base da força de vontade. “Durante o workshop na escola, conheci o Eric, ele é um professor de bateria excelente, ouso dizer que o melhor do Malawi. Quando era criança não tinha condições de comprar uma bateria, com sucatas fez a sua própria e começou a aprender sozinho. Agora é professor na escola de música”!, exclama Karoline.

Do Guri para o mundo

Karoline foi aluna do Projeto Guri de 2008 a 2011 onde fazia aulas de violino. Segundo ela, apesar de ter se dedicado quatro anos ao instrumento sua verdadeira paixão sempre foi a percussão. “Depois que sai do projeto comecei a fazer aulas particulares de viola caipira e dar aulas no Conservatório Musical Maestro Julião. Na faculdade entrei para o curso de bateria [hoje estou no último ano de Arquitetura e Urbanismo] lá fiz o mesmo que na fanfarra quando tinha 13 anos, aprendi cada um dos instrumentos [risos]”, destaca.

Fabiana Sanches Peres, que é gerente do polo do Projeto Guri em Prudente, destaca que o programa sociocultural visa contribuir com a formação musical de crianças, jovens e adolescentes. Atualmente, conforme ela, a unidade atende 688 alunos entre 6 e 18 anos.

“Muitos sonham em participar do Move como a Karoline, pois é uma chance de proporcionar outra experiência ao aluno. Dar a chance de transmitir os aprendizados do nosso projeto em outros países, com outras culturas”, enfatiza.

A oportunidade que Karoline teve está aberta para atuais e ex-estudante do projeto Guri que tenham entre 18 e 25 anos e residir no Estado de São Paulo.

 

“Adaptávamo-nos, porque se olhássemos a vizinhança iriamos ver que estávamos no céu e que nossos problemas eram os menores daquele lugar”

Karoline da Silva Ribas

ex-aluna do Projeto Guri

Cedidas - Karoline Ribas classifica suas experiências vividas em dez meses em Lilongwe, Malawi, na África, como memoráveis

 

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