Contagem de votos desconsidera brancos e nulos

Diferente do que propagam, votação nesses termos não tem força para anular pleito, exceto em caso de decisão judicial, devido à prática de abuso de poder político

Eleições - ANDRÉ ESTEVES

Data 12/09/2018
Horário 08:02
Arquivo - Fabiano diz que voto deve ser exercido em favor da população
Arquivo - Fabiano diz que voto deve ser exercido em favor da população

Ao mesmo tempo em que as redes sociais pluralizaram o acesso ao conhecimento, também abriram espaço para que as informações chegassem desamparadas por qualquer fonte confiável. Durante o período eleitoral, tais equívocos tendem a se multiplicar. Não raro, os usuários recebem mensagens que destacam os “poderosos efeitos” dos votos brancos e nulos e como eles podem definir os resultados de um pleito. Sua validade, no entanto, é contestada pelo chefe de cartório da 101ª ZE (Zona Eleitoral) de Presidente Prudente, Fabiano de Lima Segalla, o qual explica que a abdicação da escolha de um representante não exerce impacto durante a contagem de votos.

Em um contexto geral, o titular esclarece que a única diferença entre os brancos e os nulos está em seu conceito e na forma como são registrados. Os eleitores que cumprem o dever cívico, mas decidem não optar por um candidato, têm duas alternativas: ou apertam a tecla “branco” na urna eletrônica e ou digitam um número que não corresponda a qualquer postulante e confirmam que anularão seu voto. Fabiano denota que, antes das eleições serem feitas por via eletrônica, esse tipo de voto já existia – bastava não preencher a cédula. Também não entravam para a apuração os papéis que constassem escritos ou marcações sem fundamento. Em termos práticos, tanto o branco quanto o nulo nunca tiveram eficácia. “Se você possui 100 mil votos possíveis e, no cômputo geral, 30 mil são brancos e nulos, serão considerados os 70 mil válidos”, ilustra.

Nos últimos anos, aplicativos de mensagens viralizaram informações que incentivavam o eleitor a votar em branco ou nulo, alegando que, se somassem mais de 50%, a eleição ficaria anulada e uma nova seria convocada. Fabiano argumenta que essa hipótese não passa de um mito e erro de entendimento. Ele aponta que o Código Eleitoral prevê, sim, a realização de um novo processo caso seja anulada mais da metade dos votos, desde que justificado por uma decisão judicial, devido à prática de abuso de poder político.

Em um exemplo radical, ainda que 90% dos votos forem brancos ou nulos, os 10% restantes comporão o resultado da eleição. É possível ir além: mesmo que seja computado apenas um voto válido, este definirá o novo representante de um país. Outro viral defende que, ao votar branco ou nulo, o eleitor repassa seu voto para o candidato que está na frente, o que também é mito, já que, conforme explicado, são levados em conta somente os votos válidos.

As possíveis consequências de uma “epidemia de votos brancos” já foram objeto explorado pela literatura. Em “Ensaio sobre a lucidez”, José Saramago cria um país imaginário onde, em um dia chuvoso de eleições, a grande maioria dos eleitores opta por votar em branco. A partir deste fenômeno inusitado, o escritor português propõe uma reflexão sobre a fragilidade do sistema político.

Voto não é bem privado

Fabiano completa que, embora a descrença na política brasileira motive esse tipo de abdicação, o sistema posto é este e elegerá titulares aos cargos políticos independente da quantidade de votos brancos ou nulos. “Sendo assim, é interessante que a sociedade se organize para tentar escolher o melhor candidato possível”, expõe. Para Fabiano, os eleitores têm a noção errada de que “o voto é algo estritamente patrimonial e privado e cabe a eles decidirem se vão dá-lo a alguém”. Nesse sentido, há até mesmo aqueles que vendem o seu voto por julgarem ser um bem particular, quando, na realidade, deve ser um direito exercido em favor da população e da legitimidade da democracia.

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