Cesuras

Do latim “caesura” significa corte. Na medicina “cesura” tem sentido de fissura. É um termo utilizado para indicar uma interrupção brusca. Interrupções bruscas são próprias de experiências pelas quais os seres humanos são submetidos em seu dia a dia. Nossa vida é um arco composto de cesuras. Começando pelo nascimento e terminando com a morte. Quando nascemos passamos por uma cesura magistral. Deixamos um universo “perfeito” - útero da mãe - para ir à direção do universo externo e infindável de cesuras. Iniciamos toda uma trajetória desse arco inerente e ascendente em decorrência de transformações de um viver em todos os sentidos.

Somos amamentados e nutridos pela natural dependência própria do homem. Tudo começa pela oralidade. A cesura do nascimento ganha esperança no contato com a mãe suficientemente boa. Em uma relação de unidade com a mãe, gradativamente vamos sendo preparados para as cesuras do eu-não eu (existe alguém além de mim). Em seguida entra a terceira pessoa, chamado pai. Cesura. Há o desmame. Cesura. Necessidade de novos horizontes. Engatinhamento e o andar. Cesura do colo da mãe. Início de balbucios. Comunicação e linguagem. Ouvimos sons a partir de nós mesmos. De bebê à infância. Cesura. Entrada da fase pré-escolar. Cesura. Perda parcial da proteção dos pais. Atualmente essa saída está ficando cada vez mais precoce. Início da socialização. Aprendizagem e constituição da identidade. Introjeções e projeções constantes.

O que sou? Eu não sou ele, não sou ela. Terei de ser eu. Perda da bissexualidade. “Elaboração” do Complexo de Édipo. Cesura. Superego, herdeiro do complexo de Édipo, assume o posto. Censura, crítica e juízo. Já não posso andar nu pela casa. Crueldade e Cesura. Vem à cesura do corpo infantil, identidade infantil, e pais da infância. Anúncio da adolescência. Sou criança ou adulto? Cesura. E minha carteira de habilitação, me habilita para que? Sou maior de idade? Que medo! Cesura. Escolha da profissão. Faculdade e formatura. Sou formado. Cesura. Trabalho e rotina. Cesura. Sinto falta de algo. Preciso de algo que não sei bem o que é. Um mal estar invade-me e busco incessantemente por alguém. Cesura. Já não sou mais adolescente. Vem o casamento. Cesura da família. Constituição de nova família. Sou responsável por todos os meus atos. Cesura. Sou adulto. Cesura. Mas se sou adulto e meus pais? Vamos nos separar? Cesura.

Não. Não quero crescer. Quanto mais desenvolvo mais distante deles permaneço. Estão envelhecendo? Vou perdê-los? Cesura. Brigas constantes entre o princípio da realidade e princípio do prazer. Nesse arco de cesuras entre o nascimento e morte, não há um ser humano que escape. Todos vivemos, sem exceções, cesuras, censuras, cisões, decisões, decepções, recepções, rebeliões, frustrações, gratificações, formações, corrupções, enganações, sensações, percepções, idealizações, alienações, depressões, oscilações, ilusões, lutos, e a morte real.

Há cesuras, além dessas, chamadas traumáticas que também pertencem ao arco de cesuras da história singular de cada indivíduo. Vamos fazer desse arco inerente de cesuras o arco-íris constante em nossas vidas. Enquanto vivemos de cesuras em cesuras, que possamos brincar com o colorido das cores proposto pelo arco-íris da vida. Cada cor em conjunção com outra, sempre dará novas cores. Não tenha medo do novo. Somos habilitados com um aparelho para pensar os pensamentos. A experiência emocional nos prepara para toda a trajetória do arco de cesuras. Aprendemos com a experiência.

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