A pipoca e sua transformação

Há momentos na vida em que a transformação é inevitável. Sair da zona de conforto é desconfortável. Se o útero da mãe é o local perfeito, por que sair? E se ficar? Chega uma hora que a própria natureza se incumbe. Água estagnada ou parada; já sabemos o destino. Quantas vezes, o depressivo não quer sair da cama. E o ansioso não vê a hora de sair da cama. E ainda pergunta: para que dormir? O anoréxico não quer comer, quer ter um corpo infantil. E pergunta: para que comer, crescer ou desenvolver? E o obsessivo compulsivo não quer parar de trancar a porta, verificar o gás ou a janela. Verifica centena de vezes antes de dormir. Não quer sair dos rituais. Para que? Não sabe fazer outra coisa. E o compulsivo! Não quer deixar de comprar. Perguntam: “Farei o que no lugar? Não sei o que fazer. Perco-me totalmente no vazio ou no nada. Não tolero frustrações”.

Tolerância para mudanças ou transformações nem sempre é bem vista. Os adolescentes, por exemplo, sofrem muitas mudanças. Puberdade é caracterizada pela fase de transformações físicas, fisiológicas e hormonais. O jovem garoto sofre de dores nos joelhos. A jovem sofre pelo nascimento dos pelos pubianos e sua menarca. Resistem às transformações. Sentimentos internos e ambivalentes causam confusões. As transformações nos chamam para as responsabilidades.

Chega um momento em que o mestrando ou doutorando deve apresentar sua tese para a banca examinadora. Lembrei-me de um texto de Rubens Alves. Muito bom. Aproveitando o mês de junho; festas juninas. Vamos falar de milho de pipocas. Assim, “Milho de pipoca que não passa pelo fogo continua a ser milho para sempre!”. Assim acontece com a gente. As grandes transformações acontecem quando passamos pelo fogo. Quem não passa pelo fogo, fica do mesmo jeito a vida inteira. São pessoas de uma mesmice e uma dureza assombrosa. Só que elas não percebem e acham que seu jeito de ser é o melhor jeito de ser.

Mas, de repente, vem o fogo. O fogo é quando a vida nos lança numa situação que nunca imaginamos: a dor. Pode ser fogo de fora: perder um filho, o pai, a mãe, perder o emprego ou ficar pobre. Pode ser fogo de dentro: pânico, medo, ansiedade, depressão ou sofrimento, cujas causas ignoramos. Há sempre o recurso do remédio: apagar o fogo! Sem fogo o sofrimento diminui. Com isso, a possibilidade da grande transformação também. Imagino que a pobre pipoca, fechada dentro da panela, lá dentro cada vez mais quente, pensa que sua hora chegou: vai morrer. Dentro de sua casca dura, fechada em si mesma, ela não pode imaginar um destino diferente para si. Não pode imaginar a transformação que está sendo preparada para ela. A pipoca não imagina aquilo de que ela é capaz.

Aí, sem aviso prévio, pelo poder do fogo a grande transformação acontece: BUM! E ela aparece como outra coisa, completamente diferente, algo que ela mesma nunca havia sonhado. Bom, mas ainda temos o piruá, que é o milho de pipoca que se recusa a estourar. São como aquelas pessoas que, por mais que o fogo esquente, se recusam a mudar. Elas acham que não pode existir outra coisa mais maravilhosa do que o jeito delas serem. A presunção e o medo são a dura casca do milho que não estoura. No, entanto, o destino delas é triste, já que ficarão duras a vida inteira. Não vão se transformar na flor branca, macia e nutritiva. Não vão dar alegria para ninguém. Viva Santo Antonio! Viva São João! Viva São Pedro! Dá-lhe pipocas!

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