“Vô, quando eu crescer eu quero trabalhar de carteiro como você e isso me deixa muito feliz”

Edison Tiosso Júnior, CARTEIRO

Weverson Nascimento - Edison está há 24 anos na empresa e lembra com carinho do crescimento profissional
Weverson Nascimento - Edison está há 24 anos na empresa e lembra com carinho do crescimento profissional

Edison Tiosso Júnior, 54 anos, começou trabalhar com apenas 15 anos, quando ainda era permitido, e com direito a carteira assinada. Intercalando entre empresas de transporte, banco, frigorífico e como vendedor, passou parte de sua vida prestando serviços, até ingressar em 1995 na agência da ECT (Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos) em Presidente Prudente. Por três anos se dedicou aos serviços de “carteiro pedestre”, como são conhecidos àqueles que caminham entregando encomendas ou correspondências. Em meados de 1997, com os avanços no setor, Edison passou a realizar entregas com moto e, posteriormente, veículos.

Atualmente, há 24 anos na empresa, ele lembra com carinho do crescimento profissional que teve ao longo dos anos e afirma que, com a empresa, aprendeu ter mais disciplina e que as muitas histórias trouxeram experiências que levará para o resto da vida. O carteiro considera que não se vê hoje trabalhando dentro de uma sala ou com uma função superior, a não ser realizando entregas. Todo esse amor se da também pelo apoio e incentivo da mulher, dos quatro filhos e dos seis netos, que com olhos marejados, expressa: “tenho uma família abençoada.”.

 

O Imparcial: Como funciona o dia a dia de um carteiro?

Edison: Eu entro 8h30 e descarrego o caminhão que chega de Bauru ou São Paulo. Descarrego, faço a triagem das encomendas e depois separo por setores e em seguida por distrito. Depois colecionamos a linguagem, porque cada um faz o seu para entregar, o que toma nosso tempo até o horário de almoço. À tarde, em torno de 12h, dependendo da quantidade de encomendas saio para entregar no meu distrito. Nós temos 21 distritos de distribuição em Prudente, tem setores maiores com mais percurso e tem outros menores, mas em compensação há mais encomendas naquele espaço determinado. Exemplo, quem faz o centro geralmente tem mais encomendas. No meu caso eu faço bairros e vilas, então o percurso às vezes chega até 70 km dentro do município. Muitas vezes 12h e vou até às 17h30.

 

Quais são os principais desafios enfrentados pelo carteiro? O sol quente? Os dias de chuva?

Quando eu trabalhava de carteiro pedestre o sol era complicado, mas a empresa hoje tem todo o tipo de proteção: protetor solar, óculos, boné e, em dias de chuva, capa. O sol realmente é muito forte, mas, além disso, os cachorros são complicados, pois mesmo estando de carro você tem que chegar à casa da pessoa, você tem que bater palma, você tem que esperar ela abrir para entregar a encomenda. Então, cachorros é uma coisa complicada, por isso conscientizo a população da importância da caixinha de correspondência, porque você às vezes não tem onde colocar. Exemplo: se eu colocar no portão o cachorro poderá comer e a responsabilidade será nossa, então é uma das coisas que mais pesa atenção.

 

Você citou os animais de estimação, eles oferecem riscos à profissão?

O cachorro independe de você estar a pé, de moto ou de carro, você terá que parar para entrar na casa. Aproveito para pedir a colaboração de todos que segurem seus cachorros, não deixem eles soltos nas ruas, providencie a caixinha de correspondências porque são detalhes que nos ajudam muito. Tomamos todos os cuidados, mas tem uma hora que o cachorro pode te morder e você fica com o psicológico afetado e ficar com medo de ir naquela casa, então acaba sendo uma dificuldade.

 

Houve alguma situação inusitada que te marcou durante um dia de trabalho?

Uma coisa bacana foi que agora estamos trabalhando com aplicativo para foto da assinatura da pessoa, não usa mais os métodos antigos para comprovar o recebimento. Esses tempos, logo no começo, eu fui fazer uma entregar para uma senhorinha, e disse: “agora a senhora me empresta que eu tenho que tirar uma foto”. Ela foi para dentro de casa, penteou os cabelos, trocou de roupa, passou batom para eu tirar foto achando que eu iria tirar foto dela. Nós não podemos tirar foto da pessoa, ai ela segurou próximo dela e eu tive que enquadrar somente a assinatura, então são coisas assim que marcam o nosso trabalho.

 

O carteiro entrega todo tipo de carta e correspondência, algumas com boas notícias e outras com notícias indesejadas. Algum tipo de situação assim já foi “descontada” em você?

Geralmente as pessoas acabam até brigando no sentido de “você traz cobranças”. Hoje nem tanto, porque estamos com veículos, mas quando você está a pé e entrega, por exemplo, as notificações para as pessoas comparecerem ao Fórum. Outra coisa que acontece também é que a pessoa pode vender para você hoje, mas ela pode postar amanhã cedo, e já aconteceu um caso em que uma mulher queria brigar comigo porque a entrega estava atrasada e o marido tinha encaminhado um documento importante. Porém, eu provei para ela porque quase 90% das encomendas têm um carimbo nosso, e mostrei para a data correta que foi destinada a ela. Mas também existe o lado bom, porque às vezes a pessoa espera que o produto chegue há tantos dias e chega antes. Essas coisas acabam marcando muito e as pessoas te agradecem.

 

Durante toda a sua trajetória como carteiro, você construiu elos de amizade com os moradores?

O que acontece é que trabalhamos em torno de cinco anos em um setor e depois mudamos para fazer outro. Quando você volta por motivos de férias ou licença de outro profissional, é bacana porque você chega e as pessoas dizem: “carteiro você voltou, que legal você aqui”. Então você constrói bastante vinculo! E tem também algumas empresas que convidam você no final de ano, pois consideram que o carteiro passa o ano prestando serviços logo, você acaba construindo uma amizade com as pessoas.

 

Quais foram suas principais conquistas como carteiro?

De forma material, quando eu entrei nos Correios eu tinha apenas uma moto financiada e hoje eu tenho a minha casa, o meu carro. O bem espiritual mudou tudo também, porque eu trabalho em uma empresa bem conceituada, onde eu tenho prazer de colaborar. Eu acordo cedo e venho para cá com prazer e não venho forçado, ela me proporciona tudo o que eu preciso desde materiais para minhas entregas até o meu “estado de saúde”, se eu precisar de um médico, e isso agrega também para minha família. Então, esse bem-estar eu acho que é o principal. Um dia eu li um folheto que fala assim: para você se dar bem no que você faz você tem que gostar do que você faz. Eu trabalhei em várias empresas e não reclamo de nada, mas eu amo o que eu faço e sei que com meus 54 anos Deus preparou o melhor para mim ao me dar essa empresa para trabalhar e, atrás de tudo isso, eu tenho minha família. Quando saio de casa eles me apoiam 100% por eu ser carteiro, minha esposa e meus filhos me apoiaram. Já ouvi varias vezes os meus netos dizerem: “vô, quando eu crescer eu quero trabalhar de carteiro como você”, e isso me deixa muito feliz!

 

Na sua opinião, qual a importância desta figura para o dia a dia das cidades?

A importância dele é como todas as outras profissões, o colaborador do Correio tem a importância de levar as boas notícias e, infelizmente, as más também. Como seria se não tivesse os Correios para você comprar alguma coisa? Hoje nós temos a tecnologia em que mandamos tudo por e-mail, WhatsApp, mas têm coisas que você não pode mandar por ali, ou seja, não tem como mandar uma roupa por ali, então eu acho que a empresa e o profissional é de suma importância.

 

Quais são seus sonhos dentro e fora da profissão?

Eu amo ser carteiro, eu não me vejo hoje trabalhando dentro de uma sala, com uma função superior a carteiro, a não ser eu fazendo as entregas. Eu gosto de conversar, de ver as pessoas, de trabalhar em bairros e lá ter a oportunidade de conversar com um idoso. Nós carteiros vemos que falta um pouco de calor humano, quando você chega à pessoa ela quer contar do filho, da filha, talvez o que não consegue falar dentro de casa ela pega você para falar, então isso é bom para mim e eu gosto muito. Meu sonho é continuar na empresa até me aposentar e quando eu sair daqui, dizer: “Dei o meu melhor para vocês”. Esse é o meu sonho, é sair daqui de cabeça erguida e saber que fiz o meu melhor. Meu pai sempre dizia para mim, “qualquer profissão que estiver você tem por direito fazer o seu melhor, para nunca se arrepender do que você fez”.  

 

Qual a relação do profissional Edison com a família?

Eu busco diferenciar as coisas mais banais que acontecem no trabalho, não guardo. Eu tenho uma família abençoada e acabo dividindo com minha esposa o que acontece no meu dia a dia. Por vezes ela me deu forcas para vir trabalhar mesmo eu amando a empresa, mesmo eu amando o que eu faço, pois tem dias que você fica magoado com algumas situações que acontecem, mas ela fala que amanhã é um novo dia. E costumo dizer que ela me ensina mesmo não estando aqui dentro. Eu fui entregar uma encomenda esses tempos atrás, e cheguei no portão, chamei e saiu uma mulher que começou passar mal. Ai eu segurei pela grade e comecei a chamar os vizinhos porque mesmo com a chave ali minha esposa sempre diz para não entrar na casa de ninguém, porque às pessoas podem ver você entrando ou saindo, e não vão saber a situação. Entã,o isso se chama convívio, você aprende com a sua família. A minha é uma estrutura para eu ir bem aqui, eu posso estar mal com a empresa, mas eu não posso estar mal com minha família.  

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