À procura de um muro?

OPINIÃO - Gaudêncio Torquato

Data 27/06/2018
Horário 05:00

Pode parecer exagero, mas pesquisas feitas após a vitória de Donald Trump atestam: o mega-empresário, de topete agressivo e peito empinado, ganhou por causa do muro. Sim, o que ele prometeu construir separando o México dos Estados Unidos para fechar fronteiras que mexicanos e outros grupos latinos usam para tentar a vida nos EUA. Pesquisas apontavam a questão migratória como a mais sensível para o eleitorado conservador republicano, suficiente para garantir vitória ao seu candidato.

Trump sabia que abriria polêmica, com sua ideia extravagante e dispendiosa. Hoje o muro está nas laterais do debate. Sabia também ele que a promessa seria suficiente para animar a corrente nacionalista e o refrão “a América para os americanos em primeiro lugar”. Deu certo. O chamado cinturão da Ferrugem - partes de Michigan, Pensilvania, Ohio e Virgínia Ocidental, regiões que concentravam usinas siderúrgicas e outros setores até a década de 1980, voltou a se animar. O muro trouxe esperança para áreas que perderam empregos com a globalização. A esperança disparou a autoestima. Trump, pimba, levou a melhor.

Comparemos a situação com nossas plagas. Que discurso os nossos presidenciáveis recitam para envolver o eleitor? O mais onipresente parece ser o de “pôr ordem na bagunça”. Mesmo assim, é um conjunto de referências mosaicadas, uma aqui, outra acolá. O eleitor, saturado de mesmice, tem a atenção focada no perfil que denota defesa da ordem, combate à bandidagem e até restrição ao próprio corpo parlamentar que integra: o capitão Bolsonaro. Capitaliza as atenções não por seus méritos, mas por defeitos dos adversários.

Sua expressão de cunho militar-repressiva é avocada como bitola para regular as engrenagens da política e da administração. Sua visão de militar abriga o acervo das empresas públicas sob o império do Estado, não devendo ser privatizadas. Esse discurso, também do gosto das esquerdas, repercute como defesa das riquezas nacionais, dos bens públicos. As massas entendem privatização como retirada do patrimônio do Estado para entregar aos “larápios dos negócios privados”. Tentar esclarecer sobre a viabilidade de um Estado eficiente é chover no molhado, não é coisa positiva no sistema cognitivo do povo.

Outra falha gritante dos atores políticos é a ausência de um “Projeto para o Brasil”, peça estruturada com começo, meio e fim, contemplando todas as áreas e setores, da infraestrutura ao território social e ao panorama tributário. Nada ainda que contenha uma abordagem completa sobre temáticas nacionais. Eventuais respostas de pré-candidatos se limitam aos assuntos de momento, geralmente segurança pública, educação ou saúde.

E nenhum protagonista chegou a esboçar um desenho de seu muro, a coluna vertebral de sua identidade. São tentativas tímidas, genéricas, platitudes. Um oceano de mesmices, um oásis de repetições.

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