“Marielle, presente!” Ato em PP honra morte de vereadora

Munidos de cartazes ilustrando mulheres negras e com a leitura de vários textos, dezenas de pessoas se uniram na manhã de ontem, na Praça Monsenhor Sarrion, para repudiar a ocorrência

PRUDENTE - OSLAINE SILVA

Data 18/03/2018
Horário 10:22
Marcio Oliveira, Dezenas de pessoas se reuniram na Praça Nove de Julho, na manhã de ontem, em Prudente
Marcio Oliveira, Dezenas de pessoas se reuniram na Praça Nove de Julho, na manhã de ontem, em Prudente

“Nós somos porque você é! Marielle, presente! Marielle, presente!” Com este grito de dor, munidos de cartazes ilustrando mulheres negras e a leitura de vários textos, dezenas de pessoas se uniram na manhã de ontem, na Praça Nove de Julho, em Presidente Prudente, em um ato de repúdio à violência e uma homenagem para honrar a memória da vereadora carioca, Marielle Franco (PSOL), assassinada na quarta-feira a tiros. “A execução desta mulher considerada um ‘fenômeno’ tem motivado manifestações por todo o país. Ela que teve sua campanha constituída por 90% de mulheres sempre dizia: ‘o feminino de luto é luta’. Então que possamos lutar”, enfatiza a companheira de luta Larissa Dutra, empresária que chegou do Rio de Janeiro há cerca de um mês.

Larissa lembra que dois dias antes de sua “execução”, Marielle denunciou a Polícia Militar de Acari, conhecida como Batalhão da Morte, em sua página no facebook. “Ela moveu, move e moverá estruturas para sempre. A Marielle não morreu em vão. Sua morte representa um perigo à democracia. Um recado às minorias, principalmente negra. Na verdade, trata-se de uma morte política. Uma execução política. Sua execução mostra o quanto uma luta por direitos historicamente retirados de algumas pessoas pode incomodar”, acentua Larissa.

Ela expõe que as pautas e lutas levantadas a partir dessa tragédia absurda são as mesmas de quem já vem lutando por uma melhoria social para que essas pessoas que não são ouvidas historicamente sejam ouvidas.

“Essa era a luta dela. Uma luta para fazer com que as pessoas prestassem atenção contra essa ignorância. Contra o assassinato desenfreado, esse poderio do Estado que mata, executa e não tem que dar satisfação para a população. No Rio de Janeiro a gente já vive um processo de intervenção militar muito antes de esse estardalhaço falar. É só você morar na favela para viver esse regime militar”, frisa.

 

Dívida histórica

Quando perguntado a Larissa sobre histórias relacionadas à luta de mulheres negras e desmilitarização, ela não titubeia e acentua que é difícil, porque estão intrínsecas. Segundo ela, quando se fala de uma população negra está se falando de uma população pobre.

Conforme Larissa, a pobreza no Brasil tem cor. E no Rio de Janeiro além de cor tem local. “A zona sul é branca, mas as favelas no entorno é preta. Então, isso tem uma dívida histórica. Como eu disse, a intervenção militar na favela está muito antes de aparecer no “Jornal Nacional”, por exemplo. É só a gente ligar os pontos para relacionar a luta das mulheres negras com a luta da desmilitarização. Porque quem está em cima, quem mais cuida de famílias são as mulheres. Temos mulheres à frente das comunidades, que fizeram de tudo para conquistar aquilo, geralmente que foram abandonadas pelos homens, tendo assim uma maioria chefes de casas construindo uma educação para os filhos dentro de uma comunidade em que a intervenção existiu desde sempre!”, exclama Larissa.

 

Ato de covardia

Emocionada, a esteticista Iara Sales Costa, 32 anos, integrante da Casassa (Casa de Acolhimento LGBT), vê a execução como um ato de covardia, uma mensagem para dizer que eles estão ai para “calar” seja quem for usando de qualquer artifício, inclusive a execução. Para ela, se trata sim de uma questão racial como o texto que leu, e também contra as mulheres negras que a violência de morte aumentou muito.

“Chega ser difícil falar, porque poderia ser eu ou outras amigas militantes, conheço várias que moram no Rio, em São Paulo. Estou me engajando agora, antes eu ficava meio de fora, meio pacífica mesmo, mas percebi que temos que ir à luta mesmo, porque senão, não há mudanças. É triste ter alguém fazendo a diferença, que está lutando, mostrando a verdade e vem o Estado e a executa: cala. Mas, não ficaremos calados. Isso aqui é só o começo da nossa luta”, garante Iara.

 

Revolta

João de Deus, participante das ações do Galpão da Lua, diz que a ação traz à tona um caso paralelo que foi a morte de Luana Barbosa, a Lua Barbosa, que está engasgado até hoje. Para ele, a morte de Marielle significa a falência do Estado. “Temos um Estado que mata, que corrompe e principalmente um Judiciário que está acima da lei. E não temos como nos defender quanto a isso. Hoje nas redes sociais estão acusando a Marielle de ter ligação com o crime, denegrindo a imagem de alguém que não pode se defender mais. Lembremos de um caso completamente surreal de uma magistrada que conseguiu um documento falso, tirou o filho traficante da prisão, e até agora o cara está livre e ninguém consegue fazer nada contra. Infelizmente, hoje vivemos uma ditadura do Judiciário. O Conselho Nacional de Justiça virou uma piada. O país está entregue a uma quadrilha que envolve o Judiciário, a política e nossa sociedade”, destaca.

De acordo com João de Deus, isso era mais do que esperado que acontecesse, pois Marielle tinha um trabalho muito forte no Rio de Janeiro denunciando crimes da polícia. “Ela faz uma denúncia oficial da questão e em seguida é executada por vários tiros. Na sequência descobre-se que a munição usada veio da Polícia Federal, já foi usada em outra chacina em São Paulo... Virou piada e o Exército diz que não foi o Estado que fez isso”, indigna-se.

 

Retomada

Como publicado na edição de sexta-feira, neste jornal diário, a vereadora Marielle Franco (PSOL), do Rio de Janeiro, foi assassinada a tiros no bairro Estácio, região central da capital carioca. De acordo com a “Agência Brasil”, ela teria sido atingida por quatro disparos na cabeça quando voltava de um evento na Lapa. Além da vereadora, conforme a “Agência Brasil”, também morreu no ataque Anderson Gomes, que trabalhava como motorista e prestava serviços eventuais para Marielle. Uma assessora que também estava no carro sobreviveu ao ataque. A vítima voltava de um evento chamado “Jovens negras movendo as estruturas”, na Lapa, quando foi assassinada. Há duas semanas, Marielle havia assumido a relatoria da Comissão da Câmara de Vereadores do Rio, criada para acompanhar a intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro e vinha se posicionando publicamente contra a medida.

“A parlamentar também chegou a denunciar, em suas redes sociais, no fim de semana, uma ação de policiais militares na favela do Acari. ‘O 41º Batalhão da Polícia Militar do Rio de Janeiro está aterrorizando e violentando moradores de Acari. (…) Acontece desde sempre e com a intervenção ficou ainda pior’, escreveu”, diz a agência de notícias.

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