Esporte

Renegociação de dívida será 'isca' para clube virar empresa

  • 07/09/2019 05:20
  • CARLOS PETROCILO
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O projeto de lei para incentivar os clubes a se transformarem em empresas, em fase de formatação na Câmara dos Deputados, terá um dispositivo para ajudar as equipes a sanarem suas dívidas. A ideia dos deputados que defendem a medida é que a nova legislação possibilite que os clubes (hoje entidades sem fins lucrativos) entrem com um pedido de recuperação judicial antes de se transformarem em empresas. O que possibilitaria aos clubes renegociar dívidas de todos os tipos, como cíveis e trabalhistas. Segundo o texto, em fase de conclusão, as agremiações poderão escolher a sua constituição entre limitada (LTDA) ou sociedade anônima (S.A.). A proposta foi incluída a pedido do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), entusiasta da ideia, pelo deputado Hugo Leal (PSB-RJ) em texto que reforma a Lei de Recuperação Judicial e Falência. "A proposta visava atender grandes empresas, porque as exigências do processo de recuperação são onerosas, mas diversos setores querem ser enquadrados. E o Maia pediu para criarmos especificidade para o futebol", afirma Leal. A ideia é constituir algo mais abrangente que refinanciamento de dívidas com a União, como o Profut (Programa de Modernização da Gestão de Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro), oferecido aos clubes em agosto de 2015. As equipes tiveram a possibilidade de parcelar seus débitos com o governo em até 240 meses, com descontos de 70% das multas e de 40% dos juros, e receberam isenção de encargos legais. Em contrapartida, o programa fazia exigências às equipes, que deveriam cumprir um programa de austeridade fiscal e transparência. Quatro anos após o refinanciamento, algumas voltaram a acumular dívidas com a União. "Quando o Profut foi criado, o passivo dos clubes era de R$ 5 bilhões. Dois anos depois, esse passivo aumentou para R$ 7 bilhões", afirmou o deputado Pedro Paulo (MDB-RJ), escalado por Maia para elaborar o texto e negociar com os demais parlamentares. "O projeto precisa garantir ao clube que aderir ao modelo empresarial que ele irá sanar todo o passivo, isto é, zerar dívidas fiscais, ações trabalhistas e cíveis", acrescenta. Esse ponto é importante, segundo Pedro Paulo, para garantir segurança a quem quiser investir nas agremiações que virarem empresa. Sem sanar o passivo, diz o deputado, há o risco de o investidor ser executado solidariamente por uma dívida antiga. O projeto que deverá ser apresentado vai substituir outras propostas feitas na Câmara de Deputados sobre o tema. O mais recente é o projeto de lei 5.082/2016, de autoria de Otávio Leite, que não é mais deputado neste mandato, e de coautoria de Domingos Sávio (PSDB-MG). Um ponto que deverá ser excluído do novo projeto é a especificidade da S.A.F. (Sociedade Anônima do Futebol). Os times poderão optar só pelas estruturas societárias já disponíveis --S.A., com capital aberto ou fechado, LTDA, e entidade sem fins lucrativos (como opera a maioria dos clubes atualmente). "Não vamos criar S.A.F ou algo específico para o futebol. Isso traria complicações no mercado", diz Pedro Paulo. Os deputados estudam como estabelecer uma alíquota de tributação igualitária para todos as equipes, independentemente da sua composição. Até as entidades sem fins lucrativos vão ser tributadas. Atualmente, elas são isentas de Imposto sobre da Renda. Os deputados acreditam que o mecanismo de incentivos para zerar débitos é uma isca para agremiações endividadas se tornem empresa. É o caso, por exemplo, do Botafogo, time para o qual Rodrigo Maia torce. "Precisamos criar segurança jurídica para o investidor e fazer isso até o final do ano. Vemos investidores brasileiros fechando negócios fora daqui. Tem, por exemplo, o Ronaldo que investe em um time espanhol [Valladolid ]", afirma Domingos Sávio. O deputado federal Danrlei (PSD-RS), ex-goleiro e atual conselheiro do Grêmio, acredita que a proposta será interessante para equipes com sérios problemas financeiros. "O Grêmio, o Flamengo e alguns outros no Brasil, estão sanados [financeiramente]. Esses dificilmente vão entregar suas estruturas para um investidor", afirma Danrlei, que é membro da Comissão de Esporte na casa. Maia convidou dirigentes paulistas para uma reunião na próxima semana sobre o tema em Brasília. O presidente da Câmara já esteve na CBF e também visitou o São Paulo, que tem o projeto para virar empresa elaborado. No Rio, a confederação tem um encontro agendado para os próximos dias da Comissão Nacional de Clubes, onde o projeto será discutido. "O clube empresa agora é um caminho sem volta, o que se discute é a legislação para incentivar o investidor e afastar aventureiros", disse Pedro Daniel, gerente de esportes da consultoria E&Y e convidado pelo governo federal para compor um grupo de estudos sobre o tema. "O presidente da casa [Rodrigo Maia] está muito entusiasmado, o presidente Jair Bolsonaro gosta do futebol e o próprio ministro da economia tem uma visão liberal", afirma Domingos Sávio, co-autor da proposta de 2016.